Encontro com a nova geração
Neste sábado, possivelmente enquanto meus caros amigos leitores estão lendo esta edição de “Os mercadores da noite”, estarei almoçando com os dois filhos mais moços de Alfredo Grumser Filho, que considero o melhor trader que o mercado financeiro do Brasil já teve...
Neste sábado, possivelmente enquanto meus caros amigos leitores estão lendo esta edição de “Os mercadores da noite”, estarei almoçando com os dois filhos mais moços de Alfredo Grumser Filho, que considero o melhor trader que o mercado financeiro do Brasil já teve.
Praticamente meio século separa minha idade das desses garotos, que por sinal não conheço pessoalmente. Até agora, só por telefone e mensagens de WhatsApp.
Eles nasceram e passaram a maior parte de suas vidas nos Estados Unidos, pois o pai e a mãe haviam se mudado para lá.
Alfredo Grumser, também conhecido como Malba Tahan, pseudônimo do professor de matemática Júlio César de Melo e Souza, autor do eterno best-seller “O homem que calculava”, que não por coincidência foi o título que dei a uma crônica da newsletter Warm Up Pro quando Alfredo faleceu em Nova York, no dia 1º de setembro de 2021, para grande consternação daqueles que tiveram o privilégio de conhecê-lo.
Hoje pretendo narrar alguns episódios da vida de Alfredo Grumser, mas principalmente os que testemunhei pessoalmente ou tiveram algum tipo de ligação comigo.
Quando ele dava aulas de matemática na PUC, operava também em Bolsa, dando ordens pelo orelhão da faculdade.
Naquela ocasião, vivíamos o grande bull market 1968/1971, e o mercado de ações era uma coqueluche nacional, com os pregões inclusive sendo transmitidos pela TV e as cotações merecendo uma página inteira dos principais jornais.
Em meio ao seu trabalho de professor na faculdade, eis que Grumser acerta uma tacada milionária na loteria esportiva, que na época fazia o sucesso que a mega sena faz hoje.
Parou de trabalhar?
Não!
Parou especular no mercado de ações?
Não!
Muito pelo contrário.
Simplesmente fez uma operação gigantesca a termo, operação essa que naufragou. De tal maneira que, quando foi na Caixa Econômica receber o prêmio da “loteca”, o dinheiro já tinha virado fumaça.
Obviamente Alfredo voltou à sua bucólica profissão de professor.
Errado!
Ele pediu demissão na PUC e decidiu procurar emprego no mercado financeiro. Não encontrou nenhuma dificuldade em obtê-lo na corretora Multiplic.
Começou como operador de pregão na Bolsa do Rio, oportunidade essa em que o conheci, já que eu era floor trader da Fator Corretora.
Me lembro que disse para ele:
“Tá vendo esse monte de gente aqui? Pois bem. Não tem nenhum otário. O mais bobo dá nó em pingo d’água.”
Logo Alfredo foi trabalhar na mesa de open da Multiplic e nossos contatos se tornaram raros. Mas não demorou a termos algo em comum: autobol.
Para quem não sabe, autobol era futebol de automóveis, que fazia muito sucesso na ocasião. E ambos jogávamos no time do Fluminense.
A Fator era ligada a um enorme conglomerado, com cadeias de lojas de roupas (Ducal), de venda de eletrodomésticos (Bemoreira), de fábricas de ternos (Sparta), supermercado (Dado), fora uma série de empresas sediadas no Rio Grande do Norte, entre elas uma das maiores indústrias têxteis do país (Seridó).
Além de meu trabalho na Bolsa, eu era contratado por essas empresas para fazer relações públicas do grupo, que tinha necessidade de vender CDBs e letras de câmbio para rolar uma enorme dívida que vinha desde os tempos de política monetária hawkish de Roberto Campos e Otávio Gouveia de Bulhões (governo Castelo Branco).
Então fretava quadrimotores turboélices Electra da Varig e levava o pessoal do mercado para Natal, de modo que todos conhecessem nosso parque industrial.
E, por que não dizer?, para que nos dessem uma colher de chá nas operações de mercado, repassando-nos dinheiro no over todos os dias.
O Alfredo sempre ia nessas viagens, o que me ajudava muito, já que tinha se tornado lendário no mercado com suas operações de opções de Vale e Petrobras.
A única coisa que nos separava um pouco é que ele era aficionado por corridas de cavalos e eu, por futebol.
Mais tarde, Alfredo Grumser se mudou para os Estados Unidos, onde tinha um apartamento em Nova York e uma casa em Greenwich, no estado de Connecticut.
Passaram-se os anos. Me tornei escritor.
Como, para o enredo de meu livro Os mercadores da noite, eu precisava narrar um leilão de potros puro-sangue inglês no Bois de Boulogne, em Paris, e uma corrida de cavalos no hipódromo de Belmont Park, em Long Island, recorri ao casal Grumser.
Os dois criaram o leilão e a corrida.
Isso aparece nos agradecimentos do livro.
Agora, para minha surpresa, os meninos do Alfredo me disseram que o pai pouco falava de suas míticas operações no mercado brasileiro.
É isso que vou narrar para eles no almoço de hoje. Não posso deixar que elas se percam na bruma do tempo.
Um ótimo fim de semana para todos.
Ivan Sant’Anna
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