Crusoé: O “desvio de finalidade” das Turmas do STF
Pensadas para aumentar a eficiência do tribunal, Turmas acabaram ganhando outra finalidade: sonegar certas questões do debate de todo o colegiado
Depois de suspender o acesso de 22 milhões de usuários ao X, o ministro Alexandre de Moraes tinha duas alternativas: enviar sua decisão para o plenário da Corte, onde seria analisada por todo o colegiado, ou para o plenário da Primeira Turma, composta por outros quatro colegas, além dele.
Moraes optou pela segunda alternativa. Dessa forma, conseguiu que sua decisão fosse ratificada por unanimidade, com um único reparo do ministro Luiz Fux, que achou draconiano demais o dispositivo que impõe multa de 50 mil reais a quem usar recursos como a VPN para acessar a plataforma de mensagens no Brasil.
Se Moraes tivesse enviado o processo para o plenário da Corte, é certo que teria alcançado o mesmo resultado – a confirmação de sua sentença – mas talvez alguns ministros, como André Mendonça e Nunes Marques, abrissem uma dissidência mais enfática. Talvez o próprio Fux se alongasse mais nas suas discordâncias, em vez de redigir um único parágrafo, como fez.
Pensadas como uma ferramenta para ampliar a eficiência do STF, reduzindo o tempo e multiplicando o número de julgamentos, as Turmas acabaram ganhando outra finalidade: sonegar certas questões de um debate amplo e manufaturar um consenso ou uma “maioria” que nem sempre reflete a verdade da Corte, ou seja, a visão de todo o colegiado.
Diversos debates de enorme impacto político sobre o petrolão, por exemplo, foram resolvidos na 2a. Turma e jamais submetidos ao plenário. Por exemplo, a anulação das provas do acordo de leniência da Odebrecht, decretada por Ricardo Lewandowski quando era ministro de Lula no STF e não ministro da Justiça do governo Lula. Jamais saberemos o que a Corte como um todo pensa dessa medida.
Isso é algo que deveria entrar na mira do Congresso, que atualmente debate um projeto para reduzir o poder excessivo que as decisões monocráticas conferem aos ministros. Embora seja um poder secundário, essa liberdade que eles têm de escolher para qual plenário vão enviar suas decisões distorce a lógica da colegialidade que deveria nortear todo o trabalho do STF.
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