Appio enfim admite ligação intimidatória a filho de desembargador
Em entrevista à 'TV Lula', juiz afastado da Lava Jato por "possível ameaça” ao desembargador Marcelo Malucelli negou tentativa de intimidação ou ameaça. Sergio Moro ironiza confissão tardia
Ex-titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pelo que sobrou da Operação Lava Jato, o juiz Eduardo Appio (foto) enfim admitiu publicamente ter feito uma ligação ao advogado João Eduardo Barreto Malucelli, filho do desembargador Marcelo Malucelli, que revisava no Tribunal Federal da Quarta Região (TRF-4, em Porto Alegre) suas decisões.
O “trote”, eufemismo usado pela defesa de Appio para mascarar a tentativa telefônica de intimidação, gravada por João Eduardo, levou a seu afastamento daquela Vara.
O juiz falou do caso em “entrevista” à TV Lula, como chamamos a TV Brasil sempre que é usada a favor do governo e como megafone das narrativas lulistas, neste caso omitindo ainda que Appio assinava como LUL22 no sistema eletrônico de Justiça, que doou 13 reais à campanha de Lula e que vendeu um imóvel subfaturado para o então deputado do PT André Vargas, condenado por lavagem de dinheiro por Sérgio Moro em razão da aquisição.
A confissão sobre o telefonema só foi feita agora, depois de Appio ter sido apenas realocado para outra Vara, uma consequência bem mais amena do que sofreram juízes que atuaram na Lava Jato, que chegaram a ser afastados da magistratura.
“Hostis”
Em “entrevista” com um militante da Vaza Jato recompensado no governo Lula com uma boquinha no conglomerado de mídia estatal, Appio relatou que “os servidores da Vara sempre foram hostis” a quaisquer de suas iniciativas, disse que se deparou com “algo parecido com Auschwitz” ao assumir o cargo — ponderando “todo respeito às vítimas do Holocausto”, como se isso fosse possível numa comparação descabida como essa —, e reclamou do que chamou de “espionagem política”.
Appio também falou em “golpe de Estado contra a presidente Dilma” e acusou os procuradores da Lava Jato de lavagem de dinheiro — jamais evidenciada — com base no processo conduzido por Luiz Felipe Salomão, aliado do ministro do STF Alexandre de Moraes no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e classificado como “perverso” pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso.
A ligação
O juiz justificou sua ligação pelo tal clima hostil que encontrou na 13ª Vara Federal de Curitiba e pelo fato de o desembargador Malucelli ter revogado sua decisão de liberar o advogado Rodrigo Tacla Duran de uma ordem de prisão, despachada com a intenção de que ele pudesse voltar ao Brasil para detalhar um alegado esquema de extorsão, jamais evidenciado.
“Meu papel como juiz é combater a corrupção. Aquela vara não foi criada com o sentido de ser anticorrupção? Então eu iria fechar os olhos para a corrupção? Quando veio a informação, através de jum jornalista amigo meu, de que o filho do Marcelo Malucelli seria ou filho ou sobrinho [do desembargador], eu disse: me dá o número do telefone, que eu mesmo vou checar essa informação”, relatou.
“Tive que fazer isso pessoalmente porque não tinha absolutamente ninguém em quem confiar”, justificou-se Appio, negando “sentido de intimidar, ameaçar” João Malucelli, que era sócio do hoje senador Sergio Moro (União-PR) em escritório de advocacia. “Basta ouvir a conversa”, complementou.
O Antagonista ouviu a conversa telefônica em que Appio se passou por um servidor de nome fictício da área da saúde do TRF-4 e reitera que foi uma tentativa de intimidação, com menção “aos extratos aqui do Imposto de Renda referente aos filhos” de Marcelo Malucelli, além da emblemática pergunta a João: “E o senhor tem certeza que não tem aprontado nada?” A gravação se tornou pública após o juiz ter sido denunciado pela conduta que ela escancara.
“Checagem de informação”
Na narrativa de Appio, o telefonema se tratou de uma “checagem de informação” feita fora de seu horário de expediente. “Sergio Moro conseguiu me tirar de campo, deu uma canelada, mas contou obviamente com a conivência e apoio irrestrito do Tribunal Regional da 4ª Região”, reclamou.
Questionado se tem arrependimento pela ligação, Appio alegou que “o meio utilizado não foi adequado”, mas novamente tentou se justificar, dizendo que foi “a única alternativa” que lhe restava. “Nós vamos discutir o sofá ou o adultério?”, questionou ainda, com analogias absolutamente descabidas.
Ao longo de toda a “entrevista”, na qual se disse orgulhoso do que fez ao longo dos quatro meses em que tentou desmontar por dentro a Lava Jato, o juiz se comportou como se o que tudo o que dizia advogasse a seu favor, e não contra. No mundo invertido da TV Lula, o “LUL22” se sentiu em casa.
Sergio Moro ironiza confissão tardia de Appio
O atual senador Sergio Moro (União-PR), que antecedeu Appio na Vara de Curitiba, ironizou nas redes sociais a confissão tardia, lembrando manchetes antigas da fase de negação dos fatos.
“Então o juiz Appio, vulgo LUL22, finalmente admitiu que ligou, fingindo ser outra pessoa, para o filho de um desembargador federal que revisava suas decisões. Trote, ameaça, delírio? Antes havia mentido publicamente sobre o fato e sugerido ser armação. Difícil entender como um aloprado completo pode merecer qualquer credibilidade, conceder entrevista em TV pública para mentir sobre adversários políticos do governo Lula e, pior, ainda continuar sendo juiz. Pobre jurisdicionado”, escreveu Moro.
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