O que vai ser do PCC?
Fala polêmica do líder do PCC, Marcos Willians Herbas Camacho, conhecido como Marcola, desencadeou o maior racha da história da facção
Uma declaração do líder máximo do Primeiro Comando da Capital (PCC), tornada pública com a ajuda de um promotor de Justiça, resultou no que especialistas estão chamando de maior racha da história da facção. Durante uma consulta médica em julho de 2022, Marcos Willians Herbas Camacho, conhecido como Marcola, afirmou que Roberto Soriano, conhecido como Tiriça, apontado pela polícia como um dos integrantes mais violentos da cúpula do PCC, seria um psicopata, informou reportagem do O Globo.
A conversa entre Marcola e um funcionário da Penitenciária Federal de Porto Velho foi gravada, já que todas as conversas no sistema penitenciário federal são registradas. A existência do áudio foi levada ao Ministério Público Federal pelo promotor Lincoln Gakiya, do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do MPSP, que combate a facção há 20 anos e é considerado um dos principais inimigos do PCC. Mais tarde, essa prova foi utilizada pelo MPF contra Soriano no processo em que ele era acusado da morte de uma psicóloga da Penitenciária Federal de Catanduvas (PR), em 2017. Ele acabou sendo condenado.
De acordo com Gakiya, Marcola sabia exatamente o que estava dizendo, mas não esperava que Soriano soubesse disso, pensava que ficaria restrito ao ambiente prisional. O promotor relatou ter avisado ao MPF sobre a existência da gravação em Porto Velho. Embora não afirme que Soriano tenha sido condenado por causa disso, Gakiya considera a gravação uma prova importante.
Decisão de expulsar Marcola do PCC
Segundo o jornal carioca, após ser convencido por colegas de que foi delatado por Marcola, Soriano se juntou a outros dois membros da cúpula – Abel Pacheco de Andrade, conhecido como Vida Loka, e Wanderson Nilton de Paula Lima, conhecido como Andinho – e decidiram expulsar Marcola. Segundo Gakiya, Marcola revidou e enviou, por meio de seu advogado, a notícia da briga para fora da cadeia, condenando os rebeldes à morte. Os chefes em liberdade, conhecidos como sintonia de rua, apoiaram Marcola. Por enquanto, o conflito está em espera.
Segundo o pesquisador Bruno Paes Manso, que falou ao O Globo, autor do livro “A guerra: a ascensão do PCC e o mundo do crime no Brasil“, o poder público está usando esse racha inédito como uma estratégia para enfraquecer o PCC.
Essa é uma das estratégias de isolamento das lideranças. O promotor Lincoln Gakyia tem explicado isso em entrevistas, dizendo que está reproduzindo as estratégias da Operação Mãos Limpas na Itália, na luta contra a máfia. Lá, o rompimento levou ao enfraquecimento desses grupos e permitiu que o Estado agisse contra eles. No entanto, há sempre o risco de resultar em violência no cotidiano das pessoas.
Marcola no PCC
Marcos Willians Herbas Camacho, o “chefão” do PCC, chegou ao poder se rebelando contra a antiga liderança em 2002.
Marcola assumiu o comando da facção quando os fundadores José Márcio Felício, conhecido como Geleião, e César Augusto Roriz da Silva, conhecido como Cesinha, passaram a agir com mais autoridade e a usar a facção em benefício próprio, com métodos violentos. Marcola se rebelou contra seus antigos aliados e, segundo ele mesmo, ambos foram “expulsos do sistema penitenciário”. A morte de sua ex-esposa, supostamente ordenada pela esposa de um dos fundadores, teria contribuído para essa insurgência. Após expulsar a dupla, Marcola assumiu o comando, reformulou a estrutura hierárquica da facção e criou a chamada “sintonia final”, composta por doze membros. Foi nesse momento que ocorreu o primeiro racha no PCC.
A partir desse momento, o PCC concentrou seus esforços no tráfico de drogas. O pesquisador Gabriel Feltran compara a estrutura da facção à maçonaria e destaca que o comando não está nas pessoas, mas nos cargos que ocupam.
Marcola já estava no comando do PCC quando ocorreram os episódios mais violentos da facção. Em março de 2003, a facção assassinou o juiz-corregedor Antônio José Machado Dias. Em maio de 2006, após a transferência de presos da facção para um presídio mais rigoroso, São Paulo foi alvo de uma megarrebelião que resultou em ataques a órgãos públicos, incêndios em ônibus e mortes de policiais e agentes de segurança. Esse episódio ficou conhecido como Crimes de Maio.
Gegê do Mangue e a disputa interna
Em 2018, Gegê do Mangue e seu comparsa Paca foram assassinados em uma possível emboscada. Gegê havia sido solto após 22 anos de prisão e assumiu o comando do envio de drogas ao Brasil, internacionalizando os negócios do PCC. Segundo investigações, Gegê e Paca foram mortos por contrariarem os interesses de membros da facção. O traficante Gilberto Aparecido dos Santos, conhecido como Fuminho, foi apontado como mandante dos assassinatos.
Após as mortes, diversos membros envolvidos foram mortos ou desapareceram. Marcola perdoou Fuminho e os sobreviventes dessa trama por meio de um comunicado chamado “salve”. O MPSP afirma que o perdão ocorreu porque Marcola tinha negócios com Fuminho no Porto de Santos. Essa situação ainda não foi resolvida e contribuiu para o atual racha na facção.
Impacto do racha até o momento
Até agora, o racha interno do PCC não teve grandes repercussões nas prisões paulistas nem nas ruas. Investigadores e especialistas afirmam que os presos têm medo e preferem ficar quietos. Apesar de o conflito atual ser mais significativo do que os anteriores, não houve um impacto externo imediato. No entanto, a declaração de independência de alguns membros em relação ao PCC pode gerar conflitos.
De acordo com Bruno Paes Manso, não é possível prever se todos os membros vão embarcar nesse conflito, pois há muito a perder caso a estrutura do PCC pare de funcionar. No entanto, existe o risco de uma guerra maior se os dois lados aderirem à ideia da guerra.
O promotor Gakiya descarta a possibilidade de uma aliança entre o PCC e o Comando Vermelho em decorrência desse racha, assim como a criação de uma nova organização dissidente. Ele considera que o conflito ainda resultará em derramamento de sangue, tanto no sistema prisional quanto nas ruas.
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