Não se acaba com a história do Brasil a marretadas
"Deus honrou o Estado Islâmico e vai nos ajudar a derrubar tudo o que era adorado antigamente". Essa mensagem foi disseminada em um dos vários vídeos em que jihadistas destruíam obras de arte e monumentos históricos em museus do Iraque e cidades históricas da Síria, em 2015. Um desprezo semelhante pelo passado se manifestou...
“Deus honrou o Estado Islâmico e vai nos ajudar a derrubar tudo o que era adorado antigamente”. Essa mensagem foi disseminada em um dos vários vídeos em que jihadistas destruíam obras de arte e monumentos históricos em museus do Iraque e cidades históricas da Síria, em 2015. Um desprezo semelhante pelo passado se manifestou no último 8 de janeiro, quando os manifestantes que invadiram as sedes dos Três Poderes, em Brasília, quebraram tudo o que encontraram pela frente.
Especialistas em história da arte consultados por O Antagonista (assista a reportagem em vídeo) acreditam que os ataques de extremistas bolsonaristas são tentativas criminosas de apagamento do passado.
A socióloga e professora titular da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP Cristina Costa identifica um impulso de destruir aquilo que, na visão de quem destrói, significa o que há de ruim. “Acho que há várias saídas sem ser a destruição, que eu chamaria hoje de cancelamento. Porque não há diálogo, não há discussão, não há proposta, não há pesquisa”, analisa.
O cineasta Josias Teófilo enxerga, na ação criminosa contra as obras de arte, uma vontade de se livrar do passado, para criar uma nova ordem. “É um mentalidade messiânica, destrutiva. Termina sobrando para as obras de arte. Porque as obras representam a cultura. Representam o que existe de melhor. O que melhor representa as relações passadas”, comenta.
O relatório preliminar produzido por técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), entregue ao Ministério da Cultura no último dia 12 de janeiro, traça um panorama dos danos causados aos bens patrimoniais e obras de arte. O documento baseará as próximas ações de reconstrução, de acordo com cada órgão responsável.
“Na nossa leitura, a maioria dos danos aos edifícios é reparável. Num segundo momento, vamos poder avaliar melhor os danos aos bens móveis. Tem, obviamente, casos icônicos. O problema é que as obras de arte têm um valor incalculável e técnicas específicas para recuperação”, disse o coordenador técnico do Iphan, Maurício Goulart, em entrevista coletiva.
O presidente do Iphan, Leandro Grass, informou que as instituições que abrigam esses bens móveis, especialmente obras de arte, ainda analisam o cenário de acordo com cada peça. “Algumas dessas obras já foram, inclusive, encaminhadas para restauro, que já se identificou que é possível. Sobre relógio que está no Palácio do Planalto, por exemplo, há uma indefinição, porque não existe hoje uma percepção de que é possível restaurar ele no Brasil”.
O relógio de pêndulo citado foi criado por Balthazar Martinot, relojoeiro do Rei francês Luis XIV. A peça foi dada de presente a Dom João VI e está no Brasil desde 1808. Imagens de câmeras de segurança no terceiro andar do Palácio do Planalto flagraram o momento em que um homem, vestido com uma camisa ilustrada com o rosto de Jair Bolsonaro, derruba o relógio. A peça ficou totalmente fragmentada.
Estava exposta também no Planalto a escultura em bronze O Flautista, de Bruno Giorgi, um dos maiores escultores brasileiros. Ela foi partida e arrancada de sua base. Suas peças foram recolhidas e catalogadas para uma futura tentativa de restauro.
Di Cavalcanti, um dos maiores expoentes do movimento modernista da década de 1920, também foi alvo dos extremistas. Uma de suas principais obras, As Mulatas, avaliada em R$ 8 milhões, teve a tela furada e rasgada em sete pontos diferentes.
A brutalidade e ignorância de radicais parece materializar um menosprezo à classe artística, incentivado por bolsonaristas nos últimos anos. “A gente vê muito no pessoal do governo Bolsonaro, principalmente Mário Frias, André Porciúncula [ambos da Secretaria de Cultura], essa mentalidade de dizer assim: ‘Para que que serve isso? Arte serve para quê?’. É como se fosse um luxo inútil. Sendo que não existe país sem cultura”, diz Josias.
Pelo menos uma resposta aos ataques à cultura brasileira já foi dada. A escultura Bailarina, produzida em 1920 pelo escultor ítalo-brasileiro Victor Brecheret já foi restaurada e colocada de volta ao local onde estava antes da invasão à Câmara dos Deputados. “Nós somos a nossa cultura, nós somos a nossa história e nós não vamos poder acabar com ela na marretada”, conclui a socióloga Cristina Costa.
