Agamenon: Golpe tabajara
Esse golpe Tabajara do último domingo me fez lembrar dos velhos golpes do passado, quando eu ainda era um jovem idealista que acreditava num mundo melhor em que todos seriam iguais. Iguais a mim, é claro, porque eu detesto todos os outros seres humanos, sem distinção de raça, credo ou ideologia...
Esse golpe Tabajara do último domingo me fez lembrar dos velhos golpes do passado, quando eu ainda era um jovem idealista que acreditava num mundo melhor em que todos seriam iguais. Iguais a mim, é claro, porque eu detesto todos os outros seres humanos, sem distinção de raça, credo ou ideologia.
Em 1964, apesar de jovem, eu já era um velho reacionário, conservador e retrógrado. Por isso mesmo, desde que os militares assumiram o poder, resolvi combater a ditadura com unhas e dentes, que, mais tarde, foram devidamente arrancados nos porões do DOI-CODI.
Relembro com saudade dos meus tempos de masmorra. Eu alugava “um aparelho”, uma kitchenette em Copacabana, que servia para reuniões políticas clandestinas e comer umas mulheres. Não necessariamente nesta ordem. Depois do AI-5, a repressão aumentou muito, principalmente lá em casa e, um belo dia, “a casa caiu”. Isaura, a minha patroa, invadiu o “aparelho” no exato momento em que mostrava para uma aluna de comunicação da PUC o que era uma ditadura.
Junto com a ciumenta criatura veio um bando de meganhas, a Isaura, a minha patroa, era simpatizante dos militares, inclusive prestando serviços nos quartéis, além de praticar a deduragem digital nas horas vagas. Apanhei feito um condenado (inclusive da Isaura), sem nenhum inquérito, nem julgamento justo. Coberto de hematomas e escoriações generalizadas, fui trancado na cadeia, onde convivi com grandes presos de esquerda, como Ziraldo (que mesmo na “tranca”nunca brochou), Jaguar, Zuenir Ventura, Paulo Francis, Graciliano Ramos, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Glauber Rocha, Gabeira e o Silvio Santos, que não era comunista, mas estava lá só para animar a galera.
Trancafiado como um macaco de zoológico, logo tratei de contratar o Kakay como advogado e o ministro Gilmar Mendes para providenciar o Habeas Corpus. Por isso, achava que rapidamente ficaria livre da cadeia. Assim, para passar o tempo, dediquei-me à leitura de obras da literatura que a gente só lê quando está preso, como Ulysses, de James Joyce; Em Busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust; Guerra e Paz, de Tolstói (eu gostei mais da Guerra); a coleção completa de Os Pensadores e o meu favorito, O Jumento Tarado, de Bocage. Só interrompia a leitura para as minhas sessões diárias de tortura no pau de Arara. Arara era um sargento do Exército, conhecido pelo comprimento e grossura da sua crueldade. Devo confessar que, no Exército, a comida era ruim, mas a tortura era da melhor qualidade.
Viver trancado no xilindró era muito duro, ficávamos o dia inteiro de cuecas, sem fazer nada, ouvindo Pink Floyd e fumando maconha que o Gabeira mandava vir do Ceará. Um calor dos diabos e intermináveis discussões de teoria marxista para decidir quem seria a “moça” na nossa masmorra. A hora do banho era um pesadelo, e todo mundo tomava cuidado para não pegar o sabonete se caísse no chão.
Mas, como tudo na vida tem o seu lado ruim, não tínhamos, pelo menos, que pagar nenhum boleto e passávamos o dia discutindo o futuro do socialismo, do Muro de Berlim e do Botafogo.
Eu não entendia nada daqueles papos cabeça, era um alienado, o que continuo sendo coerentemente até hoje. Um dia quase saí na porrada com Glauber por defender a dublagem dos filmes de Goddard. Por estar trancafiado pela repressão, não pude ir na mitológica passeata dos 100 mil, mas, mesmo que estivesse solto, não poderia participar daquele ato político, porque só tinha 50 mil na carteira. Um dia, os militares resolveram me soltar e, infelizmente, fui obrigado a trabalhar. Até hoje não perdoo os milicos por isso.
Nessa época, Jair Bolsonazi era um militar de baixa patente que, fora da época de São João, construía bombas para promover o caos, a desordem e a balbúrdia, coisa em que se especializou fazendo vários cursos por correspondência. Naqueles dias, não tinha aula pela internet, e o Jair ainda era virgem, pois ainda não havia conhecido o Aristides.
O tempo passou, e o Destino nos reservou um enorme fracasso. No meu caso, escrevendo no Antagonista, no caso do Bozonato, exilado em Orlando, onde o ex-presidente e futuro presidiário quer que o Brasil se transforme na Terra da Fantasia. Mas, sem o Mickey, o Pato Donald e o Dumbo, apenas com o Pateta, o Pinóquio, os Irmãos Metralha (01, 02,03 e 04), o João-Bafo-de-Onça e o Capitão Gancho, com quem tem mais afinidades ideológicas.
Não satisfeito com o fracasso, Bolsonero quer mais, continua obcecado com a ideia de dar um golpe, qualquer um serve. Desta vez, pretende atacar a Disney e destruir a Montanha Russa, que, com esse nome soviético, só pode ser comunista. O comunismo já acabou até na Rússia, mas resiste na mente do ex-presidente. Aliás, o Messias tem uma verdadeira fixação anal retentiva pelos Estados Unidos da América, e seu objetivo ao patrocinar os golpistas tupiniquins foi imitar o Trump e a invasão do Capitólio. Imitar coisas que não deram certo nos outros países é uma coisa que os brasileiros sabem fazer muito bem e, nesse ponto, o Bolsonaba acertou: a tentativa de golpe em Brasília não chegou a lugar nenhum e, por isso mesmo, os terroristas revolucionários foram quebrar tudo na cadeia.
Agamenon Mendes Pedreira é adestrador da cachorra Resistência e auxiliar na equipe de faxina da Janja.
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