Só assassinato é quebra de decoro na Câmara?
Diga-me quem cassas e te direi quem és. O Conselho de Ética da Câmara atravessou um tumultuado 2023 sem punir sequer um deputado. Foram arquivados 21 processos, e outros oito requerimentos...
O Conselho de Ética da Câmara atravessou um tumultuado 2023 sem punir sequer um deputado. Foram arquivados 21 processos, e outros oito requerimentos por quebra de decoro vão para 2024 aguardando relator, segundo levantamento do jornal O Globo.
Reportagem de capa da edição de Crusoé publicada em 26 de maio (assista à versão em vídeo ao fim deste texto) tratou do desafio do Conselho de Ética numa legislatura eleita como nunca à base dos cliques de rede social. Ao longo do ano, o colegiado que deveria zelar pelo decoro dos parlamentares não surpreendeu quem não esperava nada mesmo dele.
Neste ano, uma deputada disse a um colega para “tomar no cu” durante audiência. Outro foi acusado por opositora de importunação sexual, por encostar o rosto em seus cabelos durante discussão acalorada. Um terceiro parlamentar partiu para cima de um adversário por considerar que ele maculou a honra de seu pai.
A ausência de qualquer punição — nem sequer uma advertência formal — levou ao que, diante desse animado histórico, parece uma consequência natural: o ano legislativo foi fechado com um tapa na cara em plenário.
A última deputada punida exemplarmente pelo Conselho de Ética da Câmara, e após muita relutância, foi Flordelis (foto), cassada em 2021 após ser acusada formalmente de tramar a morte do próprio marido. Ela foi condenada a 50 anos de prisão no ano seguinte.
Até que o colegiado, presidido hoje por Leur Lomanto Jr. (União-BA), puna de forma contundente um comportamento menos grave que o assassinato, o homicídio será a régua do decoro parlamentar na Câmara.
O tapa na cara e a rachadinha
Há dois casos emblemáticos no horizonte. O tapa de Washington Quaquá (PT-RJ) em Messias Donato (Republicanos-ES) durante a sessão de promulgação da reforma tributária e a acusação de rachadinha contra André Janones (Avante-MG), alimentada por gravações em que o próprio deputado sugere a adoção do esquema aos subordinados.
O Conselho de Ética pode dizer, como se alegou no caso de Flordelis, que Janones não foi condenado em última instância e que, portanto, cassar seu mandato ou puni-lo de outra forma seria precipitado e injusto. Pode-se optar, também, por acolher a explicação de Quaquá, de que reagiu a outra agressão.
Se isso ocorrer, essa será a Câmara que aceita conviver com tapas na cara e deputados defensores de rachadinha.
Quem define os limites do decoro — e de quanto respeito merece do cidadão brasileiro — é a própria Câmara.
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