A amizade de mais de 30 anos que acabou numa delação
O Antagonista teve acesso à delação premiada de Élcio Queiroz, acusado de participar do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, em 2018. No documento, o acusado detalha como era sua amizade...
O Antagonista teve acesso à delação premiada de Élcio Queiroz, acusado de participar do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, em 2018. No documento, o acusado detalha como era sua amizade, de mais de 30 anos, com Ronnie Lessa, outro acusado pelas mortes.
Queiroz contou que era muito amigo de Elaine, esposa de Lessa, desde os 12 anos de idade. Mais tarde, quando Elaine e Lessa começaram a namorar, teve início também a amizade entre os dois acusados pela morte da vereadora.
O ex-policial militar disse na delação que Lessa já era da Polícia Militar quando ele ingressou na corporação. “Nunca trabalhamos juntos na mesma unidade, chegamos a frequentar só mesmo uma vez quando ele era adido, deixou de ser adido e voltou pra Polícia Militar, e eu na época estava no grupamento aero marítimo e fui transferido para o Batalhão de Choque; nos encontramos no choque, mas nunca trabalhamos na mesma equipe, só nos encontrávamos quando ele estava em operação, ele estava adido da Polícia Civil, e eu com minha equipe da Polícia Militar, que às vezes dava algum apoio para o mesmo na minha área de atuação, quando fazia alguma operação naquele local“, disse Queiroz no depoimento.
O delator revelou que Lessa é padrinho do seu filho, que levou o afilhado para viajar aos Estados Unidos e que o compadre sempre fez todas as vontades do seu filho. “Eu sou amigo da família dele, ele é amigo da minha família“, resumiu.
Queiroz disse que, após ser expulso da corporação, na Operação Guilhotina, ação da Polícia Federal que apurou o envolvimento de policiais militares com traficantes de drogas e com milicianos, sua vida se complicou.
Naquele período, Lessa o ajudou a se sustentar. “Vira e mexe ele me ajudava… com um dinheiro pra fazer uma compra, sempre que podia ele me ajudava quando a gente se encontrava em algum momento… algumas vezes ele me ajudava financeiramente”, recordou Queiroz.
De acordo com Queiroz, Lessa tinha uma boa condição de vida e comentava que mantinha alguns quiosques em favelas. Ele era sócio do ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, o Suel, na exploração de máquinas caça-níqueis e em assinaturas de “gatonet”, serviço de transmissão ilegal de sinal de TV, muito comum nas regiões ocupadas pelas milícias. O ex-bombeiro foi preso nesta segunda-feira (24), no Rio de Janeiro, por participação no assassinato de Marielle.
Lessa e Queiroz passaram juntos a virada do ano de 2017 para 2018 . Foi nessa ocasião em que Lessa teria revelado ao comparsa um trabalho não finalizado: a execução de uma mulher. Queiroz ficou sabendo que participaria do crime horas antes da execução, quando recebeu uma mensagem de Lessa. “Ele respondeu que era pra dirigir pra ele; aí eu falei, mas qual foi, pra que é? Aí eu recebi uma imagem pelo aplicativo CONFIDE; quem conhece sabe que tem que deslocar o dedo, correr o dedo pela tela, então fica tipo uma tarja acompanhando a imagem; não dá pra ver a imagem total, ela vai conforme vai passando o dedo, ela vai correndo; aí depois automaticamente ela se destrói; como eu estava ali meio que parado, dirige não dirige, atento, eu só vi a imagem de várias mulheres reunidas; depois eu soube que era um evento da Casa das Pretas”, relata Queiroz na delação.
Já no carro, a caminho do local do crime, Lessa disse que iria assassinar a vereadora Marielle Franco.
Após o crime, ao chegar à casa de Lessa, Queiroz contou que estava muito embriagado, “querendo sumir do mundo”. Nesse momento, o comparsa teria lhe oferecido dinheiro. “Ele pegou e falou – nunca me esqueço disso – ‘cara, tu tá duro?’ Tô… mas qual foi, o que é? Ele falou: ‘vou te dar isso aqui cara, segura isso aqui…mas não é por causa disso não hein…não tem nada a ver com o crime não’; e me deu mil reais; sempre ele me dava um dinheiro; esse dinheiro ele me deu, mas falou que não tinha nada a ver com essa parada; ele falou que jurava, não botei um centavo nisso aí; eu falei não precisa não; aí aquele precisa, não precisa… ele me deu mil reais; mas deixou bem específico que não foi relacionado a…pô, seria até…mil reais… Deus me livre e guarde…aí eu peguei meu carro e…liguei pra minha esposa, que eu estava indo pra casa, pra ela abrir meu portão, porque é muito perigoso ali onde eu moro; pra ela ficar esperta quando eu chegasse, pra ver na câmera; lá em casa tem câmera; ela abriu portão pra mim e eu já entrei com o carro. Isso foi o dia, foi o dia do fato em si“, contou Queiroz à polícia.
Após o assassinato, Lessa e Queiroz voltaram a se encontrar para dar sumiço no carro que usaram no crime. O encontro seguinte se daria já no pátio do presídio. A delação, firmada após Queiroz descobrir que Lessa havia mentido à polícia, traindo sua confiança, pode ser o ponto final na amizade dos policiais que viraram criminosos.
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