Nicarágua fecha 1.500 ONGs e transfere bens para o Estado
Governo de Daniel Ortega obriga organizações a formar "alianças" com instituições públicas para continuar operando
O governo da Nicarágua, do ditador Daniel Ortega, cancelou 1.500 organizações não governamentais em uma ação que transfere seus bens para o Estado.
O anúncio, feito pela vice-presidente Rosario Murillo e publicado no Diário Oficial, alegou descumprimento de obrigações financeiras pelas ONGs, incluindo a falha na apresentação de balanços detalhados.
A maioria das ONGs afetadas é ligada a grupos religiosos, como a Caritas Diocesana de Granada, e agora será obrigada a formar “alianças” com instituições públicas para continuar operando.
Desde 2018, quando começaram os protestos contra o governo de Ortega, mais de 5.200 ONGs foram dissolvidas no país. A medida é vista como parte de uma estratégia mais ampla da ditadura Ortega para restringir o espaço cívico e aumentar o controle estatal sobre as atividades não governamentais, gerando preocupação internacional e críticas de líderes religiosos, incluindo o Papa Francisco.
Em um depoimento durante o International Religious Freedom Summit em Washington D.C., um sacerdote nicaraguense, sob anonimato e com a voz alterada, detalhou as torturas sofridas sob o regime do ditador Daniel Ortega.
O clérigo relatou ter sido preso, insultado, espancado e encarcerado pelas forças de Ortega. “Não estou aqui [em Washington] a passeio. Minha família sofre constante vigilância em casa”, expressou, evidenciando o perigo que enfrenta. “Se nós, cristãos, permanecermos em silêncio, quem falará pela liberdade?”, disse.
Diversos clérigos foram alvo da repressão da ditadura nicaraguense. Somente em 2023, ao menos 46 membros do clero católico, incluindo bispos e seminaristas, foram detidos ou expulsos à força do país. Instituições da Igreja, como escolas e meios de comunicação, também enfrentaram fechamentos e assédio.
Igreja nicaraguense devastada pela perseguição
A Igreja Católica na Nicarágua foi devastada pela perseguição, com 40% dos sacerdotes da Diocese de Matagalpa tendo falecido ou sido forçados a fugir do país desde 2018. Isso deixou muitas paróquias sem pastores e tirou a capacidade da Igreja de servir seus fiéis plenamente.
O sacerdote exilado Carlos Adolfo Zeledón Montenegro descreveu a situação como “devastadora”. Ele afirmou que a perda de padres na Nicarágua “enfraqueceu a vida pastoral” e dificultou a prestação de serviços básicos aos paroquianos.
Ao menos 97 sacerdotes foram forçados a deixar a Nicarágua desde 2018, além de pelo menos 13 sacerdotes que faleceram desde aquele ano. Isso significa uma perda total de 110 sacerdotes em cerca de cinco anos, o que equivale a 20% do total do clero registrado até 2020.
A escalada de perseguição de Ortega contra a Igreja Católica
Desde sua reeleição em 2007, o ditador nicaraguense Daniel Ortega intensificou as ações contra a Igreja Católica, acirrando um conflito que tem raízes históricas, mas que ganhou novos contornos sob seu governo.
A perseguição sistemática inclui a expulsão do núncio apostólico, ameaças de rompimento diplomático com o Vaticano e o fechamento de instituições educacionais e de caridade ligadas à Igreja. Ortega, em um discurso em setembro de 2022, criticou abertamente a estrutura hierárquica da Igreja Católica e acusou clérigos nicaraguenses de participação em atividades golpistas e homicidas, alegando que estes apoiavam tentativas de subverter o estado.
A tensão entre o regime de Ortega e a Igreja escalou em agosto de 2022, quando forças policiais sitiaram a residência episcopal, isolando bispos, padres e seminaristas. Nesse mesmo período, quatro padres da diocese de Estelí foram detidos, marcando um claro ataque à liberdade religiosa e à autonomia da Igreja no país.
Esses eventos são parte de uma série de mais de 200 agressões contra a Igreja Católica registradas nos primeiros oito meses de 2022, refletindo um padrão de repressão que se estende para além da esfera religiosa, atingindo opositores políticos, jornalistas e meios de comunicação independentes.
O governo Ortega, acusado de violações generalizadas dos direitos humanos, mantém um controle rígido sobre as forças policiais e militares, utilizando o aparato do estado como instrumento de repressão contra qualquer forma de dissidência ou crítica ao regime.
A perseguição à Igreja Católica, portanto, se insere em um contexto mais amplo de autoritarismo, onde o cerceamento das liberdades civis e a violação dos direitos básicos são práticas recorrentes. Esta estratégia de Ortega visa não apenas silenciar a Igreja como voz crítica, mas também enfraquecer uma instituição que historicamente tem desempenhado um papel significativo na sociedade nicaraguense, especialmente em momentos de crise política e social.
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