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O Brasil não merece a Amazônia 

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Carlos Graieb
5 minutos de leitura 27.08.2024 16:02 comentários
Análise

O Brasil não merece a Amazônia 

Política falha tanto na prevenção de incêndios e desmatamento quanto no impulsionamento de uma nova economia verde

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Carlos Graieb
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O Brasil não merece a Amazônia 
Jader Souza/AL Roraima

O Brasil está pegando fogo. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), do início do ano até domingo (25), quase 105 mil focos de incêndio haviam sido registrados no país, maior número desde 2010. 

Em alguns lugares, como no interior de São Paulo, faz sentido pensar em crimes coordenados. O estado se aproxima dos 3.500 focos de incêndio somente no mês de agosto, dez vezes mais que no mesmo período do ano passado. 

Há muito fogo em lugares que há duas décadas ou mais aboliram as queimadas como método de limpar terreno para a lavoura (de cana, por exemplo). O agronegócio, que evoluiu para utilizar técnicas mais modernas de manejo do solo, lamenta os incêndios. Pode amargar prejuízos da ordem de 1 bilhão de reais, segundo as primeiras estimativas. 

O governador Tarcísio de Freitas se precipitou em descartar que a onda de incêndios tenha sido, ao menos em parte, planejada. Assim como os produtores rurais, a Polícia Civil do estado se mostra mais cautelosa. Apenas começou a investigar os incidentes e não exclui nenhuma hipótese.

Amazônia em chamas

Em outros lugares, como na Amazônia, também houve uma intensificação dos incêndios. Foram cerca de 43 mil registros desde janeiro, maior número em 17 anos. Não se observa, no entanto, um aumento exponencial. 

O governo determinou que a Polícia Federal vá a campo para investigar. Provavelmente, encontrará o de sempre: queimadas abrindo caminho para a pecuária. 

As situações no Sudeste e no Norte são diferentes.

A primeira região é explorada há séculos. A segunda, ainda representa uma nova fronteira.

Por isso, deter a devastação da Amazônia requer uma combinação de dois tipos de medidas que a política brasileira não tem sido capaz de prover: repressão aos avanços ilegais sobre a natureza e inovação econômica, que dê valor à floresta mantida de pé.

Vigilância ineficaz

O governo Bolsonaro fazia pouco da devastação. Em novembro de 2021, o ex-presidente comparou as queimadas na Amazônia a uma “fogueira de São João” – aos risos, como se contasse uma piada engraçadíssima. 

Lula não menospreza o problema, mas também não consegue enfrentá-lo

Os números desastrosos deste ano talvez não fossem tão ruins se os recursos para fiscalização ambiental, prevenção e combate a incêndios não tivessem sido reduzidos de 144 milhões de reais em 2023 para 107 milhões de reais em 2024. 

Foi o Congresso quem pressionou pelo corte na votação do orçamento, mas o Planalto não bateu o pé para manter a dotação. Só recentemente, depois de uma temporada seca desastrosa no Pantanal, o governo resolveu aumentar o dinheiro direcionado à prevenção e ao combate de incêndios – aparentemente, tarde demais. 

O número de 1.489 brigadistas também era inadequado para a imensidão da floresta, sobretudo quando se observa o padrão histórico de queimadas. Só nesta terça, 27, o governo resolveu ampliar o contingente.

Quebrar o ciclo

Mas é a falta de investimento na criação de uma nova economia na Amazônia que mais desanima. 

Há muitas projeções de ambientalistas circulando por aí, dizendo que a preservação da natureza pode render bilhões e bilhões de dólares ao Brasil. Devem ser encaradas com cautela. É um fato, porém, que pesquisa e inovação costumam trazer ganhos maiores do que apenas tirar do solo aquilo que já está lá. A própria agricultura brasileira é prova disso.   

Em maio, o jornal The New York Times visitou dois empreendimentos voltados ao reflorestamento e à venda de créditos de carbono na Amazônia. Ouviu de um pecuarista, entrevistado para a reportagem, que “se a venda de carbono se mostrar melhor que a criação de gado, podemos mudar de negócio”

A economista de uma das empresas expressou a mesma ideia em outros termos. Segundo ela, para quebrar o ciclo de desmatamento, é indispensável “mudar a maneira como as pessoas ganham a vida”. 

Predatório e primitivo

Isso requer imaginação, que não se pode esperar de políticos como Jair Bolsonaro. Como já demonstrou inúmeras vezes, ele tem uma mentalidade extrativista, ávida em arrancar do solo tudo que está à mão. 

O discurso, mais uma vez, é um pouco melhor no governo Lula. Mas não existe a urgência necessária na execução. 

Segundo o The New York Times, o BNDES investiu nos dois negócios de recuperação da floresta amazônica mencionados acima. Além disso, em julho, o governo anunciou a destinação de 500 milhões de reais para o desenvolvimento científico e tecnológico na Amazônia

É alguma coisa, mas quase nada diante dos 4,9 bilhões de reais destinados ao fundo eleitoral deste ano, ou aos 23 bilhões de reais em multas que, segundo uma estimativa, os partidos políticos deixarão de devolver aos cofres públicos, graças à recém-aprovada PEC da Anistia. 

Esse é um Brasil burro, predatório e primitivo, que não merece suas riquezas naturais.   

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Carlos Graieb

Carlos Graieb é jornalista formado em Direito, editor sênior do portal O Antagonista e da revista Crusoé. Atuou em veículos como Estadão e Veja. Foi secretário de comunicação do Estado de São Paulo (2017-2018). Cursa a pós-graduação em Filosofia do Direito, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

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