O império dos salteadores
A PEC da vingança, ou a PEC do Gilmar, em tramitação na Câmara, que pretende não apenas tolher a ação do Ministério Público, como até mesmo enterrar investigações promovidas por procuradores, por meio da alteração da composição do Conselho Nacional do Ministério Público, pode ir a votação nesta semana, para aproveitar a letargia causada pelo feriado. O método da caluda inaugurado por Rodrigo Maia, aquele paladino da Justiça que agora serve ao governo de João Doria, é seguido de maneira ainda mais desavergonhada por Arthur Lira (foto no destaque)...
A PEC da vingança, ou a PEC do Gilmar, em tramitação na Câmara, que pretende não apenas tolher a ação do Ministério Público, como até mesmo enterrar investigações promovidas por procuradores, por meio da alteração da composição do Conselho Nacional do Ministério Público, pode ir a votação nesta semana, para aproveitar a letargia causada pelo feriado. O método da caluda inaugurado por Rodrigo Maia, aquele paladino da Justiça que agora serve ao governo de João Doria, é seguido de maneira ainda mais desavergonhada por Arthur Lira (foto no destaque), o bolsonarista de ocasião que hoje preside a casa legislativa e praticamente fez terra arrasada do regimento que prevê a discussão de projetos importantes em comissões especiais.
A enormidade traz as patas do PT, mas foi piorada por um relator do PSD que também presta fidelidades a outras organizações e endossado por 185 parlamentares de 13 partidos, o que só mostra mais uma vez que, na Câmara, não imperam a ideologia e os princípios quando o assunto é impunidade. Impera apenas a falta de pudor dos interessados em promover lambanças institucionais, a fim de assegurar que crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, principalmente, não sejam castigados — e garantir que os que ousam inquirir e denunciar poderosos sejam apedrejados, inclusive como vingança de quem era alvo das investigações. Coisa de gente inocente.
As patas iniciais do projeto de emenda constitucional são do PT, mas o cérebro é de Gilmar Mendes, daí o apelido de PEC do Gilmar, o demolidor da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal. Ele nega que seja o autor da ideia, mas até a mesa histórica colocada no hall de entrada do STF, sem qualquer plaquinha de identificação precisa, coitada, sabe que o ministro é o grande inquisidor dos procuradores, em declarações públicas, decisões — e articulações. Habilmente, ele amplificou os problemas reais do Ministério Público, cujo poder conferido pela Constituição de 1988 vinha servindo a que alguns dos seus integrantes promovessem perseguições individuais, para generalizar e vilipendiar o MP que faz uso das suas atribuições legais para cumprir exemplarmente a sua missão — caso dos procuradores da Lava Jato. Coisa de gente interessada apenas no futuro do Brasil.
Não importa se aprovado com ou sem o bode na sala colocado pelo relator (foi ele a embarrigar o cabrão que permitiria ao Conselho Nacional do Ministério Público, uma vez controlado por agentes externos, exterminar investigações), a PEC é um escândalo que coloca os procuradores de joelhos diante de criminosos do colarinho encardido pela sujeira de crimes contra o estado e o Tesouro Nacional. Não bastou roubar, publicar e usar mensagens de integrantes do Ministério Público, fazendo-as objeto de livre e conveniente interpretação de texto, para transformar criminosos em injustiçados. Não bastou eliminar a prisão de condenados em segunda instância. Não bastou anular sentenças contra safados graúdos. Era preciso ir além no descaramento. Pior, é possível ir além.
Só que o além é o abismo de uma república que será o império dos salteadores.
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