Alexandre Borges na Crusoé: Um alerta sensato num país histérico
Doações, por melhores que sejam as intenções de quem tenha doado, podem sim causar consequências indesejáveis a longo prazo
Alexandre Borges traz em sua coluna para a edição de número 315 de Crusoé, uma análise sobre a fala do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PMDB), sobre as doações feitas às vítimas das enchentes que atingiram o estado nas últimas semanas.
Em 1849, o historiador escocês Thomas Carlyle rotulou a economia de “ciência triste” (“dismal science”), fama que não deixou o estudo dedicado à alocação de recursos escassos até hoje. Hoje já se entende que a economia não é um jogo de soma zero, que riqueza se cria e se transforma, mas falar de escolhas difíceis em meio à escassez segue tabu, em especial nos momentos de crise.
O azedume causado por uma discussão econômica madura foi a grande surpresa com que o jovem Eduardo Leite (PSDB; foto), que antes dos quarenta anos já governa o Rio Grande do Sul pela segunda vez, teve que lidar nos últimos dias, com uma declaração perfeitamente defensável e que ele, devido à histeria ideológica que causou, achou por bem retirar num constrangido pedido de desculpas.
Disse o governador gaúcho, em entrevista à rádio Bandnews FM: “Quando você tem um volume tão grande de doações físicas chegando ao estado, há um receio, que nós observamos em outras situações, sobre o impacto que isso terá no comércio local. O que pode ter, na verdade, é uma cidade que foi impactada, o comércio local impactado também, e o reerguimento desse comércio fica dificultado à medida que você tem uma série de itens que estão vindo de outros lugares do país”.
Não há absolutamente nada de errado com a afirmação e há evidências suficientes para sustentar o argumento. Após o devastador terremoto de 2010, o Haiti recebeu tantas doações de alimentos do exterior que a agricultura local se tornou economicamente inviável. O resultado, na prática, foi uma migração em massa de camponeses haitianos para a capital Porto Príncipe, multiplicando exponencialmente a favelização da cidade, um problema social sem solução aparente até o momento.
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