Entenda impactos de decisão do Banco Central Europeu
O Banco Central Europeu (BCE, na foto) se reuniu hoje (21) e aumentou sua taxa de juros em 50 pontos-base, para zero, a primeira alta em mais de uma década...
O Banco Central Europeu (BCE, na foto) se reuniu hoje (21) e aumentou sua taxa de juros em 50 pontos-base, para zero, a primeira alta em mais de uma década. Num passado longínquo, os juros negativos foram empregados para ajudar a estimular a economia e facilitar o financiamento dos países da zona do euro, tornando seus custos de empréstimo mais baixos.
Isso foi fundamental para reverter a crise dos PIIGS (sigla traduzida para o português: Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha), sob o comando de Mario Draghi, o mesmo burocrata que hoje pediu renúncia do cargo de primeiro-ministro italiano e que acaba de causar a dissolução do Parlamento pelo presidente, horas atrás.
O mercado estava dividido entre 25 e 50 pontos-base em sua previsão para a alta histórica. A dúvida é porque o BCE tem sido o banco central mais dovish do mundo —basicamente, o último desenvolvido a tomar medidas contra a inflação. Isso inclusive impactou mais a zona do euro do que todos os outros países, uma vez que ela é dependente energeticamente da Rússia, que sofre alta de mais 300% nos preços do gás natural.
Sendo assim, se a inflação lá foi a maior em 40 anos, por que demoraram tanto para reagir? Porque, diferentemente de outros países, o BCE não é ligado ao Tesouro Nacional de seu país (como no caso do Brasil e dos EUA) pelo fato de que cada país tem independência fiscal, apesar de dividirem a mesma moeda.
Logo, em momentos de crise, países fiscalmente responsáveis, como a Alemanha, viram destino de recursos, enquanto países mais gastadores, como a Itália, começam a ter que pagar cada vez mais caro para se financiar. No fim, isso compromete ainda mais suas contas nacionais. Não havendo moeda própria para desvalorizar, o ajuste de risco para cada país acontece diretamente nos juros pagos, o que cria uma dinâmica idêntica àquela vista uma década atrás, na última crise europeia.
Uma vez que esse movimento de deterioração já começou há meses, o BCE ficou com medo de jogar mais lenha na fogueira ao subir os juros, já que isso aumentaria ainda mais os custos de captação dos países. Por outro lado, ele precisava se mover, dado que, quanto mais a inflação subia, mais os juros reais ficavam negativos —o que aumentaria a inércia inflacionária.
Algo precisava ser feito, senão os problemas apenas se agravariam dos dois lados. E foi exatamente o que aconteceu: a falta de atitude do BC fez com que o euro caísse 20%, chegando a tocar a paridade com o dólar (um para um), algo não visto há 20 anos.
A solução começou a aparecer na última reunião, quando o BCE comunicou que não faria nada, mas que estava criando um plano especial pelo qual ele poderia comprar a dívida de países que estavam com os preços de sua dívida em espiral degenerativa. Mesmo sem os detalhes da decisão, isso estancou a deterioração das dívidas e mudou um pouco a dinâmica negativa do euro.
Hoje, com a alta mais forte que a esperada e com o anúncio formal do TIP (nome dado ao programa de compra dívidas dos países periféricos), o mercado financeiro respira um pouco mais aliviado: pelo menos algo está sendo feito para combater os dois grandes problemas da inflação e do financiamento da dívida.
Por outro lado, isso também aumenta a probabilidade de recessão. Mas, no momento, o mercado parece mais preocupado com as questões de curto prazo. O TIP não se sustenta por muito tempo, uma vez que será necessária alguma mudança na forma como os periféricos gastam, de modo a evitar que as coisas sejam apenas adiadas.
Para nós, isso pode mudar um pouco a dinâmica de apreciação do dólar, visto que o euro se torna mais atraente na margem. Além disso, o BCE entrando em campo ajuda a melhorar a percepção de risco do mercado como um todo, beneficiando os ativos financeiros em geral. Antes tarde do que nunca.
Rodrigo Natali, estrategista-chefe na Inv Publicações.
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