“Dirão que as pessoas estão sendo curadas porque tomaram esses medicamentos, o que não será verdade”
Em entrevista ao El País, o infectologista Alexandre Cunha, do Sírio-Libanês, criticou o uso da cloroquina no combate à Covid-19 "antes de estudos mais sérios". Vale a pena ler o que ele diz...
Em entrevista ao El País, o infectologista Alexandre Cunha, do Sírio-Libanês, criticou o uso da cloroquina no combate à Covid-19 “antes de estudos mais sérios”.
Vale a pena ler o que ele disse:
“Eu e outros profissionais acreditamos que esse uso não deveria ser feito. Quando um medicamento não está aprovado em estudos bem desenhados, quando se trata de um medicamento experimental, como é a hidroxocloroquina, a gente pode fazer o chamado uso compassivo, que é quando o paciente tem uma doença muito grave e com altíssima mortalidade, o que nos permite lançar mão de terapias que não sabemos se funcionam. A questão é que esse não é o caso da Covid-19. Olhando os números, vemos que 99% dos casos têm boa evolução sem uso de nenhuma medicação específica. E você submeter 99 pessoas ao uso de uma medicação —que pode trazer efeitos colaterais— para, quem sabe, ajudar uma pessoa, é um benefício absolutamente teórico para uma minoria absoluta, com um risco palpável para uma maioria absoluta. Essa é minha primeira crítica ao uso da hidroxocloroquina antes de estudos mais sérios. Os estudos existentes têm um péssimo desenho metodológico. Espero que eu esteja errado, mas, muito provavelmente, os estudos que virão mostrarão que essa substância não tem nenhuma eficácia.”
E mais:
“O que acontece no final, com a prescrição massiva de hidroxocloroquina, ou azitromicina, que já está sendo associada à hidroxocloroquina, ou imunoglobulina, ou medicações para HIV, é que elas acabam por aumentar a toxicidade do vírus e agravar o quadro de pacientes que talvez tivessem melhor prognóstico sem elas. Porque esses pacientes recebem muito volume de medicação, o que pode encharcar os pulmões… É que nós médicos temos o costume de fazer coisas para ajudar o paciente, seja dar um remédio, fazer uma cirurgia, resolver as coisas. E a sensação de impotência diante de uma doença que pode ser grave e a gente não pode fazer nada nos leva a fazer alguma coisa, mesmo que essa coisa não seja benéfica. Só que, às vezes, a melhor coisa a fazer é não fazer nada. Várias vezes isso acontece na Medicina. O Covid-19 tem causado uma sensação muito ruim nos médicos de estarmos só observando o curso da doença. Mas é o melhor que podemos fazer, por enquanto.”
Alertando para os riscos da cloroquina, o médico comentou também sobre a “cura espontânea” de pacientes com Covid-19:
“É como a dengue, que não tem um remédio específico. As pessoas pegam dengue, a maioria sofre um bocado no curso da doença, mas ela passa. Uma minoria absoluta vai a óbito. O paciente curado é aquele que passou pela Covid-19 e se restabeleceu. Esses casos de cura, por exemplo, aconteceram sem o uso de cloroquina ou hidroxocloroquina. Acontece que agora dirão que as pessoas estão sendo curadas porque tomaram esses medicamentos, o que não será verdade. Os pacientes vão se curar exatamente como os outros. Essa é a preocupação que devemos ter para fazer estudos clínicos mais bem desenhados, em que metade dos pacientes tome a droga e a outra metade, não. Assim, poderemos analisar, no final, os benefícios dessa substância.”
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