O caso Toffoli deveria acender o sinal vermelho no STF
Já era bola cantada que o Supremo Tribunal Federal anularia a delação de Sérgio Cabral, depois que veio à tona o relato do ex-governador sobre a suposta venda de duas sentenças por Dias Toffoli. Tanto que, antes do resultado do julgamento, eu disse que se tratava de mais um erro do tribunal, pois o assunto deveria ser tratado abertamente, à luz do sol, o melhor detergente, em vez de ser morto na noite escura do plenário virtual...
Já era bola cantada que o Supremo Tribunal Federal anularia a delação de Sérgio Cabral, depois que veio à tona o relato do ex-governador sobre a suposta venda de duas sentenças por Dias Toffoli. Tanto que, antes do resultado do julgamento, eu disse que se tratava de mais um erro do tribunal, pois o assunto deveria ser tratado abertamente, à luz do sol, o melhor detergente, em vez de ser morto na noite escura do plenário virtual.
Nenhum de nós tinha qualquer ilusão sobre a conclusão do julgamento, mas nele ocorreu um fato espantoso até mesmo para quem já achava não se assustar mais com nada: Dias Toffoli não se declarou impedido para votar. Como já publicamos, mas é importante repetir, o ministro simplesmente rasgou o Código do Processo Penal. O artigo 252 do cartapácio traz quatro situações nas quais um juiz não pode atuar em um processo. Dias Toffoli se enquadra à perfeição na quarta, que é quando o magistrado, “ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito”. É preciso ser um sacripanta para imaginar que Dias Toffoli não tinha interesse direto na anulação da delação de Sérgio Cabral.
Como noticiou a Crusoé, colegas de Dias Toffoli no STF ficaram muito incomodados com o que julgam ser — e é — uma atitude que desgasta ainda mais a imagem da corte perante a sociedade. De acordo com a revista, “um grupo de ministros, dos quais fazem parte o presidente Luiz Fux, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e até Ricardo Lewandowski, acredita que Toffoli deveria ter se preservado e preservado a instituição declarando-se impedido. Ainda mais porque, quando ele votou, o plenário já havia formado maioria para derrubar a delação de Cabral”.
O decano Marco Aurélio Mello, que está para se aposentar, foi bastante direto. Ele disse ao UOL, e repetiu na Crusoé: “Eu, no lugar dele, teria me declarado impedido ontem, porque a comunidade jurídica e os leigos não entendem isso. Julgar em causa própria é a pior coisa para o juiz. Eu esperava que ele saísse do processo. No lugar dele, eu teria saído.” E acrescentou: “Por isso é que o Supremo hoje em dia quase não é levado a sério. Isso é péssimo em termos institucionais. Perde a instituição. Não estou atacando o colega, estou defendendo a instituição que integro”.
Esse é ponto sobre o qual os ministros deveriam se debruçar: a preservação da instituição, essencial para a democracia, precisa ser colocada acima dos interesses individuais de cada integrante do tribunal. Não é mais possível que assistam inertes a colegas que rasgam a Constituição e atropelam códigos sem cerimônia, para fazer prevalecer jurisprudências de ocasião. Agir para coibir que ministros ajam ao arrepio da letra da lei é fundamental para que o STF recupere a credibilidade perdida e seja respeitado. Esse é o caminho, não inquéritos sigilosos, votações movidas pelo espírito de corpo ou perseguições a quem ousa tentar quebrar o tabu de investigar movimentos suspeitos de integrantes do tribunal. Na inexistência de instrumentos mais duros de autorregulação (que sejam criados, por favor), os recados dos integrantes da corte têm de ser dados em alto e bom som, tanto de dentro para dentro como de fora para dentro, a fim de evitar que absurdos continuem a ser perpetrados.
Dito isso, eu me pergunto o que se passa na cabeça de Dias Toffoli. Ele não precisava ter votado no julgamento da anulação da delação de Sérgio Cabral, como apontaram ministros, mas mesmo assim foi adiante, contrariando o Código de Processo Penal e o bom senso. Foi para mostrar que não tinha nada a temer a respeito do que disse o ex-governador do Rio de Janeiro? Se não tem nada a temer, por que, repito, não abre mão dos seus sigilos? Foi para mostrar que o seu poder é incontrastável? Mas será que os áulicos que o cercam não são capazes de lhe dizer que o maior poder é aquele que não precisa ser exercido? E, no entanto, ele alega que não estava impedido.
O caso Toffoli deveria acender o sinal vermelho no STF.
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