O bateu, levou em Brasília não tem nada a ver com democracia
Já tem jornalista defendendo a ação da PF, que fez busca e apreensão na casa de oito empresários bolsonaristas, depois de uma reportagem do site Metrópoles ter revelado conversas privadas na qual eles falavam umas bobagens sobre golpe de estado no caso de Lula ser eleito. Sabe como é, eles são suspeitos de financiar os atos antidemocráticos de 7 de setembro, então são passíveis automaticamente de busca e apreensão, quebra de sigilos, bloqueio de contas e suspensão em redes sociais. O dado fantástico é que as conversas das mensagens privadas -- privadas -- são as mesmas que ocorrem em churrascos. O tiozão do churrasco passou a ser uma ameaça à democracia...
Já tem jornalista defendendo a ação da PF, que fez busca e apreensão na casa de oito empresários bolsonaristas, depois de uma reportagem do site Metrópoles ter revelado uma conversa privada na qual eles falavam umas bobagens sobre golpe de estado no caso de Lula ser eleito. Sabe como é, eles são suspeitos de financiar os atos antidemocráticos de 7 de setembro, então são passíveis automaticamente de busca e apreensão, quebra de sigilos, bloqueio de contas e suspensão de contas em redes sociais. O dado fantástico é que as conversas das mensagens privadas — privadas — são as mesmas que ocorrem em churrascos. O tiozão do churrasco passou a ser uma ameaça à democracia.
Como escrevi ontem, está instaurado no Brasil o “crime de pensamento” orwelliano, e com apoio da imprensa que defende o Estado de Direito apenas para os adversários ideológicos. Tudo porque boa parte do Supremo Tribunal Federal acredita, mesmo, que haverá golpe no Brasil, apesar de não existir nenhuma condição objetiva para isso – crença que é também muito conveniente para as personalidades autoritárias que vivem naquele ecossistema.
Ontem, depois do espetáculo protagonizado pela PF, o procurador-geral da República, Augusto Aras, fez saber que estava irritado porque Alexandre de Moraes (ambos na foto), diretor do espetáculo, não o teria avisado a tempo das medidas tomadas contra os empresários bolsonaristas. Alexandre de Moraes, então, divulgou o documento em que informava Augusto Aras sobre tudo, enviado um dia antes à vice-procuradoria da República.
Não ficou só nisso, contudo. Poucas horas depois o site Jota publicou a notícia de que o próprio Augusto Aras havia participado de algumas conversas dos empresários bolsonaristas. Ele não esconde de ninguém que é amigo de um deles, Meyer Nigri, dono da Tecnisa. De acordo com a reportagem do Jota, “Nos celulares apreendidos pela Polícia Federal com empresários bolsonaristas há troca de mensagens com o procurador-geral da República, Augusto Aras. A informação é confirmadas por fontes da PF, do Ministério Público Federal e do Supremo Tribunal Federal. Ainda segundo fontes do MPF, PF e STF, nas mensagens haveria críticas à atuação do ministro Alexandre de Moraes e também comentários sobre a candidatura de Jair Bolsonaro. As mensagens ainda são mantidas sob sigilo, mas já viram tema entre ministros do STF.” Ao que parece, virou crime fazer críticas ao ministro Alexandre de Moraes.
Você, leitor, percebe a avacalhação? Apreenderam os celulares dos empresários ontem — e ontem mesmo as conversas privadas já estavam circulação no STF. Como é que pode? A mais alta instância do Judiciário virou central de fofocas? Esse material de investigação não deveria estar sob sigilo? E como é que “fontes do STF” podem confirmar o fato a um jornalista? Não se culpe o jornalista, ele está cumprindo com louvor a sua função, mas é espantoso saber que o Supremo se dá a esse tipo de comportamento em relação a matéria que afeta a vida de gente que sofreu busca e apreensão, quebra de sigilos, bloqueio de contas e suspensão em redes sociais. Ligando os pontos: Augusto Aras faz saber à imprensa sobre a sua irritação e, logo depois, o STF faz saber à imprensa que o procurador-geral da República está nas conversas. Se haverá a divulgação do teor dessas mensagens, depende, imagino, do apaziguamento entre um lado e outro. Você poderia me perguntar onde está o presidente do STF, Luiz Fux, para tentar pôr ordem na sua casa, pelo menos. Ele está dando entrevistas de final de mandato sobre as ameaças à democracia que teve de enfrentar, coitado, entre uma sessão de jiu-jitsu e outra.
Augusto Aras de um lado; Alexandre de Moraes de outro. O aspecto, digamos, divertido é que o primeiro, cujo nome apareceu na investigação no âmbito do inquérito sigiloso dos atos antidemocráticos, deu uma mão ao segundo no inquérito sigiloso das fake news. Instado a se manifestar sobre a violência cometida contra a Crusoé, censurada por Alexandre de Moraes em 2019, Augusto Aras afirmou que era preciso averiguar se a revista não estimulava os leitores a insultar o STF. Ou seja, a Crusoé continua no inquérito, assim como este jornalista aqui. Talvez agora Augusto Aras esteja sentindo na pele o que é ter o nome envolvido num inquérito sigiloso.
O bateu, levou em Brasília não tem nada a ver com democracia. Nada.
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