Está na moda de novo a narrativa do “Congresso golpista”
A semana começou com o Congresso em obstrução. Um movimento encabeçado pelo Novo, PL e diversas frentes parlamentares protesta contra usurpação de funções pelo STF...
A semana começou com o Congresso em obstrução. Um movimento encabeçado pelo Novo, PL e diversas frentes parlamentares protesta contra usurpação de funções pelo STF. O grande problema do governo é que isso está se prolongando bem na época da cirurgia de Lula.
Na semana passada, o novo presidente do STF, Luís Roberto Barroso, declarou que pretende normalizar a relação entre os Três Poderes, que anda bem estremecida.
Ele tem a faca e o queijo na mão. Resta ver o que fará especificamente. O problema dos parlamentares é a votação de matérias como marco temporal e descriminalização das drogas. Pouco importa aqui qual foi a decisão, a questão é perda de poder. O Congresso é quem decide sobre isso.
Luís Roberto Barroso falou esses dias num conceito que ele defendeu em artigo de 2018, o da missão iluminista do STF. Naquela época, da mesma forma que agora, a queixa é sobre o excesso de atuação da corte.
O problema agora é com os parlamentares, antes era com gente crítica no meio jurídico. A tal missão iluminista faria com que o Supremo não fosse mais o guardião da Constituição, iria além disso.
Há vários pontos nesse debate, mas a fricção está em um específico: a atuação na garantia dos direitos fundamentais com esse olhar iluminista. “O papel iluminista deve ser exercido com grande parcimônia e autocontenção, em conjunturas nas quais é preciso empurrar a história. Em alguns momentos cruciais do processo civilizatório, a razão humanista precisa impor-se sobre o senso comum majoritário”, defendeu o ministro Barroso em seu artigo.
É uma visão do processo democrático em que o STF seria encarregado de defender o povo de si próprio. Não é a sociedade em conjunto com seus representantes eleitos a responsável por avançar a história. Haveria aí a permissão do “empurrão”, feito pelos que acreditam representar os ideais humanistas.
O raciocínio que leva o STF a decidir descriminalizar drogas e aborto, por exemplo, é precisamente este. O brasileiro é conservador e majoritariamente contra as duas pautas. Você até consegue discutir e falar de gradações nos saraus da elite urbana. Fora desse ambiente, droga é coisa de bandido e aborto é assassinato de bebês.
São mudanças culturais que demoram a ocorrer. Nesses casos, se defende o tal do “empurrão” na direção daquilo que a elite urbana considera correto. Se essa tese prevalecer, Lula tem uma bomba no colo.
Ele está afastado e esse governo não tem negociadores experimentados como o primeiro, com Palocci, Gushiken e Gilberto Carvalho. O movimento de obstrução não foi debelado e ainda cresceu. O Centrão viu ali uma oportunidade de pedir mais coisas.
Os parlamentares governistas não estão falando do tema. No plenário, claro, alguns acabam ficando irritados. Os líderes, principalmente, que não conseguem votar nada.
Houve uma tentativa de votar pautas de interesse de quem está obstruindo, como o Desenrola. Como um parlamentar que é a favor da matéria deixa de votar só para obstruir? O movimento está forte, não funcionou a tentativa.
Nas redes, a tentativa é usar a manjada máquina de robôs e memes para xingar Arthur Lira e Rodrigo Pacheco de golpistas. Enquanto isso, adesistas com acesso à imprensa tentam emplacar novamente aquele imaginário de “Congresso golpista”.
Como narrativa, tem lá seu charme e sua razão de ser. No mundo paralelo luloafetivo, o Congresso deu um golpe em Dilma e, em grande medida, deu suporte ao governo Bolsonaro. Portanto, tem DNA golpista. Obstruiu? Veja a prova de que é golpista.
Difícil fazer isso colar fora daquele pequeno nicho onde Lula não tem votos, tem devotos. É uma prática digital xingar e rotular as pessoas para que elas se acovardem e façam o que você quer. No caso específico, não parece funcionar.
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