Jerônimo Teixeira na Crusoé: Querem “decolonizar”
Stratford-upon-Avon, cidade natal do bardo, está reconfigurando seus museus e acervos para fiquem menos "imperialistas"

Li a notícia no The Telegraph: a organização responsável por manter e promover a memória de William Shakespeare em Stratford-upon-Avon, cidadezinha natal do bardo, oferecerá neste ano um workshop de dança ao estilo Bollywood.
As coreografias serão inspiradas em Romeu e Julieta.
Por si só, a ideia é até divertida. Eu só teria escolhido uma peça menos óbvia.
Será que a fantasia lírica de Sonho de uma Noite de Verão casaria bem com a exuberância de Bollywood?
O projeto maior do qual o workshop faz parte, porém, é o contrário absoluto da diversão.
A chatice militante tomou Stratford. Seu objetivo é “decolonizar” Shakespeare.
Anacronismos desvairados
Novo evangelho laico criado pelos teólogos do puritanismo progressista, a decolonização proclama que opressão da humanidade nasce da entidade malévola conhecida como Ocidente.
Fiel à palavra sagrada, o Shakespeare’s Birthplace Trust, instituição que administra as principais atrações culturais de Stratford, quer se distanciar do eurocentrismo e do “ocidente-centrismo” que teriam marcado a veneração a Shakespeare.
Tenho dúvidas de que os ingleses ao tempo de Shakespeare pensassem em si mesmos como ocidentais ou mesmo europeus.
Mas que importa a perspectiva histórica? Basta saber que hoje os ingleses são europeus e ocidentais – portanto, colonialistas.
A reportagem do The Telegraph lembra que, no ano passado, um projeto de pesquisa patrocinado por um órgão do governo britânico chegou a conclusões ainda mais desvairadas: a obra de Shakespeare estaria propagando “narrativas brancas, capacitistas, heterossexuais, masculinas cis-gênero”.
Em colaboração com uma professora da Universidade de Birmingham, a equipe do Shakespeare’s Birthplace Trust agora trabalha para purgar Stratford do “supremacismo branco” que seria a tônica das tragédias de Hamlet e Lear.
O bardo e o imperialismo
O turismo em Stratford depende de Shakespeare.
No entanto, a principal mantenedora das atrações do lugar – reconstruções tardias das casas onde Shakespeare e seus familiares viveram – deseja reduzir o bardo a um propagandista do imperialismo britânico.
Shakespeare, é verdade, acabou se incorporado ao ethos britânico.
Consagrado postumamente, seu gênio literário superlativo integrou-se a certa ideia vitoriana de civilização, ao lado do domínio sobre os mares, das colônias africanas e asiáticas, da caça à raposa e do chá.
No entanto, não encontramos monarcas obcecados por conquistas territoriais em seu teatro.
Sim, há batalhas campais em peças como Henrique V e Macbeth, mas o centro do drama está nas relações palacianas.
Naquela que talvez seja a mais…
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