O governo vale menos que um coco petrificado
A primeira frase da página do Iphan dedicada à Luzitânia, uma canoa de tolda construída com técnicas tradicionais no início do século 20, resume bem o valor cultural da embarcação: "A canoa de tolda é o maior símbolo do rio São Francisco e só existe no Brasil." Por ser uma das três únicas canoas desse tipo ainda capazes de navegar, a Luzitânia foi tombada como patrimônio náutico brasileiro, em 2010. Mas nem o valor cultural, nem o tombamento, bastaram para pô-la a salvo do governo Bolsonaro...
A primeira frase da página do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) dedicada à Luzitânia, uma canoa de tolda construída com técnicas tradicionais no início do século 20, resume bem o valor cultural da embarcação: “A canoa de tolda é o maior símbolo do rio São Francisco e só existe no Brasil.”
Por ser uma das três únicas canoas desse tipo ainda capazes de navegar, a Luzitânia foi tombada como patrimônio náutico brasileiro, em 2010. Mas nem o valor cultural, nem o tombamento, bastaram para pô-la a salvo do governo Bolsonaro.
Uma reportagem exibida neste sábado pelo Jornal Nacional mostrou que a canoa emborcou no dia 25 de janeiro, por causa de um aumento de vazão no São Francisco, e está afundando.
Antes mesmo que o acidente acontecesse, a ONG Canoa de Tolda, dona da Luzitânia (e que mantém um bom site com informações a seu respeito), teria entrado em contato com o Iphan, pedindo ajuda para protegê-la. Não houve nenhuma resposta.
Neste domingo, um juiz de Sergipe mandou que o órgão assuma os custos da recuperação. A água já danificou partes do barco que não poderiam estar submersas.
O que teria sido necessário para pôr a Lusitânia a salvo do afundamento? Alguém que levasse o alerta de risco a sério, um ou dois telefonemas e algum (pouco) dinheiro. Muito pouco, tendo em vista a história do barco e o seu significado para as pessoas que vivem na região onde ele navega (ou navegava). Sob Bolsonaro, contudo, a missão do Iphan é não fazer nada.
O Iphan é um dos melhores exemplos de como as antipolíticas de um antipresidente são postas em prática.
Na impossibilidade de simplesmente extinguir o órgão, Bolsonaro inviabilizou o seu funcionamento. “Ripou” a diretoria e instalou na presidência uma pessoa sem qualificação técnica para o trabalho que precisa ser feito.
Fez isso para evitar que alguém mais passasse pelo sofrimento inominável de seu amigo Luciano Hang, que teve uma construção paralisada por 40 dias para uma averiguação. Fragmentos de cerâmica que poderiam ter valor histórico haviam sido encontrados no local.
Bolsonaro descreveu assim o problema: “O Iphan para qualquer obra do Brasil, como para a do Luciano Hang. Enquanto ‘tá’ lá um cocô petrificado de índio, para a obra, pô!”
Nosso antipresidente (e uma parte significativa do empresariado brasileiro, ao que tudo indica) parece acreditar que preservação histórica e desenvolvimento econômico são incompatíveis.
Não são, obviamente, como demonstram a Itália, a França, a Espanha e tantos outros países. Mas Bolsonaro não é homem de se render a evidências. Ele acredita no que acredita – em cloroquina, por exemplo. O resto é intriga da oposição.
Como sempre, Bolsonaro está errado. O que atrasa o Brasil não é o coco petrificado, mas o seu governo medonho.
PS: E se a canoa houver tombado por erro dos seus proprietários?, alguém poderia perguntar. A questão pode ser investigada, mas não é prioritária. Para o Iphan, ao menos, antes de tudo deve vir a salvação de um bem tombado.
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