É mesmo pelo Brasil e a democracia, STF?
Xandão, Mendes e companhia brigam pelo povo e pelo Brasil, ou apenas por seus cargos e todo o poder que deles emana?
Vez ou outra – e sei lá por que -, as democracias desenvolvidas do planeta se lembram destes pobres trópicos do sul, esquecidos por Deus e bonitos por natureza, e resolvem lhes dedicar parte do tempo, deixando de lado os próprios dramas para tentar entender e comentar as mazelas típicas destas repúblicas bananeiras.
Artigos recentes de importantes jornais europeus se juntam a outros de passado também recente, e debruçam-se sobre o judiciário brasileiro, especialmente sobre a Suprema Corte e suas inúmeras, digamos contradições – legais e morais. O mais recente artigo é da publicação suíça NZZ, comentada em O Antagonista.
Ao ler tais matérias e, sobretudo, ao ler a brilhante análise de Felipe Moura Brasil sobre a ruidosa celeuma em torno do PIX, confesso que uma profunda sensação de desamparo me percorreu o consciente, causando ainda mais estragos a um inconsciente já pra lá de perturbado. Se alguém não entendeu, procure Freud que ele explica.
Desvio de finalidade
As vicissitudes, idiossincrasias e comportamentos consideravelmente, no mínimo, questionáveis – sob quaisquer ótica e perspectiva -, oriundas de parte do Supremo Tribunal Federal (STF), notadamente de dois ou três ministros, digamos exagerados, vêm corroendo cada mais vez a credibilidade de um dos pilares de qualquer democracia que se preze.
O Poder Judiciário é – ou deveria ser – a espinha dorsal da tripartição dos Poderes da República. De lá esperamos sabedoria, equilíbrio e, principalmente, isenção. Infelizmente, nada disso vem sendo emanado da porção sul da Praça dos Três Poderes, epicentro das decisões que verdadeiramente impactam a sociedade e tornam o que é o Brasil.
Não bastassem os privilégios de ordem material – impensáveis e inconcebíveis a 99.99% dos profissionais do país -, decisões de caráter eminentemente político, e não técnico, e comportamentos incompatíveis com a liturgia do cargo são como tapas nas fuças cansadas e doloridas de uma população que não encontra socorro onde quer que procure.
Aos amigos, tudo
As matérias citadas, bem como não se cansa de apontar O Antagonista, mostram as relações conflitantes entre alguns ministros e réus do STF. Já o artigo de FMB traz a lembrança de uma carta aberta, publicada por 195 auditores da Receita Federal, que escancara o que entendem abuso de poder e privilégio de ministros do Supremo.
A minha sensação de desamparo vem da constatação do quão pequenos, impotentes e reféns somos – os brasucas comuns – de um sistema de castas políticas que se alterna no poder, nomeando para cargos-chave amigos e aliados, de forma que o conluio permaneça intocável, ainda que se alterem, de vez em quando, personagens e legendas.
Qualquer um que já empreendeu no país e sentiu, em algum momento, o peso – muitas vezes injusto e desproporcional – da força opressora (e seletiva) do Estado, sabe que não é fácil lidar com a realidade de não ser um escolhido, ou apaniguado, do poder de turno, e olhar para o vizinho e enxergar o inverso (vizinho como mera figura de linguagem, ok?).
Quem tem fama deita na cama
O livro O flagelo da economia de privilégios: Brasil, 1947-2020, de Fernando de Holanda Barbosa, aborda a questão sob a ótica financeira, pelos ganhos das corporações e pelos onipresentes e atemporais déficits públicos. Alguém deveria abordar a questão, mas sob a ótica dos efeitos deletérios que um judiciário como o nosso produz em longo prazo.
Não tenho a menor dúvida de que parte da revolta popular, que culminou nos atos bárbaros e inaceitáveis de 8 de janeiro de 2023, tem ligação direta com os desmandos do Poder Judiciário. Não é à toa que quase metade da população brasileira não confia na Justiça. E convenhamos: motivos não faltam. Ao contrário. Abundam.
Entendo – e concordo – que parte dessa insatisfação popular é motivada por desinformação e mensagens reducionistas, a partir de políticos influentes e potentes comunicadores digitais. Porém, é inegável – e irrefutável -, que nossos togados fazem jus a tanta e tamanha indignação. São, portanto, ao mesmo tempo, a causa e o efeito.
Perguntar não ofende
Encerro com uma dúvida legítima e sincera: terá sido mesmo – e é – o veemente combate às ameaças antidemocráticas em nome da democracia e do país, ou mera defesa de si mesmos, de seus interesses e castelos? Xandão, Mendes e companhia brigam pelo povo e pelo Brasil, ou apenas por seus cargos e todo o poder que deles emana? É apenas uma pergunta.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (0)