Manifesto por voto útil ajuda ou atrapalha Boulos?
A lógica que funcionou para Lula contra Bolsonaro não se aplica a essa eleição. Não estamos falando de uma disputa entre extremos ideológicos
A estratégia do voto útil tem sido amplamente usada em diversas campanhas eleitorais, mas sua eficácia depende muito do contexto em que é aplicada. No caso de Guilherme Boulos, a tentativa de impulsionar sua candidatura por meio de um manifesto por voto útil parece encontrar um eleitorado cansado das velhas táticas eleitorais e das figuras tradicionais da política. Mais do que isso, o eleitor de hoje não parece disposto a ser mobilizado por campanhas desse tipo.
O pedido por voto útil tem apelo cada vez menor. O eleitor brasileiro, especialmente em grandes centros como São Paulo, está mais interessado em “implodir” o sistema do que em seguir qualquer sugestão de intelectuais, artistas ou políticos tradicionais. Esse cansaço com as instituições e figuras públicas é evidente, e as campanhas por voto útil se tornam quase uma ofensa para quem está desgastado com a política tradicional.
O problema não é só o descrédito nas figuras que pedem o voto útil, mas também a desconfiança em relação às pesquisas eleitorais. A verdade é que o brasileiro médio não confia em pesquisas, e com razão. Para compreender uma pesquisa eleitoral, é preciso entender de matemática, algo que a maioria da população não domina.
Matemática
Segundo o PISA, apenas cerca de 5% dos brasileiros de 15 anos têm nível adequado de compreensão matemática, o que significa que 95% das pessoas não sabem lidar com números básicos. Quando veem uma pesquisa, muitas vezes não conseguem analisar as tendências ou entender como comparar os resultados. Assim, qualquer dado estatístico vira algo abstrato e distante, reforçando ainda mais a desconfiança.
Essa dificuldade de compreensão, aliada ao histórico de erros grotescos em pesquisas passadas — como a eleição de Luiza Erundina e Jânio Quadros, que contrariaram todas as previsões —, faz com que o pedido de voto útil se perca. A população não se conecta com as pesquisas e, consequentemente, vota com base na afetividade com relação aos candidatos, não analisando números.
O contexto atual é ainda mais complicado. O pedido de voto útil funcionou parcialmente na eleição presidencial, mas por um motivo bem claro: a rejeição ao governo de Jair Bolsonaro era alta o suficiente para impulsionar o voto contra ele. No caso da eleição municipal de São Paulo, a situação é completamente diferente. Estamos falando de candidatos que não polarizam da mesma forma que Lula e Bolsonaro, além de um cenário em que novos nomes, como Pablo Marçal e Tabata Amaral, estão crescendo.
Entretenimento
A lógica que funcionou para Lula contra Bolsonaro não se aplica a essa eleição. Não estamos falando de uma disputa entre extremos ideológicos, mas de uma batalha em que o eleitorado quer novidade. E as novidades estão fora do tradicional: Tábata Amaral cresceu ao peitar o cenário político com coragem, enquanto outros candidatos tentam construir suas bases em torno de figuras e propostas que atraem atenção. É esse entretenimento que está mobilizando o eleitor.
A campanha de Boulos pode acabar perdendo força se insistir em apelar para o voto útil. No momento, as pessoas estão mais interessadas em emoção, em se envolver com os debates políticos como quem assiste a um reality show. E quando as eleições se transformam em entretenimento, o voto útil soa chato, uma tentativa de racionalizar algo que, para muitos, já não faz sentido ser racionalizado.
As pessoas não querem ser chamadas à responsabilidade, elas querem sentir a adrenalina da disputa. Se os candidatos que estão crescendo nas pesquisas entenderam isso, Boulos e seus apoiadores talvez precisem de uma reavaliação urgente de sua estratégia. Porque, no fim, o eleitor escolhe de acordo com o que mais o emociona e depois arca com as consequências dessa escolha.
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