O lobby em torno do ‘Gilmarpalooza’
Coquetéis em Lisboa reúnem ministros do STF e do STJ, parlamentares e donos de grandes empresas com interesses nos tribunais superiores e no Congresso
“Todos terão acesso à casta da República do Escambo, bem longe do povo brasileiro”, antecipou O Antagonista diante do reconhecimento da imprensa de que empresários e lobistas frequentam o Gilmarpalooza, Fórum de Lisboa organizado anualmente pelo ministro Gilmar Mendes (à direita na foto da abertura do evento), do Supremo Tribunal Federal (STF), e cuja décima segunda edição começa nesta quarta-feira, 26 de junho.
Leticia Casado registra no UOL um desses encontros entre as elites dos setores público e privado, com a presença de Gilmar:
“O empresário Flávio Rocha, dono da rede de varejo Riachuelo, recebeu mais de 80 convidados em seu apartamento de cobertura em Lisboa para um drink de boas-vindas.
A lista inclui os irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da JBS; Marcos Molina, fundador do frigorífico Marfrig; Bruno Ferrari, fundador e CEO do Grupo Oncoclínicas; Rubens Ometto, da Cosan; e o banqueiro André Esteves, do BTG, entre outros nomes de peso no PIB.
Deputados e senadores também foram ao evento — entre os quais, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e o presidente do Progressistas, senador Ciro Nogueira (PI). E também os cinco cotados para a sucessão de Lira: Elmar Nascimento (União-BA), Isnaldo Bulhões (MDB-AL), Dr. Luizinho (PP-RJ), Hugo Motta (Republicanos-PB) e Marcos Pereira (Republicanos-SP).”
Coquetel
Nunca é demais lembrar que Lira (à esquerda na foto) foi blindado por Gilmar no inquérito sobre kits-robótica dias após ter palestrado no Gilmarpalooza de 2023.
No coquetel de Rocha, quem palestrou foi o “advogado criminalista brasileiro Pierpaolo Bottini”, que defendeu na Lava Jato o executivo Dalton Avancini, da Camargo Corrêa, e a apresentadora Claudia Cruz, esposa do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, entre outros clientes.
Também estava presente o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Humberto Martins, pai do advogado Eduardo Martins, alvo da Lava Jato. Humberto chegou a abrir investigação sobre o conteúdo não autenticado de mensagens roubadas de autoridades ligadas à força-tarefa anticorrupção, mas teve de arquivar o caso por falta de provas que sustentassem as ilações da imprensa amiga.
Provas anuladas
Desde então, o STF preferiu jamais abrir processo sobre mensagens roubadas, com direito a ampla defesa, mas simplesmente acusar um suposto conluio, para então anular provas e atos da Lava Jato contra a casta da República, incluindo políticos e empresários que agora confraternizam em Lisboa com julgadores.
Em qual país do mundo, afinal, um ministro de Suprema Corte, anfitrião de fórum, media um painel com um banqueiro que ele próprio blindou contra uma força-tarefa anticorrupção?
Brasil?
Não. Portugal.
Brasileiros são o ministro (organizador do evento na capital portuguesa) e o banqueiro (cujo banco realiza, na cidade, outro coquetel privado, em restaurante de terraço de hotel).
Universalização da imprensa amiga
Gilmar e André Esteves, do BTG, estão escalados como dupla de moderação da conversa com Thomas Friedman, editorialista do New York Times. É a universalização da imprensa amiga.
Flávio Rocha, aliás, “integra o Esfera Brasil, grupo capitaneado pelo empresário João Camargo e que reúne executivos de algumas das principais companhias do país para dialogar com o poder público”. Sogro de Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União, João Camargo é o comandante da emissora de TV CNN Brasil, que exibe painéis de eventos do Esfera, sempre com a participação de seu aliado Gilmar. A edição de Paris, por exemplo, também reuniu o ministro do STF e Wesley Batista, alvo da Lava Jato, em outubro de 2023.
Foi lá que Gilmar se gabou de ter blindado a casta: “Muitos dos personagens que hoje estão aqui, de todos os quadrantes políticos, só estão porque o Supremo enfrentou a Lava Jato. Eles não estariam aqui. Inclusive o presidente da República [Lula], por isso é preciso compreender o papel que o Tribunal desempenhou.”
Eles compreendem, claro. Até hoje mantêm aberto o diálogo com os setores de habeas corpus, alteração de jurisprudência, anulação de provas e atos, declaração de incompetência e suspeição, e arquivamento de processos.
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