O teatro do Eletrogate para os irmãos Batista
Questionado pela área técnica do TCU, acordo entre o governo Lula e a Âmbar Energia levanta suspeita de favorecimento, reforçada por cartada drástica do ministro Alexandre Silveira
O Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério de Minas e Energia estão no centro de uma controvérsia sobre um acordo bilionário em favor da Âmbar Energia, empresa dos irmãos Wesley e Joesley Batista. O acordo, conduzido pelo ministro Alexandre Silveira (foto), está sob escrutínio devido a suspeitas de favorecimento.
A revista piauí detalhou as tratativas e agora chama a atenção para uma encenação que teria sido montada para dar a entender que o governo Lula não está tentando beneficiar os irmãos Batista.
Tudo gira em torno da Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso), criada por Bruno Dantas no âmbito do TCU sob a alegação de mediar disputas, mas que acabou se tornando um palco para negociações bilionárias obscuras.
Um dos acordos mais controversos da SecexConsenso envolve a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e o Ministério de Minas e Energia, em benefício da Âmbar Energia, no que já foi apelidado de “Eletrogate”. “Pelos termos do acordo, a empresa dos irmãos Batista garante receitas de 9,4 bilhões de reais, pagas pelos cofres públicos, mesmo depois de descumprir contratos de quase o dobro desse valor com o governo”, descreve a piauí.
A manobra de Alexandre Silveira
A revista informou nesta quinta-feira, 18, que Silveira enviou um ofício ao TCU sugerindo a suspensão e análise de todos os acordos emergenciais firmados em 2021 para fornecer energia durante a crise hídrica, no governo Jair Bolsonaro.
Nenhuma das empresas contratadas por meio daquela licitação cumpriu o acordado, que era construir usinas termelétricas e oferecer energia em um prazo de sete meses. Todas foram multadas, inclusive a Âmbar, mas a empresa dos Batista é a única que não fechou um acordo sobre o assunto.
O caso da Âmbar é mais complexo, como detalhou a piauí em sua edição mensal:
“A Âmbar Energia fez um caminho diferente. Comprou por 344 milhões de reais o direito de gerar energia de outra empresa, a Evolution Power Partners (EPP), que ganhara um contrato de 17 bilhões de reais no leilão com o compromisso de construir quatro usinas térmicas. Ao comprar o direito da EPP, a Âmbar, em vez de construir as termelétricas como constava no contrato, resolveu arrendá-las de uma terceira empresa. Mesmo assim, não conseguiu entrar em operação a tempo. Passou a ser multada, não pagou e, em agosto, no fim do prazo máximo, sua credencial para operar foi cassada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Começou então a clássica sequência de pedidos ofícios, recursos para lá e para cá, mas os irmãos Batista nunca levaram o caso à Justiça. Queriam resolver tudo pelas vias administrativas”.
A oportunidade de encaminhar o assunto dessa maneira surgiu com o retorno de Lula à Presidência da República. O caso foi parar na SecexConsenso junto com os outros, mas nem lá houve jeito para ele, pois os testes não conseguiram comprovar que as usinas da Âmbar estavam prontas para operar, e as tentativas de dar um jeitinho para chegar a um “consenso” sobre o assunto foram tão casuísticas que o relator do caso, Benjamin Zymler, ficou constrangido em aprovar um acordo, que acabou arquivado. Assim, a bola passou para Silveira, com o incentivo dos ministros do TCU.
Resgate
O ministro de Minas e Energia selou um acordo, que previa que os contratos da Âmbar cairiam de 18,7 bilhões de reais para 9,4 bilhões e seriam ampliados de 44 meses para 88 meses. “Nesse redesenho, a empresa deixa de gerar energia constantemente e passa a fazê-lo sob demanda. E a multa da empresa pelo descumprimento dos quatro contratos, que poderia chegar a até 6 bilhões de reais, ficava fixada em apenas 1,1 bilhão de reais”, descreve a piauí.
Os termos do acordo foram enviados para avaliação do TCU em 18 de abril. A área técnica do tribunal voltou a se manifestar contra, de forma ainda mais contundente, afirmando que ele é desvantajoso para a União e para os consumidores de energia. Agora, Silveira propõe suspender todos os acordos, o que seria uma “medida de cautela, de equidade e para que a isonomia dos atos administrativos praticados seja preservada, em respeito a todos os princípios que regem a Administração Pública”.
No mercado de energia, a proposta do ministro foi vista como uma tentativa desesperada de salvar o acordo com a empresa do grupo J&F. Advogados do setor interpretaram a medida como uma ameaça velada para favorecer os Batista, diz a piauí. A proposta de suspensão geral não faz sentido, já que os outros acordos não haviam sido questionados pelas áreas técnicas do TCU ou pelo Ministério Público.
Ninguém quer o acordo?
Além disso, após publicação da reportagem da Piauí, o TCU tentou se desvencilhar de suspeitas, alegando que o acordo foi arquivado devido à falta de consenso interno. No entanto, ministros como Benjamin Zymler e Antonio Anastasia expressaram publicamente sua simpatia pelo acordo. O presidente do TCU, Bruno Dantas, também mencionou dificuldades regimentais que impediram a rejeição formal do acordo.
Ou seja, ninguém quer o acordo (declaradamente), mas todos parecem agir — ou torcer — para que ele ocorra.
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