Dividendo amansa mercado, mas não está tudo bem na Petrobras
Governo mostra respeito pelos acionistas da empresa para continuar ditando sem transparência o preço dos combustíveis
Os investidores parecem não ter se incomodado demais com o prejuízo de 2,6 bilhões de reais da Petrobras no segundo trimestre deste ano. Foi o primeiro prejuízo desde 2020. Eu não entendo nada de investimentos. Mas sob o prisma político, acho que há sim com que se preocupar.
Nesta sexta-feira, 9, primeiro pregão depois do anúncio dos maus resultados, as ações da Petrobras caíram um pouco, mas sem Deus-nos-acuda. Ninguém está recomendado que se faça uma liquidação dos papeis.
Há duas razões para isso.
O nó dos reajustes
Primeiro, a estatal vai pagar dividendos. Isso será possível porque a liberação desse dinheiro aos acionistas não está condicionada ao lucro, mas a duas outras variáveis, o fluxo de caixa e os investimentos. Além disso, existe uma reserva especial para possibilitar a remuneração de investidores nessas situações.
Em segundo lugar, a piora nos resultados se deve a dois fatores que podem ser considerados como episódicos: um acordo com o Carf, que vai resultar num desembolso bilionário, mas que seria muito maior se a pendenga prosseguisse; e a desvalorização do real frente ao dólar.
Existe um perigo, no entanto, maneira como a empresa passou a lidar com as variações da cotação internacional do petróleo e seus derivados.
Amansando os acionistas
A Petrobras fez um único reajuste neste ano, em julho, quando seus preços já mostravam uma grande defasagem em relação aos praticados no mercado externo. É certo que a empresa absorveu os custos dessa defasagem, em vez de repassá-los ao consumidor brasileiro – e isso explica uma parte do prejuízo no segundo trimestre.
Alguém vai dizer que não existe motivo para reclamar. Os acionistas vão ganhar seus dividendos. Os motoristas não tiveram de lidar com reajustes constantes na bomba de combustíveis. O prejuízo não chegou a ser uma catástrofe. Deixa quieto!
Deixe-me descrever as coisas de outra maneira. Ao garantir os dividendos do mercado, o governo Lula, que manda na Petrobras, está amansando um leão que ruge alto para, em troca, conduzir em paz um política de seu interesse: ditar o preço dos combustíveis – uma variável política das mais sensíveis, como se sabe.
Ferramenta
Pode não ser muito grave neste momento, mas se a gestão lulista está disposta a impor esse “pequeno dano” à empresa neste momento, o que fará se o preço dos combustíveis se tornar uma questão eleitoral decisiva daqui a algum tempo? Hesitará em impor um grande dano à companhia? Os petistas já fizeram esse estrago antes.
O pior de tudo é que ninguém sabe como os reajustes dos combustíveis estão sendo definidos e calculados. Assim que fincou suas garras novamente na Petrobras, o PT abandonou a política de paridade internacional de preços que estava em prática e cuja principal vantagem era a transparência. A nova metodologia é mantida em segredo. No mínimo dos mínimos, deveria existir algum gatilho conhecido para os reajustes, evitando que decisões difíceis sejam adidas indefinidamente ou sejam tomadas segundo o timing da política.
Não basta exigir que o governo respeite os acionistas da Petrobras. É preciso impedir que ele a use como uma ferramenta.
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