Alexandre Soares Silva em Crusoé: O primeiro picareta de quem não quero gostar
Já deu pra mim, chega, não vou entregar mais o meu terno coração esperançoso para o primeiro picareta que aparecer prometendo humilhar todos os outros
Para a edição de número 330 de Crusoé, Alexandre Soares Silva escreve em sua coluna uma análise sobre os “picaretas” e os candidatos à prefeitura de São Paulo.
Tenho a tendência a gostar de picaretas. Mas não quero mais. Sou como essas mulheres de bandido depois do oitavo ou nono bandido, meu rosto um pouco deformado pela passagem do tempo e pelos muitos tapas que recebi. Já deu pra mim, chega, não vou entregar mais o meu terno coração esperançoso para o primeiro picareta que aparecer prometendo humilhar todos os outros. Mas confesso que é um esforço contínuo que eu tenho que fazer para não gostar deste picareta em particular.
A maior parte das pessoas têm a tendência a gostar de picaretas, dos picaretas bem-sucedidos pelo menos, mas geralmente elas gostam deles porque não lhes percebem a picaretagem. Ou seja, não é que gostem dos picaretas porque eles são picaretas, mas é porque acham que não são. Eu tenho uma tendência também infeliz, mas diferente, que é a de gostar do picareta que praticamente berra que é picareta.
Comecei este texto falando de picaretas. Sobre quem é este texto? A quem me refiro, exatamente? Você já sabe a quem. Tamanha e tão clara é a aura de picaretagem dessa pessoa que onde quer que a palavra “picareta” esteja escrita, o espírito dessa pessoa aparecerá flutuando.
Sim, esse mesmo — quem mais? Todos os outros são picaretas, talvez piores; mas são piores porque são menos escancaradamente picaretas. Tabata Amaral, por exemplo, é tão picareta que talvez ela mesma não perceba que é picareta, e que mente para si mesma dentro da sua própria cabeça. Vá saber! Talvez ela não perceba que ela mesma no fundo acha o termo “pobreza menstrual” algo ridículo. Talvez ela não note em si mesma que sabe que humoristas não devem ir para a cadeia por contarem piadas, ou pelo menos perderem o público e irem virar gerente do clube do Danilo Gentili. Talvez ela seja uma picareta de si mesma. O fato de ela mentir para si mesma a torna uma picareta melhor ou pior?
Este de que falo seria capaz de aparecer numa propaganda política com a própria mãe sentada nos seus ombros berrando “Meu filho é um picareta, como o meu filho é picareta, meu Deus do Céu como ele é picareta, já nasceu picareta, depois se formou picareta, é picaretíssimo” etc. A picaretagem, quando honestamente expressada, não faz de ninguém honesto, mas torna um picareta menos perigoso.
Siga a leitura em Crusoé. Assine e apoie o jornalismo independente.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (0)