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Um arcabouço só é pouco, eu quero mais

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Carlos Graieb
4 minutos de leitura 02.02.2024 17:52 comentários
Análise

Um arcabouço só é pouco, eu quero mais

Cada área crucial da política deveria ter uma meta, cujo não atingimento traria alguma consequência para quem governa 

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Carlos Graieb
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Um arcabouço só é pouco, eu quero mais
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Brasil tem um Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social. Está lá no site do Ministério da Justiça, para quem quiser consultar, e diz respeito ao decênio que vai de 2021 a 2030.  

Eu não tinha ideia que isso existisse até agora há pouco. Imagino que você também não. 

O Plano foi gestado no governo Bolsonaro, mas não lembro do ex-presidente fazendo propaganda dele.  

Nesta semana, houve troca de comando no Ministério da Justiça. Ocasião para muita discurseira.  

Se dependesse de Flávio Dino, o ministro que deixou o cargo, e de Ricardo Lewandowski, que passou a ocupá-lo, eu e você teríamos continuado na ignorância sobre o Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social 2021-2030.  

Até onde pude verificar, nenhum dos dois deu qualquer destaque ao documento em seus discursos de saída e chegada.  

Nem Lula. Ele também discursou na posse do novo ministro e disse um monte de groselhas sobre “humanizar o combate aos pequenos crimes” e “jogar pesado contra o crime organizado”. Blá, blá, blá.   

Governante odeia meta

Se bobear, nenhuma dessas autoridades sabe que o Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social 2021-2030 existe. Se souberem, não devem ter lido.  

Em parte, porque o troço foi gestado no governo anterior. Governante brasileiro tem horror a planejamento feito por quem veio antes.  

Além disso, porque governante brasileiro também tem horror a metas. Não gosta que elas existam e fica indignado se alguém comete a indelicadeza de mencioná-las na sua frente. 

É que meta incomoda mesmo. Se houver consequências para o seu descumprimento, aí é um pesadelo.  

Vejam o caso do resultado fiscal. O Ministro da Fazenda Fernando Haddad não faz outra coisa na vida senão correr atrás do número estabelecido no arcabouço. Tem de justificar cada uma de suas escolhas tendo em vista uma única pergunta: vai ajudar ou dificultar o atingimento da meta?  

O governo pode mudar a meta, mas precisa negociar com o Congresso e gastar muita saliva explicando o porquê. Se não conseguir convencer os parlamentares e descumprir o compromisso fiscal, sofrerá consequências. Terá menos dinheiro para gastar neste ano. 

Um número faz diferença

Impressionante como um número faz diferença.

Ele estrutura o debate sobre as questões importantes. Proporciona uma baliza para que as ações do governo sejam julgadas no cotidiano, inclusive pelos não especialistas. 

A oposição brasileira se diz muito preocupada com o tema da segurança pública e estava no poder quando o Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social 2021-2030 foi redigido. Se fosse séria, já teria tirado o livrinho da prateleira empoeirada onde ele foi esquecido (é uma metáfora: como eu disse, está na internet) para cobrar o desempenho do governo federal. Afinal, foram compromissos assumidos pelo Estado brasileiro para um período de dez anos. Há 21 indicadores a serem acompanhados.  

Se fosse séria, a base governista não se incomodaria com isso. Pelo contrário: ficaria feliz por ter um mapa do caminho, mesmo que quisesse modificá-lo aqui ou ali.  

Na verdade, eu acredito que os eleitores deveriam despertar o tecnocrata que existe dentro de cada um de nós e exigir que cada área crucial da política tenha o seu “arcabouço”. Um grande número para cada assunto que atormenta os brasileiros. Uma meta, cujo não atingimento traria alguma consequência para quem governa. 

A conversa no país teria mais foco. Haveria menos conversa fiada sobre  “humanizar o combate aos pequenos crimes” e “jogar pesado contra o crime organizado” caindo da boca das autoridades.  

Talvez houvesse até algumas soluções.

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Carlos Graieb

Carlos Graieb é jornalista formado em Direito, editor sênior do portal O Antagonista e da revista Crusoé. Atuou em veículos como Estadão e Veja. Foi secretário de comunicação do Estado de São Paulo (2017-2018). Cursa a pós-graduação em Filosofia do Direito, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

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