Existe um duelo entre Toffoli e Mendonça?
Existe uma divergência entre os ministros sobre os acordos de leniência da Lava Jato, mas na prática ela não importa muito
Será que existe um duelo entre os ministros Dias Toffoli (foto) e André Mendonça a respeito da revisão dos acordos de leniência firmados por empresas corruptas, no rastro da Lava Jato?
Representaria isso um racha na Segunda Turma do STF, que ambos integram? (Apelidei essa turma de Demolições STF Ltda., pelo seu empenho em anular de maneira sistemática todos os efeitos jurídicos daquela operação e de suas derivadas.)
Há quem sustente que sim, desde que Mendonça convocou todas as partes interessadas para uma rodada de conciliação com duração de 60 dias.
Divergência
Com isso, ele teria suspendido o trâmite de ações conduzidas por Toffoli, segundo as quais os acordos de leniência de empresas como J&F e Odebrecht (atual Novonor) foram assinados sob coação.
Igualmente importante, Mendonça teria aberto caminho para que o assunto seja no futuro discutido pelo plenário do STF.
É fato que as posições dos dois ministros não estão completamente alinhadas. Mas tenho dúvidas de que essa divergência seja, na prática, significativa.
Corruptos querem dinheiro
A pergunta fundamental é: interessa às empresas que assinaram leniências anular esses acordos?
A resposta é negativa, porque isso abriria um período de incerteza para as companhias, além de cancelar benefícios obtidos por empresários como Wesley e Joesley Batista, da J&F, que evitaram possíveis condenações criminais ao negociar com o MPF.
Acontece que as ações que estão com Toffoli questionam um ponto tão fundamental dos acordos – terem sido feitos sob intimidação – que seria dificílimo, para não dizer impossível, dar ganho de causa às empresas sem ao mesmo tempo invalidar a coisa toda.
Por isso, essas ações não se prestam muito bem ao objetivo dos empresários corruptos. Eles querem reduzir suas multas. Querem pagar menos. Só isso.
A solução Mendonça
André Mendonça criou as circunstâncias para que isso aconteça. Estabeleceu um fórum de renegociação de onde J&F, Odebrecht e patota poderão sair com novas condições para ressarcir os danos que causaram ao país. Condições, provavelmente, mais favoráveis a elas.
Ninguém poderá dizer que não praticou corrupção – como afirmou o ministro, não se trata de uma oportunidade para “revisionismo histórico”. Mas isso pouco importa para os empresários. Vamos repetir: a questão é dinheiro.
O processo de que Mendonça se valeu também não se prestava à finalidade – é uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental sem pé nem cabeça, que deveria ter sido jogada no lixo. Mas o ministro foi esperto: apresentou seu fórum como uma solução inovadora, ou pouco explorada, que transforma o STF em câmara de conciliação.
Acerto pelo topo
A beleza (contém ironia) dessa mesa de conversa é que todo os entes públicos que importam participam dela: CGU, AGU, TCU, STF e até mesmo a PGR, ou seja, o Ministério Público, órgão que originalmente realizou os acordos de leniência.
Paulo Gonet, o novo PGR, preferiu aderir à empreitada, em vez de defender o trabalho feito antes dele. Talvez, como o seu amigo, o ministro Gilmar Mendes, ele também ache que o Ministério Público não tem legitimidade para participar de acordos desse tipo.
A menos que alguém seja muito intransigente, daqui a 60 dias várias gigantes da corrupção devem ter acordos de leniência novinhos em folha, muito satisfatórios, com todas as assinaturas necessárias.
A velha tradição brasileira da conciliação pelo topo terá produzido um novo fruto. E os custos da corrupção terão sido socializados mais uma vez, ou seja, transferidos para a patuleia, que somos todos nós.
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