Orlando Tosetto na Crusoé: Gentinha de confiança
São 90 mil pessoas em “cargos de livre nomeação”. É gente demais para confiar segredos
Eu, como o amigo leitor, a amiga leitora, sou um cidadão comum, um dos chamados rostos anônimos na multidão. Dou meus pulos, faço meus corres, como se diz, para sobreviver, fazer três refeições por dia, pagar meus boletos e abastecer a Democracia com os justos impostos que ela me… eu ia dizer que ela me cobra, mas a Democracia é boa e bacana, não cobra ninguém, de sorte que direi: com os impostos que ela me solicita.
(Solicitar é um verbo tão respeitável, né? Tão digno. Quem solicita está acima de quem pede ou de quem roga; por outro lado, quem solicita é bem mais simpático do que quem exige, impõe ou extorque. É a mesma coisa com “aguardar”: é tão mais digno do que “esperar”. Quem espera é gentinha; os melhores aguardam. O jeito correto de se fazer política é assim: fazer com que mais do mesmo não soe como mais do mesmo. E nunca usar palavras como “gentinha”.)
Enfim, o que interessa é que, em nossa qualidade triste de gente comum – gente que pede, não solicita; gente que espera, não aguarda –, nós não temos empregos a dar, comissões a conceder, e nem gente de confiança a quem encarregar. Não que eu não tenha gente de confiança na vida: tenho amigos íntimos, tenho meu encanador de confiança, meu barbeiro de confiança, meu açougueiro de confiança, até a gerente da minha conta de banco é quase, quase de confiança. E tenho certeza de que é assim com você também que me lê.
Não assim o Governo. Coitado: ele é obrigado a confiar em muito mais gente. Mais de 90.000 pessoas, que são as que detêm os chamados “cargos de livre nomeação”, e que são – pelo menos, deveriam ser – gente da confiança do Governo. Ou, um pouco mais precisamente, da confiança de quem está no Governo. São cargos de direção e assessoramento, são funções e gratificações ditas “técnicas” que, somadas, dão esse público de final de campeonato – apenas, um público que se repete todos os meses, recebendo e não pagando, ao longo de todos os Governos.
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