O futuro é tradicional
Já estamos à beira de 2023 e não andamos em carros voadores, nem colonizamos Marte. O futuro mostrou-se menos espetaculoso do que o concebido outrora. A inovação tecnológica parece ter se concentrado nos smartphones, talvez também nos...
Já estamos à beira de 2023 e não andamos em carros voadores, nem colonizamos Marte. O futuro mostrou-se menos espetaculoso do que o concebido outrora. A inovação tecnológica parece ter se concentrado nos smartphones, talvez também nos drones. Nem mesmo os aviões tiveram relevantes inovações nas últimas décadas. Na verdade, o Concorde, avião supersônico, deixou de ser utilizado – e ainda não tem um substituto.
O cinema se digitalizou, porém sem grandes inovações. A tecnologia do 3D do cinema atual é a mesma do passado, apenas digitalizada. A grande inovação recente no cinema é na distribuição: o acesso aos streamings. Mesmo assim, o catálogo é menor do que o de uma boa videolocadora do passado.
Se continuar dessa forma, a inovação tecnológica não irá mudar radicalmente o cenário das cidades. Na verdade, pode acontecer até mesmo o contrário. Existe no mundo uma valorização crescente da arquitetura clássica. Prédios antigos, completamente descaracterizados há décadas, têm sido restaurados, exatamente como eram nos Estados Unidos e na Inglaterra. E prédios novos têm sido construídos em espaços vazios de prédios históricos, mantendo as características destes para, assim, manterem a unidade estética.
Nos Estados Unidos prédios inteiros, modernos, têm sido transformados em obras clássicas. Não deixa de ser curioso que a tecnologia é grande aliada desse reavivamento do passado.
Algo semelhante acontece na fotografia e no cinema, que têm se voltado cada vez mais para o analógico, ou ao menos a estética dele tem sido bastante emulada no digital. A série Stranger Things é um bom exemplo disso: toda a imagem busca reproduzir essa estética analógica da década de 1980.
Na religião, já há vários anos no Brasil a Missa Tridentina, com rito tradicional anterior ao Concílio Vaticano II, tem tido cada vez mais adeptos. Em 2007, o Papa Bento XVI promulgou o Summorum Pontificum, com o qual libera o uso da missa tradicional, chamada de Tridentina, bastando somente ser solicitada por um grupo estável de fiéis. Nessas missas, em latim, as mulheres usam véus, e não raro sentam-se mulheres de um lado e homens do outro. O Papa Francisco limitou as missas tradicionais, mas isso não afetou substancialmente o interesse por elas.
Essas missas são amplamente divulgadas na internet: existem cursos, palestras, aulas sobre a história da Missa Tridentina e seu significado. O mesmo acontece em relação à fotografia analógica: tem uma grande difusão digital. Além de cursos, é possível encontrar na internet filmes fotográficos, revelação, químicos, toda uma rede de facilidades que não existia na época propriamente analógica.
No automobilismo, os carros antigos têm se valorizado cada vez mais. E conta também com uma ampla rede digital de troca de informações, com encontros regulares presencialmente em várias cidades do país. Reclama-se do preço crescente dos carros antigos, especialmente dos mais famosos, como Fusca, mas isso é só reflexo do crescimento da procura.
À medida em que vá surgindo um interesse e um mercado crescente para esses bens produzidos no passado, é possível, com a ajuda da tecnologia, que eles voltem a ser comercializados. A Polaroid, parada por décadas, voltou a produzir seus filmes. A Leica voltou a fabricar sua Leica M6, analógica. Será que em breve vai ser possível comprar Fuscas ou Mavericks novos?
O interesse pelo passado parece estar longe de ser uma moda passageira.
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