Josias Teófilo na Crusoé: O problema do documentário biográfico
Cabe uma vida inteira num filme?
Em sua coluna semanal para Crusoé, Josias Teófilo escreve para esta edição uma análise sobre o cinema documentário que, na visão dele, este estilo de filme têm alguns vícios, um deles é: a tentativa de abarcar uma vida inteira num filme.
O cinema documentário está em alta nos streamings e documentários biográficos têm tido bastante destaque, especialmente sobre artistas. Mas existem alguns vícios muito típicos desse sub-gênero, e eles têm uma causa: a tentativa de abarcar uma vida inteira num filme.
Muitos problemas surgem daí: certas leituras apressadas sobre os personagens retratados, sobre sua época, e a relação entre esses dois elementos.
Existe um discurso comum em documentários sobre os mais diversos artistas: sejam os Beatles, os Roling Stones, Elvis Presley, ou qualquer outro artista pop relevante, que os coloca como as figuras revolucionárias que moldaram o mundo em que vivemos hoje: eles abriram caminho para a revolução sexual, para questionar a sociedade conservadora, para o feminismo, para o antirracismo etc.
Eu desconfio que o mundo mudou sozinho e os artistas mudaram junto, e não na ordem inversa, mas é que esses documentários precisam da muleta que é forçar a relação do artista com o seu tempo.
O problema é que muitas vezes o artista não estava sendo pautado pelos acontecimentos contemporâneos, por vezes ele era completamente alheio ao que estava acontecendo. Mas é mais fácil explicar uma vida relacionando-a ao momento histórico.
É que a vida de uma pessoa é repleta de acontecimentos diversos, alguns totalmente idiossincráticos, e o discurso de um documentário precisa resumi-los e dar um sentido geral. A solução mais simples – e mais fraca – é a da adjetivação. Todos esses problemas, aliás, são problemas comuns ao jornalismo cultural: forçar a relação do artista com o momento em que ele viveu, e das obras com as circunstâncias políticas contemporâneas, e a adjetivação.
Não vejo problema em relacionar as obras que de fato reagem aos seu tempo: as canções de protesto contra a Guerra do Vietnã, os filmes inspirados por maio de 68, as músicas contra a ditadura, os filmes engajados do Cinema Novo. O problema é que relacionam todas as obras ao momento presente, inclusive para situá-las ou ilustrá-las.
Nem toda obra feita na França em 1968 tinha relação com maio de 68. Nem toda música composta nos anos 1970 no Brasil era protesto contra a ditadura.
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