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A democracia tem um preço que precisa ser pago

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Mario Sabino
4 minutos de leitura 08.03.2022 13:55 comentários
Opinião

A democracia tem um preço que precisa ser pago

Desde a invasão da Crimeia, em 2014, a dependência do gás natural da Rússia aumentou na Alemanha (ultrapassa atualmente 60% do total importado), bem como na Itália (pouco menos de 50%) e na Holanda (25%). É espantoso que esses países centrais na economia da União Europeia não tenham desconfiado da fria em que estavam se metendo, do ponto de vista estratégico. Na média geral do bloco, 40% do gás consumido vem da Rússia. O imediatismo do preço mais barato predominou, numa demonstração de que a lógica econômica nunca esteve tão dissociada do contexto político internacional e dos princípios morais…

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Mario Sabino
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A democracia tem um preço que precisa ser pago
Foto: TASS/ Kremlin

Desde a invasão da Crimeia, em 2014, a dependência do gás natural da Rússia aumentou na Alemanha (ultrapassa atualmente 60% do total importado), bem como na Itália (pouco menos de 50%) e na Holanda (25%). É espantoso que esses países centrais na economia da União Europeia não tenham desconfiado da fria em que estavam se metendo, do ponto de vista estratégico. Na média geral do bloco, 40% do gás consumido vem da Rússia. O imediatismo do preço mais barato predominou, numa demonstração de que a lógica econômica nunca esteve tão dissociada do contexto político internacional e dos princípios morais.

Agora, para escapar da dependência de um país comandado por um ditador que — surpresa, surpresa — desrespeita a lei, invade países e detesta o Ocidente, a Europa busca outros fornecedores, como a Noruega e o Azerbaijão, e quer obter total independência da Rússia até 2030, segundo comunicado da Comissão Europeia. “Temos de nos tornar independentes do petróleo, do carvão e do gás da Rússia. Não podemos simplesmente contar com um fornecedor que nos ameaça de maneira explícita”, disse a presidente da Comissão, a alemã Ursula von der Leyen. Não diga, Ursula. Mas o quadro é mais complicado. Montado em reservas financeiras capazes de lhe garantir os próximos meses, Vladimir Putin (foto) ameaça cortar o fornecimento de gás para a Europa, em resposta às duras sanções econômicas que atingem a Rússia. Quem poderia imaginar, não é mesmo?

Os Estados Unidos não se intimidaram e acabam de proibir a importação de petróleo e gás da Rússia, do qual não dependem. Mesmo assim, é um ato de força importante, para mostrar a Vladimir Putin que a sua vida não será fácil. Os americanos buscam restabelecer relações cordiais com a Venezuela e, assim, levantar as sanções à importação petrolífera do país governado por Nicolás Maduro. É uma forma de amenizar a extrema dependência que os seus aliados têm da Rússia, responsável por 11% da produção mundial. Diminuir essa dependência é vital para cortar efetivamente o financiamento do regime de Vladimir Putin — o embargo americano, apesar de relevante, não é suficiente.

A grande fonte de divisas da Rússia é a exportação de gás natural e petróleo. Foi com esse dinheiro que Vladimir Putin modernizou as forças armadas russas e banca o grupo de mercenários Wagner, criado por um neonazista. São esses recursos que, direta ou indiretamente, forram as contas bilionárias dos oligarcas russos, inclusive a do próprio chefão do Kremlin, que começou roubando 100 milhões de dólares, quando ainda era assessor do então prefeito de São Petersburgo, e hoje tem uma fortuna estimada em 100 bilhões de dólares.

O ponto negativo em relação à Venezuela é que, ao liberar a importação de petróleo do país, os Estados Unidos acabam fortalecendo, num primeiro momento, um dos regimes mais autoritários do mundo. Um dos pontos positivos, para além de atenuar a emergência mundial, é que, se relações mais amigáveis forem estabelecidas com Nicolás Maduro, o ditador venezuelano poderá se afastar da órbita de Moscou, que lhe garante a existência econômica e lhe fornece armas. Ficaria impossível, assim, para Vladimir Putin usar a Venezuela como base de mísseis nucleares. Ao mesmo tempo, uma aproximação com Nicolás Maduro pode até levar, num segundo momento, a um afrouxamento do regime bolivariano, uma vez que a Rússia seria escanteada.

Ao fim e ao cabo, o que todos nós estamos descobrindo, ou redescobrindo, é que a liberdade e a democracia têm um preço que necessita ser pago. A defesa da Ucrânia é a nossa defesa.

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Mario Sabino é jornalista, escritor e sócio-fundador de O Antagonista. Escreve sobre política e cultura. Foi redator-chefe da revista Veja.

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