A PEC da Blindagem Cerebral

24.12.2025

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O Antagonista

A PEC da Blindagem Cerebral

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Luiz Gaziri
5 minutos de leitura 17.09.2025 17:40 comentários
Análise

A PEC da Blindagem Cerebral

O golpe fatal para a nossa democracia é a consciência dos poucos indivíduos que mantiveram sua lucidez no meio da polarização

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Luiz Gaziri
5 minutos de leitura 17.09.2025 17:40 comentários 1
A PEC da Blindagem Cerebral
Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Doze anos antes da PEC da Blindagem ser aprovada, um grupo de cientistas americanos e canadenses previu que isso aconteceria. Liderados pelo influente pesquisador Keith Stanovich, esses cientistas realizaram um estudo que apresentava as seguintes estatísticas a um grupo de participantes americanos:

A. Um carro Alemão tem 8 vezes mais chances de matar passageiros de outro carro em
um acidente.

Já outro grupo também composto por participantes americanos recebeu a seguinte
informação:

B. Um carro Americano tem 8 vezes mais chances de matar passageiros de outro carro
em um acidente.

Em seguida, os participantes do primeiro grupo eram solicitados a julgar se o Governo Americano deveria banir o carro Alemão, enquanto os participantes do segundo grupo julgavam se o Governo Alemão deveria banir o carro Americano. O que você acha que aconteceu?

Antes da resposta, vamos assumir que os participantes desse estudo são perfeitamente racionais. Se assim for, a sua opinião será a de que em ambos os grupos os participantes julgaram que os governos deveriam proibir o carro de circular no país, correto? Surpreendentemente, 78,4% dos participantes do primeiro grupo eram favoráveis ao banimento do carro alemão, enquanto apenas 51,4% dos membros do segundo grupo acreditavam que o carro americano deveria ser banido. Por que essa diferença? Como você deve ter imaginado, a diferença veio do fato de os participantes serem americanos. Troque a palavra “americano” por “político” e você terá a explicação precisa do que aconteceu no nefasto dia 16 de setembro de 2025 na Câmara dos Deputados, onde ao invés de tentar defender a população de políticos desonestos, os deputados preferiram privilegiar seu próprio grupo.

A tendência que temos em enxergar claramente os equívocos de outros grupos, mas colocarmos uma venda em nossos olhos para não enxergarmos os erros do nosso próprio grupo, foi nomeada pela ciência como Viés do Meu Lado. Um grande corpo de pesquisas revela um lado ainda mais perverso desse viés: rapidamente e sem grande esforço julgamos que o grupo do qual fazemos parte está do lado do bem, enquanto aqueles que pensam diferente estão alinhados com o diabo em pessoa. Isso explica a atual – e eterna – dinâmica na câmara: alguns deputados acreditam que seu lado está sendo “injustamente perseguido” por um governo diabólico, enquanto o outro lado enxerga com ar de santidade que a “justiça está sendo feita.” Essa limitação cognitiva nos leva a conclusão de que, caso qualquer partido do “lado injustiçado” estivesse hoje no poder, as votações dos deputados seriam opostas ao que vimos nessa semana.


Portanto, não se engane com a posição de cada partido, já que ela não reflete verdadeiramente o que esses políticos defendem – quem ontem lutou contra a impunidade, amanhã votará a favor dela.

O que dói mais, no entanto, não é a posição dos nossos parlamentares, mas sim o fato de que apesar de eles nos decepcionarem diariamente, ainda existem grupos de pessoas que movem mundos para os defender, movidos pela ilusão de que seu lado é o “do bem.” Essa é a prova máxima de quão ingênuo o ser humano pode ser. Para não sermos vítimas do Viés do Meu Lado, o primeiro passo é o entendimento de que o mal puro não existe. Nenhum indivíduo ou grupo se comporta de forma maligna por se classificar como maldoso. Putin, Maduro, terroristas do Hamas, invasores do MST, vândalos do 08 de janeiro e apoiadores de políticos que praticam rachadinhas e mensalões julgam a si mesmos como indivíduos do bem lutando contra as forças do mal.

Uma das evidências mais robustas das ciências comportamentais é a de que o ser humano tem enormes dificuldades em assumir que tomou uma decisão errada. Ao descobrir que o político no qual votou está envolvido em um escândalo de corrupção, o indivíduo não quer assumir o equívoco, por isso, ele inventa as mais bizarras justificativas para blindar o seu cérebro da decepção: ele foi preso sem provas, isso é um golpe da mídia, ele está sendo perseguido injustamente, o sítio não era dele,
estamos em uma ditadura de toga, as joias que um político recebe de presente não são do Estado, um golpe sem exército na rua não existe. Sim, o radicalismo político é a melhor ferramenta para afastar as pessoas da realidade.

O golpe fatal para a nossa democracia é a consciência dos poucos indivíduos que mantiveram sua lucidez no meio da polarização, de que muitas pessoas que apoiam ferrenhamente as decisões que seus políticos tomaram na PEC, são honestas e bondosas. Algumas, revoltadas com os escândalos dos governos da esquerda, foram convencidas por outro político igualmente desonesto de que ele era a grande esperança. Outras, não querendo assumir o erro de terem colocado duas vezes napresidência um sujeito desonesto, esforçaram-se para acreditar que o mensalão e o petrolão foram “golpes da mídia.” A marca registrada de qualquer charlatão é a sedução de pessoas boas e honestas, para usar suas melhores qualidades contra elas mesmas.

*Luiz Gaziri é professor de ciências comportamentais e autor finalista do Prêmio Jabuti Acadêmico com a obra “A Arte de Enganar a Si Mesmo.”

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Luiz Gaziri

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Comentários (1)

Fabio B

17.09.2025 20:19

Nem o PT teve coragem de defender essa imoralidade, não precisaram, pois o Bolsonarismo se encarregou de não só votar em massa a favor da bandidagem, como até fazer discurso cínico a favor, como fez aquela bichinha do Nikolas.


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