O argumento de Bolsonaro sobre as jóias sauditas não para de pé
Jair Bolsonaro, seus filhos e seus defensores, como o advogado Frederick Wassef, já deixaram claro qual sua linha de defesa no caso dos presentes masculinos que os árabes lhe deram, e que o ex-presidente admitiu ter guardado para si: a caneta, o anel, as abotoaduras, o relógio e o terço árabe eram "personalíssimos" e, portanto, podiam ficar com ele...
Jair Bolsonaro, seus filhos e seus defensores, como o advogado Frederick Wassef, já deixaram claro qual sua linha de defesa no caso dos presentes masculinos (foto) que os sauditas lhe deram, e que o ex-presidente admitiu ter guardado para si: a caneta, o anel, as abotoaduras, o relógio e o terço árabe eram “personalíssimos” e, portanto, não precisavam ir para o acervo da Presidência da República.
Deixemos de lado o fato que demorou um tanto para afinarem o discurso – o que indica que foi preciso esforço para tirar o argumento da cartola. A história para de pé?
A resposta é negativa, porque o Tribunal de Contas da União analisou o tema em 2016 e criou parâmetros para separar objetos que deveriam ser atribuídos ao acervo da Presidência e os que fariam parte do acervo pessoal dos mandatários.
Na época, o tribunal utilizou como exemplos de objetos personalíssimos itens como “medalhas personalizadas, bonés, camisetas, gravata, chinelo e perfumes”. A intervenção do ministro Wallton Alencar, relator do caso, deixou claro que as joias endereçadas ao presidente – e mais ainda aquelas avaliadas em R$ 16,5 milhões, que caberiam a Michelle – não poderiam ser enquadradas nessa categoria:
“Imagine-se, a propósito, a situação de um Chefe de Governo presentear o presidente da República do Brasil com uma grande esmeralda de valor inestimável, ou um quadro valioso”, observou Alencar. “Não é razoável pretender que, a partir do título da cerimônia, os presentes, valiosos ou não, possam incorporar-se ao patrimônio privado do Presidente da República, uma vez que ele os recebe nesta pública qualidade.”
Com base nesse entendimento, o TCU concluiu que desde 2002 toda a gestão de presentes da Presidência da República sofria de “graves irregularidades” e, por isso, obrigou Lula e Dilma Rousseff a transferirem para o acervo público mais de 700 itens (568 de Lula e 144 de Dilma).
Ao contrário dos petistas, que puderam alegar que inexistia uma regra quando trataram objetos da Presidência como se fossem de seus acervos pessoais, Bolsonaro não tem como recorrer a essa tese.
A alegação feita por Flávio Bolsonaro nesta quarta, 8, é canhestra. “Na minha opinião, a caixa de joias é personalíssima, independentemente do valor”, disse ele. “O TCU está tendo esse entendimento agora.” Não. O entendimento é de sete anos atrás. Se o presidente resolveu empacotar os presentes e levá-los para casa quando deixou o Planalto é, no mínimo, porque achou que sua opinião se sobrepunha à do órgão de Estado.
É óbvio que ainda falta explicar os outros aspectos estranhos do caso: a entrada clandestina do pacote de jóias no país, sua permanência por treze meses em um cofre no Ministério das Minas e Energia e a entrega ao presidente um mês antes de ele deixar o cargo.
Quanto às jóias milionárias endereçadas a Michele, Bolsonaro se aferra a uma daquelas frases ambíguas que os políticos usam quando se veem encrencados. “Eu não pedi nem recebi esses outros presentes”, diz ele. É fato, mas a declaração esconde que o governo tentou arrancar as jóias apreendidas da Receita Federal por oito vezes – a última delas na véspera do fim do mandato de Bolsonaro, quando um de seus assessores viajou a São Paulo “com urgência, a pedido do senhor Presidente”, para tentar cumprir a missão.
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