‘Frente amplíssima’
Ao longo de todo este ano eleitoral de 2022, falou-se muito da tal da “terceira via” para driblar a inevitável polarização entre a extrema direita do presidente Jair Bolsonaro e sua trupe e a esquerda de vários matizes reunida em torno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Afundadas num pântano de vaidade e interesses políticos pessoais, as múltiplas organizações partidárias, que poderiam concretizá-la, tiveram de abandonar suas pretensões diante da polaridade da disputa...
Ao longo de todo este ano eleitoral de 2022, falou-se muito da tal da “terceira via” para driblar a inevitável polarização entre a extrema direita do presidente Jair Bolsonaro e sua trupe e a esquerda de vários matizes reunida em torno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Afundadas num pântano de vaidade e interesses políticos pessoais, as múltiplas organizações partidárias, que poderiam concretizá-la, tiveram de abandonar suas pretensões diante da polaridade da disputa entre o bolsonarismo condottiere do antipetismo e o petismo incapaz de aceitar qualquer outra liderança que não fosse a do ex-líder das greves operárias que participaram do processo de desmanche da ditadura militar.
Na hora da disputa eleitoral, tucanos e falsos liberais “farialimistas” acorreram ao chamado do poder dos fascistoides, que fracassaram no combate à pandemia da covid e aos impactos por ela causados na economia. A alternativa ao embate extremista falsamente ideológico viu sucumbirem suas melhores oportunidades, entre as quais a de João Doria, sem quem nenhum brasileiro seria vacinado, o que aumentaria a mortandade defendida por Osmar Terra e até agora por Onyx Lorenzoni, dos que se deixassem passivamente contaminar pelo coroné vírus, oficial no comando do neobolsonarismo militante. Sobrou a revelação de Simone Tebet, que sobreviveu à ganância de seu MDB e apoiou com desapego à glória e ao poder a solução que resultou em triunfo.
A entrada providencial da filha do ex-presidente do Senado Rames Tebet na campanha da esquerda multifacetada coincidiu com a ressurreição de um fantasma pouco lembrado da resistência democrática civil à ditadura tecnocrática-militar, inaugurada em 1964 e enterrada pelo Colégio Eleitoral. A frente ampla de 1966 sucumbiu à força política dos fardados, que derrubaram o presidente constitucionalmente empossado, único representante da oposição à ditadura em seu trio fundador, João Goulart. Pretensos candidatos à Presidência pelo PSD, Juscelino Kubitschek, e pela UDN, Carlos Lacerda, não reuniram suficiente adesão para enfrentar os coleguinhas parlamentares e governantes de bem com a turma das dragonas, porque também eles foram artífices civis do hediondo golpe. O fiasco da frente ampla não levou, contudo, os dirigentes políticos que se lembraram de seu bom exemplo, ainda a tempo de segui-lo. A frente ampla reuniu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e seus acólitos economistas do Plano Real, os profissionais da lei do Largo de São Francisco e outros muitos líderes de várias posições, mas uma só intenção, a de restaurar a democracia enxovalhada pela verborragia pornográfica do “mau militar” (apud Ernesto Geisel) e terrorista das bombas nos quartéis e no Guandu para aumento do próprio soldo. E também de restaurar o que resta do Estado brasileiro, alvo do projeto de demolição do capetão sem noção.
A consagração eleitoral da nova frente ampla restou sendo a única oportunidade para levar a cabo a manutenção da governança democrática no Brasil, sob o comando do ex-líder operário, que nunca foi comunista. Ela começou com a candidatura do ex-tucano e nunca socialista Geraldo Alckmin, experimentado na única disputa presidencial em que teve menos votos no segundo do que no primeiro turno, ao perder para Lula, em 2006. O até então insípido “picolé de xuxu” fez o papel que poderia ter sido de JK, junto com Lula lembrando Jango e Simone no papel de Lacerda de saia, com sua brilhante oratória e a indiscutível competência, demonstrada no exercício da inexistente bancada feminina na CPMI da Covid.
A frente ampla venceu e de sua união verdadeira dependerá a necessária restauração da democracia avariada e do Estado desmantelado. Mas vai ser preciso dar um passo adiante, adotando o superlativo e virando amplíssima. Para tanto urge aproveitar a lua de mel da transição para firmar; não apenas os pactos já prenunciados pela profissão de fé na democracia de Artur Lira e Rodrigo Pacheco. E pelos gestos heróicos, similares ao do Pasteur da política brasileira de João Dória, de governadores que, mesmo tendo apoiado o playboy derrotado no segundo turno, usaram a inesperada ação de Polícias Militares contaminadas ideologicamente pelo “nazifascistoidismo”, ensaiado pelos terroristas de estrada. Estes foram reprimidos pela disciplina imposta por Rodrigo Garcia, de São Paulo, e Ibanêis Rocha, do Distrito Federal, entre outros não mencionados aqui por mera falta de espaço gráfico. No Dois Dedos de Prosa do canal José Nêumanne Pinto do YouTube, o primeiro deu o tom de quem não se deixou intimidar por subalternos aos quais não permitiu insubordinação.
Para manter a liberdade de verdade os novos donos do poder, lembrando Getúlio após eleito pelo povo, deverão levar em conta as sábias palavras do jurista Joaquim Falcão; que, na véspera da citada conversa, deu-me entrevista com a rota do sucesso, que inclui a subida ao Olimpo na História de nossa insana republiqueta. O membro da Academia Brasileira de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro lembrou que “o pobre não precisa de auxílio para comprar comida, mas de um emprego e um título de propriedade, que garantem acesso à cidadania”. Para tanto vai ser necessário aceitar a participação de dirigentes partidários que não estavam no vale das lamentações nem nas fotos com a taça do segundo turno. São os casos de Gilberto Kassab, ex-prefeito de São Paulo; Eduardo Leite, eleito governador do Rio Grande do Sul pela segunda vez, e Raquel Lyra, que estreará no governo de Pernambuco sem ter assumido compromisso com nenhum dos lados da polarização. Há ainda outros sem mandato que podem entrar na lista da conquista do superlativo: João Doria, que apostou na vacina, negada pela canalha negacionista, e Rodrigo Garcia, que escolheu a trilha certa para o futuro, ao comandar a desobstrução de estradas paulistas garantindo o direito constitucional de ir e vir numa Pátria doente pelo emprego desavergonhado da mentira, da arrogância e da insensatez.
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