Tuto Quiroga: Lula tem de escolher entre legado ou conselhos de Amorim
Ex-presidente boliviano conversou com Crusoé sobre a pressão para que Lula reconheça a eleição do opositor Edmundo González na Venezuela
O ex-presidente boliviano Jorge “Tuto” Quiroga conversou com Crusoé sobre a pressão para que o presidente Lula reconheça a eleição do opositor Edmundo González e com isso possibilite uma transição democrática na Venezuela. Segundo Quiroga, o petista precisa escolher entre deixar um legado histórico ou seguir os conselhos “castristas” e “maduristas” do assessor especial da Presidência Celso Amorim. Eis a entrevista:
O que o sr. gostaria de pedir ao presidente Lula?
Eu gostaria de pedir uma coisa concreta. Lula é um democrata. Nós podemos ter diferenças na Lava Jato ou nas coisas que ele fez, mas ele é um democrata. Queremos que ele reconheça a verdade, que é uma só. Edmundo González Urrutia venceu a eleição presidencial, com as atas oficiais do sistema, com 37 pontos de diferença. Foi uma vitória de dimensçI quase nunca vista na América Latina. Então, pedimos a Lula que reconheça essa verdade, que Edmundo González ganhou. E pedimos que Lula pare de ajudar Maduro a ganhar tempo para continuar reprimindo, matando e torturando o povo que votou na Venezuela. As atas possuem código QR, assinaturas, datas e estão disponíveis para todos que queiram ver. Então pedimos ao presidente Lula que reconheça isso. Foi uma vitória esmagadora de Edmundo. Essa é a única verdade.
Maduro escutaria Lula? O petista influencia o ditador?
Ele tem uma grande influência sobre Maduro e uma influência determinante na comunidade internacional. Por quê? Vamos esquecer a Rússia, pois Maduro é um filho de Putin há muito tempo. O governo da Bolívia é amiguinho dos aiatolás da teocracia iraniana e da Nicarágua. Para min, como boliviano, é uma vergonha que os funcionários do meu país estejam com Maduro. Mas deixemos isso de lado. O mundo democrático, do qual Lula é parte, está reconhecendo o triunfo de Edmundo. O Brasil é o irmão mais velho da América Latina. Sua posição sempre é determinante. No caso de Lula, não há dúvida de que existe um trio que está sendo tolerante com o tirano: Brasil, Colômbia e México. Se o Brasil aceitar a verdade e reconhecer Edmundo, toda a comunidade democrática reconhecerá esse resultado devido à posição do Brasil e devido à liderança que Lula tem e a influência que ele tem. O que Lula falar será decisivo. Hoje, ele está conversando com o presidente Gabriel Boric no Chile. Espero que Boric convença Lula a defender a democracia na Venezuela. E espero que Lula não convença Boric a ajudar Maduro a ganhar tempo.
Como poderia ocorrer uma transição democrática na Venezuela?
Muito simples: a partir do reconhecimento da verdade. Não é possível fazer uma reconstrução democrática se não se resolve o problema em sua origem: a votação popular. O valente povo da Venezuela, contra todos os obstáculos, foi votar por Edmundo. María Corina Machado foi tornada inelegível. Seis membros de sua campanha foram presos. Eles não permitiram a entrada das equipes de avião que queriam acompanhar as eleições, como os observadores da União Europeia. O relatório do Centro Carter é devastador para Maduro. Ele descumpriu tudo o que tinha sido combinado com a oposição em Barbados, e que foi respaldado pela comunidade internacional. Maduro não pode permanecer no poder contra a vontade popular. A democracia só pode existir quando se respeita a vontade popular. Se isso não ocorrer, nada poderá ser feito mais adiante. Sim, há uma enorme tarefa de transição e de reconstrução na Venezuela. A única coisa parecida foi a que ocorreu no Chile, depois da ditadura de Augusto Pinochet. Vai ser um momento muito difícil. Mas o ponto de partida é a legitimidade de origem. Sem isso, não há nada. Olhando para os resultados da Venezuela, não é que Edmundo venceu Maduro por 37 pontos, com a divulgação das atas oficias. Maduro tem a seu favor um anúncio verbal desse mafioso Elvis Amoroso, presidente do CNE, dizendo, sem mostrar uma única ata, que Maduro tinha vencido com uma diferença de 45 pontos percentuais. É uma manipulação grotesca, mentirosa, fraudulenta. Como é que alguém vai endossar isso? A legitimidade de origem é a questão central para Edmundo González. Eu não quero fazer comparações odiosas, mas olhe só. No México, a presidente eleita Claudia Sheinbaum venceu com 60% dos votos. Falou-se: “Felicidades, presidente eleita, ótima votação”. Mas Edmundo González, na disputa contra a ditadura, tirou sete pontos a mais do que Sheinbaum no México. Veja a própria votação de Lula no primeiro turno em 2022. Teve 46%. Edmundo teve 21 pontos a mais que o petista no primeiro turno contra Jair Bolsonaro. Edmundo também teve 27 pontos que teve o colombiano Gustavo Petro no primeiro turno. Então, Edmundo tem uma legitimidade de origem que deve ser reconhecida por todos, inclusive pelos presidentes dos três países (Brasil, México e Colômbia) que estão ajudando o tirano venezuelano.
Como o sr. explica o posicionamento do Brasil até agora? O governo Lula não fez nenhuma crítica às violações de direitos humanos, tem esperança de que a ditadura vai mostrar as atas do Conselho Nacional Eleitoral e colocou dúvidas em relação à apuração que foi feita pela oposição.
É incompreensível por várias razões...
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