O que Lula deveria dizer se quer mesmo a paz em Israel O que Lula deveria dizer se quer mesmo a paz em Israel
O Antagonista

O que Lula deveria dizer se quer mesmo a paz em Israel

avatar
Carlos Graieb
5 minutos de leitura 11.10.2023 20:44 comentários
Opinião

O que Lula deveria dizer se quer mesmo a paz em Israel

A esquerda brasileira respondeu no automático ao terrorismo do Hamas e acabou pagando um preço nos últimos dias. Debaixo de críticas, precisou deixar de lado o hábito de tratar como equivalentes ações assassinas direcionadas contra civis e ações militares direcionadas contra terroristas islâmicos...

avatar
Carlos Graieb
5 minutos de leitura 11.10.2023 20:44 comentários 0
O que Lula deveria dizer se quer mesmo a paz em Israel
Lula e Guilherme Boulos em fevereiro de 2022. Foto: (Ricardo Stuckert)

A esquerda brasileira respondeu no automático ao terrorismo do Hamas e acabou pagando um preço nos últimos dias. Debaixo de críticas, precisou deixar de lado o hábito de tratar como equivalentes ações assassinas direcionadas contra civis e ações militares direcionadas contra terroristas islâmicos.

Embora sem condenar frontalmente o Hamas, políticos como Lula e Guilherme Boulos se viram forçados a dizer que as atrocidades do fim de semana são injustificáveis. O MST tirou do ar uma postagem que descrevia os ataques como “resistência legítima”. O deputado federal Márcio Jerry (PCdoB-MA) demitiu de seu gabinete o ativista Sayid Tenório, que um dia antes havia zombado pelas redes sociais de uma jovem israelense feita como refém e arrastada pelos cabelos.

Tudo isso, no entanto, é somente um recuo tático. Não creio que a maneira de ver o Hamas tenha mudado substancialmente para qualquer uma dessas pessoas: continuarão a tratá-lo como um ator político “normal”, fingindo que seu propósito não é varrer do mapa o Estado de Israel e que seus líderes não são, antes de tudo, fanáticos religiosos.

Na entrevista que deu ao Papo Antagonista na segunda-feira (9), o advogado Fernando Lottenberg, comissário da OEA para Monitoramento e Combate ao Antissemitismo, previu que o apoio a Israel tende a se esvair conforme a resposta militar aos atentados progrida.

“Eu imagino que a reação de Israel será muito mais severa que em vezes anteriores”, disse Lottenberg. “É de se esperar que a boa vontade dos primeiros dias, pelo choque que causou no mundo todo a violência do Hamas contra civis israelenses, vá diminuir, e a gente verá o pêndulo andar para o outro lado.”

Não há dúvida de que civis vão morrer em Gaza nas próximas semanas. Diante disso, Lula, Boulos e companhia provavelmente estarão entre os primeiros a tentar forçar o pêndulo da opinião pública, dizendo que estavam certos o tempo todo — que não há diferença fundamental entre o Hamas e a única nação democrática do Oriente Médio.

Isso não é nem será verdade, a menos que Israel abandone quaisquer medidas para distinguir palestinos comuns de terroristas e ordene que seus soldados reúnam famílias na rua para fuzilá-las. Acontece que as chances de Israel enveredar por esse caminho são ínfimas, no mínimo, por razões pragmáticas: o país não se arriscaria a sofrer uma condenação daqueles que o apoiam no Ocidente, como os Estados Unidos e os principais países da Europa.

Lula e o PT dizem defender a “solução de dois Estados”, em que Israel e Palestina “convivam dentro de fronteiras seguras para ambos os lados”. Dizem também querer que o Brasil contribua para a construção da paz. Nada disso pode ser verdade na medida em que se trate o Hamas como interlocutor legítimo para negociações políticas, pela simples razão de que Israel não existe no mundo que o Hamas deseja a longo prazo.

Há alguns pontos de partida possíveis para que essas alegadas boas intenções da esquerda brasileira sejam mais que lero-lero. Primeiro, o Brasil deveria saudar a formação de um governo de emergência em Israel, como ocorreu nesta quarta-feira (11). Ele significa que para enfrentar a crise, depois das falhas catastróficas de inteligência que permitiram os ataques terroristas, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu abriu espaço para políticos moderados ao seu lado e reduziu a força da extrema direita em seu gabinete.

Em segundo lugar, deveria passar a tratar a Autoridade Palestina como único parceiro viável para negociações entre palestinos e israelenses, em vez de insistir no apoio ao Hamas. Sim, a entidade que governa a Cisjordânia está decadente e desacreditada. E eis aqui uma crítica que merece ser feita: isso se deve em boa parte aos esforços de Israel, e especialmente de Netanyahu, para minar a sua representatividade. Mas, como lembra o jornalista Thomas Friedman, que se dedica à cobertura do Oriente Médio há 50 anos, é a Autoridade Palestina que tem colaborado há anos com Israel para manter a estabilidade na Cisjordânia — além, é óbvio, de ter sido a signatária dos Acordos de Oslo nos anos 1990.

Finalmente, o governo brasileiro poderia incentivar o prosseguimento das conversas inéditas entre Israel e Arábia Saudita, que vinham progredindo em bom ritmo. Quem mais odeia a ideia de que esse entendimento histórico possa se concretizar são o Hamas e seu financiador, o Irã. É certo que um dos objetivos dos ataques do fim de semana foi interromper essas negociações, que mudariam a face do Oriente Médio.

