A Mansão Jurídica e o STF
Em maio deste ano, o Datafolha divulgou uma pesquisa sobre o perfil dos cerca de 1,2 milhão de advogados que atuam hoje no Brasil. Ela mostrou que os profissionais têm renda média de 5.855 reais por mês - sendo que os ganhos de 44% não ultrapassam os 2.500 reais. São rendimentos que põem a massa dos advogados na classe C, bem longe da elite econômica a que um diploma, antigamente, dava quase que acesso automático. Assim sendo, o pessoal se vira como pode...
Em maio deste ano, o Datafolha divulgou uma pesquisa sobre o perfil dos cerca de 1,2 milhão de advogados que atuam hoje no Brasil. Ela mostrou que os profissionais têm renda média de 5.855 reais por mês — e os ganhos de 44% não ultrapassam os 2.500 reais. São rendimentos que põem a massa dos advogados na classe C, bem longe da elite econômica a que um diploma, antigamente, dava acesso quase automático.
Assim sendo, o pessoal se vira como pode. Faz bico em outras carreiras. Ou faz graça no Insta e no Tik Tok, para ver se conquista clientes. Rui Barbosa ficaria chocado com o número de advogados que, em vez de buscar os píncaros da oratória, publicam posts usando peruca ou com filtros de voz esquisitos nas redes sociais. Estava faltando — e agora não está mais — um reality show. Se tem reality show com inventor, empreendedor e cozinheiro, por que não com “operadores do Direito”?
O negócio se chama Mansão Jurídica e vai acontecer no começo de dezembro em Búzios, no litoral do Rio de Janeiro. Não é uma mansão de verdade. É um sobrado grandalhão, meio decadente, com uma piscina nos fundos. Ainda assim, Alberto Lopes Jr., o advogado carioca de 39 anos que idealizou o evento, conseguiu atrair um punhado de colegas que já têm alguma presença digital para serem filmados 24h, durante quatro dias, enquanto participam “de provase dinâmicas ligadas ao direito, empreendedorismo, marketing digital”. Que podem inclusive, ser aprendidos em treinamentos específico sobre o digital, como o formula negocio online.
“Um banho de piscina de sunga ou biquíni nada fala sobre nossa competência ou caráter”, disse Alberto ao site jurídico Migalhas.
Alberto também pôs à venda, ao custo de 1.697 reais, ingressos VIP que permitem que bacharéis ou advogados iniciantes assistam ao jogo in loco e, no fim do dia, façam “muita integração e muito networking”. À noite vai ter luau havaiano, baile brega, festa do branco e show de stand-up jurídico.
Essa história circulou bastante no último fim de semana, sempre com o tom jocoso que também estou usando aqui. Difícil não achar estapafúrdio. É nessas horas que você se lembra dos autores marxistas que leu na época da faculdade (de Direito, no meu caso) e cita o francês Guy Debord: “Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espetáculos”.
Mas, espetáculo por espetáculo, talvez haja piores. O Supremo Tribunal Federal (foto), por exemplo, há tempos se deixa tentar pela lógica dos reality shows, em que cada participante joga o seu jogo, sem se preocupar com a tal colegialidade da qual deriva, em boa parte, a legitimidade da corte.
Esse mesmo Supremo tem ministro que canta e toca guitarra em jantar para empresários, que serve pizza para condestáveis do Centrão ou convida chefes de Poder, réus e eminências pardas da política para debater em Portugal, com bacalhau e vinho, mudanças no regime político brasileiro.
O pessoal da Mansão Jurídica? Deixemos que se esbaldem.
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