Não se acaba com a história do Brasil a marretadas
"Deus honrou o Estado Islâmico e vai nos ajudar a derrubar tudo o que era adorado antigamente". Essa mensagem foi disseminada em um dos vários vídeos em que jihadistas destruíam obras de arte e monumentos históricos em museus do Iraque e cidades históricas da Síria, em 2015. Um desprezo semelhante pelo passado se manifestou...
“Deus honrou o Estado Islâmico e vai nos ajudar a derrubar tudo o que era adorado antigamente”. Essa mensagem foi disseminada em um dos vários vídeos em que jihadistas destruíam obras de arte e monumentos históricos em museus do Iraque e cidades históricas da Síria, em 2015. Um desprezo semelhante pelo passado se manifestou no último 8 de janeiro, quando os manifestantes que invadiram as sedes dos Três Poderes, em Brasília, quebraram tudo o que encontraram pela frente.
Especialistas em história da arte consultados por O Antagonista (assista a reportagem em vídeo) acreditam que os ataques de extremistas bolsonaristas são tentativas criminosas de apagamento do passado.
A socióloga e professora titular da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP Cristina Costa identifica um impulso de destruir aquilo que, na visão de quem destrói, significa o que há de ruim. “Acho que há várias saídas sem ser a destruição, que eu chamaria hoje de cancelamento. Porque não há diálogo, não há discussão, não há proposta, não há pesquisa”, analisa.
O cineasta Josias Teófilo enxerga, na ação criminosa contra as obras de arte, uma vontade de se livrar do passado, para criar uma nova ordem. “É um mentalidade messiânica, destrutiva. Termina sobrando para as obras de arte. Porque as obras representam a cultura. Representam o que existe de melhor. O que melhor representa as relações passadas”, comenta.
O relatório preliminar produzido por técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), entregue ao Ministério da Cultura no último dia 12 de janeiro, traça um panorama dos danos causados aos bens patrimoniais e obras de arte. O documento baseará as próximas ações de reconstrução, de acordo com cada órgão responsável.
“Na nossa leitura, a maioria dos danos aos edifícios é reparável. Num segundo momento, vamos poder avaliar melhor os danos aos bens móveis. Tem, obviamente, casos icônicos. O problema é que as obras de arte têm um valor incalculável e técnicas específicas para recuperação”, disse o coordenador técnico do Iphan, Maurício Goulart, em entrevista coletiva.
O presidente do Iphan, Leandro Grass, informou que as instituições que abrigam esses bens móveis, especialmente obras de arte, ainda analisam o cenário de acordo com cada peça. “Algumas dessas obras já foram, inclusive, encaminhadas para restauro, que já se identificou que é possível. Sobre relógio que está no Palácio do Planalto, por exemplo, há uma indefinição, porque não existe hoje uma percepção de que é possível restaurar ele no Brasil”.
O relógio de pêndulo citado foi criado por Balthazar Martinot, relojoeiro do Rei francês Luis XIV. A peça foi dada de presente a Dom João VI e está no Brasil desde 1808. Imagens de câmeras de segurança no terceiro andar do Palácio do Planalto flagraram o momento em que um homem, vestido com uma camisa ilustrada com o rosto de Jair Bolsonaro, derruba o relógio. A peça ficou totalmente fragmentada.
Estava exposta também no Planalto a escultura em bronze O Flautista, de Bruno Giorgi, um dos maiores escultores brasileiros. Ela foi partida e arrancada de sua base. Suas peças foram recolhidas e catalogadas para uma futura tentativa de restauro.
Di Cavalcanti, um dos maiores expoentes do movimento modernista da década de 1920, também foi alvo dos extremistas. Uma de suas principais obras, As Mulatas, avaliada em R$ 8 milhões, teve a tela furada e rasgada em sete pontos diferentes.
A brutalidade e ignorância de radicais parece materializar um menosprezo à classe artística, incentivado por bolsonaristas nos últimos anos. “A gente vê muito no pessoal do governo Bolsonaro, principalmente Mário Frias, André Porciúncula [ambos da Secretaria de Cultura], essa mentalidade de dizer assim: ‘Para que que serve isso? Arte serve para quê?’. É como se fosse um luxo inútil. Sendo que não existe país sem cultura”, diz Josias.
Pelo menos uma resposta aos ataques à cultura brasileira já foi dada. A escultura Bailarina, produzida em 1920 pelo escultor ítalo-brasileiro Victor Brecheret já foi restaurada e colocada de volta ao local onde estava antes da invasão à Câmara dos Deputados. “Nós somos a nossa cultura, nós somos a nossa história e nós não vamos poder acabar com ela na marretada”, conclui a socióloga Cristina Costa.