É óbvio que nenhuma dessas iniciativas faria a menor diferença, porque o Brasil é irrelevante nesse enredo. Mas o efeito aqui dentro não seria de todo desprezível. Daria pelo menos alguma credibilidade à ideia de que Lula e seu governo desejam mesmo a paz entre israelenses e palestinos, em vez de estarem mais preocupados com os interesses de um país como o Irã, que tem papel de destaque no “mundo multipolar” que os petistas sonham em construir ao lado de gente boa como o russo Vladimir Putin e o chinês Xi Jinping.

  • Mais lidas
  • Mais comentadas
  • Últimas notícias
1

Ellen DeGeneres deixa EUA após escândalos e reeleição de Trump

Visualizar notícia
2

Tarcísio defende Bolsonaro contra “narrativa disseminada”

Visualizar notícia
3

Agora vai, Haddad?

Visualizar notícia
4

Bolsonaro deixou aloprados aloprarem?

Visualizar notícia
5

Trump nomeia ex-procuradora da Flórida após desistência de Gaetz

Visualizar notícia
6

"Não faz sentido falar em anistia", diz Gilmar

Visualizar notícia
7

PGR vai denunciar Jair Bolsonaro?

Visualizar notícia
8

Mandado contra Netanyahu não tem base, diz André Lajst

Visualizar notícia
9

Calendário PIS 2025 (22/11): Saiba os valores e como receber

Visualizar notícia
10

PF indiciou padre em caso de golpismo

Visualizar notícia
1

‘Queimadas do amor’: Toffoli é internado com inflamação no pulmão

Visualizar notícia
2

Sim, Dino assumiu a presidência

Visualizar notícia
3

O pedido de desculpas de Pablo Marçal a Tabata Amaral

Visualizar notícia
4

"Só falta ocuparem nossos gabinetes", diz senador sobre ministros do Supremo

Visualizar notícia
5

Explosões em dispositivos eletrônicos ferem mais de 2.500 no Líbano

Visualizar notícia
6

Datena a Marçal: “Eu não bato em covarde duas vezes”; haja testosterona

Visualizar notícia
7

Governo prepara anúncio de medidas para conter queimadas

Visualizar notícia
8

Crusoé: Missão da ONU conclui que Maduro adotou repressão "sem precedentes"

Visualizar notícia
9

Cadeirada de Datena representa ápice da baixaria nos debates em São Paulo

Visualizar notícia
10

Deputado apresenta PL Pablo Marçal, para conter agressões em debates

Visualizar notícia
1

Bolsa família (22/11): Empréstimos de até R$ 21 mil é disponibilizado. Confira

Visualizar notícia
2

PF indiciou padre em caso de golpismo

Visualizar notícia
3

Microsoft pede a Trump endurecimento contra hackers russos e chineses

Visualizar notícia
4

Fernández intimado por violência contra ex-mulher na Argentina

Visualizar notícia
5

22 de novembro é feriado? Saiba onde!

Visualizar notícia
6

Ellen DeGeneres deixa EUA após escândalos e reeleição de Trump

Visualizar notícia
7

Calendário PIS 2025 (22/11): Saiba os valores e como receber

Visualizar notícia
8

Mandado contra Netanyahu não tem base, diz André Lajst

Visualizar notícia
9

Bolsonaro deixou aloprados aloprarem?

Visualizar notícia
10

Trump nomeia ex-procuradora da Flórida após desistência de Gaetz

Visualizar notícia

Assine nossa newsletter

Inscreva-se e receba o conteúdo do O Antagonista em primeira mão!

Tags relacionadas

Fernando Lottenberg Guilheme Boulos Hamas Israel Lula Palestina Partido dos Trabalhadores (PT) Terrorismo
< Notícia Anterior

Egito alertou Israel antes de ataques, diz deputado dos EUA

11.10.2023 00:00 4 minutos de leitura
Próxima notícia >

Netanyahu: "Cada membro do Hamas é um homem morto"

11.10.2023 00:00 4 minutos de leitura
avatar

Carlos Graieb

Carlos Graieb é jornalista formado em Direito, editor sênior do portal O Antagonista e da revista Crusoé. Atuou em veículos como Estadão e Veja. Foi secretário de comunicação do Estado de São Paulo (2017-2018). Cursa a pós-graduação em Filosofia do Direito, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.

Comentários (0)

Torne-se um assinante para comentar

Notícias relacionadas

A novela do corte de gastos do governo Lula: afinal, sai ou não sai?

A novela do corte de gastos do governo Lula: afinal, sai ou não sai?

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Relação do Brasil com a China de Xi Jinping alcança um novo patamar

Relação do Brasil com a China de Xi Jinping alcança um novo patamar

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Janja se junta a Felipe Neto para xingar Elon Musk: passou dos limites?

Janja se junta a Felipe Neto para xingar Elon Musk: passou dos limites?

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Janjapalooza: um escárnio que revela a desconexão da esquerda com as mulheres

Janjapalooza: um escárnio que revela a desconexão da esquerda com as mulheres

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Icone casa

Seja nosso assinante

E tenha acesso exclusivo aos nossos conteúdos

Apoie o jornalismo independente. Assine O Antagonista e a Revista Crusoé.