Nem toda unanimidade é burra
Diretores do BC devem aumentar a taxa Selic após quatro meses estável, mas a decisão não pode deixar dúvidas sobre compromisso do colegiado
Esta superquarta tem a primeira mudança nos juros básicos dos Estados Unidos e do Brasil em alguns meses. Novamente, os bancos centrais de cada um dos países enfrentam dilemas distindos.
Nos EUA, o grupo liderado pelo presidente do FED (Federal Reserve), Jerome Powell, decidirá entre uma redução de 0,25 ponto percentual e 0,50 p.p. na taxa básica, que está em 5,50% ao ano a 14 meses.
A preocupação por lá é que a economia pode estar desacelerando de forma mais significativa que o antecipado, o que exigiria velocidade no relaxamento monetário. O mercado financeiro precifica 62% de chances de uma alta da 0,50 p.p. contra um início de ciclo mais gradual.
Por aqui, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, e o futuro presidente da autarquia, Gabriel Galípolo, devem defender um aumento na Selic, dos atuais 10,50% para 10,75% – movimento amplamente antecipado pelo mercado. As chances de um reajuste ainda mais significativo são baixas, mas existem.
A motivação para o aumento após quatro meses de estabilidade na taxa básica de juros seria a desancoragem das expectativas de inflação, isto é, a visão dos agentes econômicos de que se nada mudar não chegaremos aos 3% da meta para o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor). Parte importante do motivo para a descrença está na falta de credibilidade do governo Lula com a responsabilidade fiscal.
O descontrole das contas públicas com sucessivos gastos excetuados nos cálculos da meta fiscal (como a recente liberação de recursos para o combate as queimadas) e a inclusão de receitas não-recorrentes (como o confisco de 8,5 bilhões de reais “esquecidos” na contas dos brasileiros) mostram um governo inclinado ao truque proselitista para fazer de conta que é aquilo que não pretende ser.
A pressão sobre o Banco Central nesse cenário é de última linha de defesa contra um governo que caminha decididamente para a repetição da fórmula que levou ao Brasil a uma das piores crises econômicas da história, no segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff.
Mais do que a amplitude do aumento na taxa Selic, os agentes de mercado querem ver se o grupo de escolhido por Lula para o BC serão independentes de fato. Uma decisão dividida, como a de maio deste ano – quando todos os quatro indicados do petista optaram por uma política monetária mais relaxada, pode ter efeitos custosos para o país.
Só a unanimidade entre os membros do Copom (Comitê de Política Monetária) do BC na decisão da quarta-feira, 18, pode aliviar parte da desconfiança dos agentes econômicos com a influência de Lula sobre os diretores indicados por ele à autarquia. Neste caso específico, aderentes à lógica de Nelson Rodrigues, será necessário trair a máxima cunhada pelo autor de que toda unanimidade é burra.
É claro que o aumento dos juros em um país com um governo sem a mínima responsabilidade fiscal pode levar o Brasil à temida dominância fiscal – em função do descontrole com o aumento da dívida e o custo desses empréstimos, mas quais opções a autarquia responsável pelo controle da inflação tem à disposição neste momento?
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