O plano de Doria é gastar dinheiro para perder
Há pouco mais de dois anos, antes da pandemia, eu disse pessoalmente a João Doria (foto) o que venho dizendo desde há muito: que ele jamais será presidente da República. Não faço futurologia, mas não tenho receio de fazer essa afirmação, porque os dados de realidade estão aí: a alta rejeição que ele tem como governador do estado vem desde há muito e persiste como impávido colosso -- em dezembro, apenas 24% dos eleitores paulistas aprovam a sua gestão, que é reprovada por 38% e considerada regular por 37%, segundo o Datafolha...
Há pouco mais de dois anos, antes da pandemia, eu disse pessoalmente a João Doria (foto) o que venho dizendo desde há muito em público: que ele jamais será presidente da República. Não faço futurologia. No entanto, não tenho receio de fazer a projeção, porque os dados de realidade estão aí, bastante consistentes: a alta rejeição que ele tem como governador do estado permanece como impávido colosso — em dezembro, apenas 24% dos eleitores paulistas aprovavam a sua gestão, que era reprovada por 38% e considerada regular por 37%, segundo o Datafolha. Com esse handicap, João Doria provavelmente nem seria reeleito governador, imagine presidente da República. Em 2018, aliás, ele escapou da derrota apenas porque fez uma aliança oportunista de ultimíssima hora com Jair Bolsonaro, o infame “bolsodoria”, e passou a andar a tiracolo com Joice Hasselmann, então aliada mais vistosa do futuro presidente. Ainda assim, conseguiu uma vantagem de apenas 3,5% sobre Márcio França, o seu rival no segundo turno.
O marketing despudorado com a Coronavac, com coletivas praticamente diárias durante o auge da pandemia, e a troca constante de ataques contra Jair Bolsonaro não renderam popularidade a João Doria. Tanto é que ele permanece estacionado na casa dos 3% nas pesquisas eleitorais. Não é impossível que esse índice aumente com o início da campanha, mas será preciso um milagre e tanto para ele se mostrar realmente competitivo.
A Faria Lima adoraria ter João Doria como presidente da República — a questão é que, para ser presidente da República, não basta ser bom administrador. É preciso ter outros atributos, como carisma popular. Doria é engomadinho demais, paulistano demais, e a sua pergunta, durante uma entrevista na Câmara Municipal de Guarabira, cidade de 59 mil habitantes, no interior da Paraíba, sobre quem ali já havia ido a Dubai, é muito reveladora da distância que o separa da maior parte do eleitorado brasileiro.
Ele também não é benquisto dentro do seu partido. A ala histórica o detesta, embora lhe declare apoio em público, e a sua vitória nas prévias do PSDB mostra apenas como ele se tornou dono da sigla. Não foi uma vitória da convicção partidária — e, sem convicção, não há união. Se você substituir a palavra “prévias” por “fratricídio”, a definição para o que ocorreu fica até mais exata. Embora seja dono, João Doria continua às voltas com rebeldes que não aceitam ser propriedade, como Aécio Neves, a sua nêmesis.
Esse jantar de ontem à noite, na casa de Pimenta da Veiga, que reuniu tucanos “preocupados com a altíssima e persistente rejeição a João Doria” só explicita a divisão. Presente ao jantar, assim como Aécio Neves e ouros próceres tucanos, Eduardo Leite, vencido nas prévias e cortejado por Gilberto Kassab para ser candidato a presidente pelo PSD, disse ao Estadão que eles vão querer que a campanha de João Doria lhes apresente um plano: “Conversamos e ponderamos sobre o cenário e perspectivas e iremos fazer a discussão internamente no partido. Todos desejam entender qual o plano de voo, o plano de ação que o candidato e sua equipe apresentam para reverter o quadro adverso. E é isso que será demandado”, disse ele ao jornal. O que eles querem é forçar João Doria a desistir da candidatura (e lançar outro nome ou aderir logo a Lula).
A reação de João Doria ao jantar veio em entrevista à Rádio Eldorado: “Foi um jantar de derrotados, com todo respeito. Todos eles foram derrotados nas prévias. Eu entendo que, na vida pública e também na vida privada, você tem que compreender vitórias e derrotas. E acrescentou que “as prévias não deram o partido ao candidato, deram um candidato ao partido”. O pré-candidato tucano disse, no entanto, achar legítima a demanda pela apresentação de um plano e coisa e tal, mas a expressão “jantar de derrotados” ilustra o grau de belicosidade interna.
Na verdade, tanto o jantar como a resposta de João Doria mostram um PSDB com fraturas expostas de um esqueleto com ossos de vidro. O único plano até o momento é gastar um monte de dinheiro para perder a eleição presidencial. Isso significa também pôr a perder qualquer outra candidatura de Terceira Via. E, de lambuja, os tucanos podem entregar a joia da coroa, o estado de São Paulo, ao PT ou a um aliado de Lula.
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