Por que é preciso manter o veto ao crime das fake news eleitorais
Regra amplia ainda mais um poder de polícia que a Justiça eleitoral já vem exercendo sem controle adequado por parte dos cidadãos
O Congresso deve decidir na tarde desta terça-feira, 28, se mantém ou se derruba o veto de Jair Bolsonaro a uma regra que criminaliza a disseminação em massa de “fatos inverídicos” durante as eleições. As penas vão de 1 a 5 anos de cadeia, além de multa. Não é pouca coisa.
Espero que o veto seja mantido, ou seja, que a regra não entre em vigor.
Ela ampliaria ainda mais um poder de polícia que a Justiça eleitoral já vem exercendo sem controle adequado por parte dos cidadãos.
Poder excessivo no TSE
Basta observar as regras sobre propaganda eleitoral aprovadas pelo TSE em fevereiro e válidas para as eleições deste ano (resolução 23.732/24).
Elas já estão repletas de hipóteses em que os juízes podem determinar a exclusão sumária de conteúdos e perfis das redes sociais, pela veiculação de “fatos notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos”.
A definição do que sejam esses “fatos notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados” cabe aos ministros do TSE, que inclusive proibiram as instâncias inferiores da Justiça eleitoral de discordarem deles, tornando suas decisões nesse campo vinculantes (artigo 9-F).
Policiamento permanente
O TSE dispõe hoje em dia de um braço de monitoramento permanente das redes sociais, a Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED), encabeçado por agentes da Polícia Federal.
Para completar, vai na cabeça dos ministros que o trabalho da Justiça eleitoral já não se restringe aos períodos de campanha. O ministro Benedito Barbosa (que já deixou a Corte) registrou essa tese de maneira muito clara em um de seus votos: “o fenômeno eleitoral tende a assumir uma temporalidade contínua, o que justifica o amoldamento da competência deste tribunal às circunstâncias contemporâneas”.
Pode-se traduzir desta maneira o raciocínio de Barbosa: se a luta política acontece o tempo todo nas redes sociais, também é preciso vigiá-la de maneira permanente; cabe à Justiça eleitoral fazer esse policiamento.
Nesse aparato de controle só falta mesmo uma regra de criminalização. Ela está inscrita no artigo que o Congresso analisa hoje.
Validá-la, seria dar um poder excessivo a um ramo da Justiça que vem assumindo um papel repressivo meio que clandestinamente, sem ter nascido para isso.
Más intenções
Lamento que ao assumir esse posicionamento tenha de me ver ao lado de políticos como Bia Kicis, Gustavo Gayer ou os filhos de Jair Bolsonaro.
Por mais que eles jurem estar preocupados com a liberdade de expressão, o fato é que o seu sucesso eleitoral sempre esteve ligado à disseminação em massa de discursos aloprados e propostas golpistas. Não acredito nem por um segundo em suas boas intenções.
Infelizmente, nem sempre é possível escolher as companhias.
Espero que o veto ao “crime das fake news eleitorais” seja mantido, porque ele amplia excessivamente o poder de polícia do TSE. Não é missão da Justiça Eleitoral vigiar a conversa política dos brasileiros.
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