O fardo de Bolsonaro no campo antipetista
Uma análise do xadrez que precisará ser jogado até 2026
Não era preciso arma, nem invasão, nem golpe de Estado, para conter a ditadura da toga.
Era preciso, a partir de 2019, manter a Lava Jato, que o PGR petista de Jair Bolsonaro (foto) extinguiu; contestar a abertura do inquérito das fake news, legitimada pelo então AGU de Bolsonaro, de quem ele saiu em defesa e depois premiou com nomeação para o STF; criar a CPI da Lava Toga, que a família Bolsonaro sabotou; e aprovar o projeto de lei, que Bolsonaro vetou, contra decisão monocrática de ministros do Supremo.
Depois de amarelar por vias institucionais, a fim de garantir a ajuda de Dias Toffoli na blindagem contra investigações de “rachadinha”, Bolsonaro fez pose de valentão com flertes às vias inconstitucionais, falando em reunião ministerial de reagir com armas, xingando o relator Alexandre de Moraes de “canalha”, dizendo “acabou, porra!”, fomentando a hipótese de intervenção militar, e consultando os comandantes das Forças Armadas sobre um golpe travestido de instituto jurídico, até ouvir do general Freire Gomes que seria preso pelo Exército se levasse o plano adiante.
Resultado: o “mito” deixou os reacionários mais aloprados irem na frente, saiu de fininho na hora H e agora tenta lavar as mãos, apelando a Lula, Moraes e demais ministros do STF por anistia.
“Liberdade”
Os propagandistas de Bolsonaro, porém, omitem das massas de manobra seus atos e pedidos de penico, explorando somente a retórica de valentão de carro de som — também ela já abandonada — como prova de que o ex-presidente lutou por “liberdade”.
Desde que foi eleito em 2018 e viu o nome do comparsa Fabrício Queiroz na lista do COAF de movimentações bancárias atípicas, Bolsonaro só luta, junto com seus filhos, pela mesma impunidade geral que beneficiou Lula em sua volta ao poder.
O ex-presidente, em razão de seu rabo-preso, desperdiçou todas as oportunidades para conter o sistema que corrói o país; e, em razão de sua recusa em aceitar a derrota eleitoral, forneceu a ele um pretexto — de defesa da “democracia” — para ser ainda mais autoritário.
Massa crítica ao petismo
Depois de junho de 2013, quando começaram as manifestações de rua, uma massa crítica ao petismo foi se apossando dos atos, sem saber ainda os tipos de segmentos que ali se uniam contra os governos do PT, marcados por corrupção, fraudes fiscais e crise econômica.
O tempo foi distinguindo, entre aquela gente órfã de representação política, quem estava ali por princípios morais que permaneceriam firmes ao longo de qualquer governo ou regime de poder; quem colocava a ideologia e o senso de pertencimento a uma tribo acima da moralidade pública; e quem só esperava oportunidades para conseguir boquinhas também.
Em 2024, sobraram com Bolsonaro os terceiros, manipulando parte dos segundos, contra os alertas dos primeiros, tachados de “traidores” por se recusarem a rebaixar seus princípios.
Massa de manobra
Essa sobra de ativistas e massas de manobra do bolsonarismo, que antes repercutia as denúncias do petrolão, passou a atacar nas redes sociais ex-membros da Lava Jato; a aplaudir na Av. Paulista o mensaleiro Valdemar Costa Neto, dono do PL; a aceitar o mensalão orçamentário; a poupar Toffoli e Gilmar Mendes de críticas; a pedir intervenção militar em porta de quartel em Brasília; a invadir e depredar prédios dos Três Poderes; e a passar pano para general de quatro estrelas que fica atrás da mesa com o celular na mão, mandando jagunço virtual infernizar a vida da família do comandante que se recusou a aderir ao golpe, ou telefonando para pai de delator de golpistas.
Desde sua prisão, Lula jamais imaginou contar com um suposto adversário tão competente quanto Bolsonaro em enlamear o campo antipetista e facilitar a sua estratégia de se limpar na sujeira alheia.
Até 2026, os representantes políticos desse campo dependem da sujeira acumulada por Lula e STF em retribuição, e da própria capacidade não só de apontá-la e de oferecer alternativas aos brasileiros, mas de lidar, de um lado, com o desgaste do bolsonarismo entre eleitores moderados e, do outro, com a insistência bolsonarista no reacionarismo aloprado, agravada pela necessidade do inelegível e indiciado Jair Bolsonaro de emplacar um aliado ou familiar na presidência da República, para blindá-lo mais uma vez.
Esse é o xadrez que precisará ser jogado nos próximos dois anos, sem arma, sem invasão, sem golpe de Estado.
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