Agamenon: “Deu péssimo”
Eu sou um liberal nos costumes, como prova o meu casamento aberto com Isaura, a minha patroa, que tem o costume de me passar para trás. E um conservador em assuntos econômicos, porque tento desesperadamente conservar o pobre dinheiro que ganhei com o suor dos outros...
Eu sou um liberal nos costumes, como prova o meu casamento aberto com Isaura, a minha patroa, que tem o costume de me passar para trás. E um conservador em assuntos econômicos, porque tento desesperadamente conservar o pobre dinheiro que ganhei com o suor dos outros. Mas posso dizer que sou um homem realizado. Não tenho tudo que como, mas como tudo que tenho. Depois de muito sacrifício, realizei o sonho do carro próprio e hoje, felizmente, vivo de favor em meu imóvel, o Dodge Dart 73, enferrujado, que fica estacionado na Rua da Amargura, sem número, fundos. Tá ruim pra todo mundo, mas pra mim tá pior.
Por causa da minha idade provecta e avantajada, estou perdendo a audição, o que é uma boa, porque assim, pelo menos, não sou obrigado a ouvir as queixas do meu gerente do banco. Aliás, esse mesmo gerente acabou de ser despedido e foi substituído por um robô. O pobre bancário agora está pedindo esmola aqui perto da minha casa, ao lado de muitos jornalistas que foram mandados recentemente embora da Globo. São tantos os desempregados globais que muita gente se pergunta: quanto tempo ainda os Marinho vão continuar trabalhando na empresa?
Nem todo pedinte de rua tem a sorte do mendigo pegador que virou uma celebridade nacional e hoje ganha a vida como coach. Aliás, virar coach também já não é mais uma opção para os que praticam a picaretagem. O mercado está saturado de pessoas que tentam ensinar a autoajuda, no caso a autoajuda a si mesmo. Uma outra opção é entrar no ramo de stand-up comedians, o que não dá mais pra mim porque mal consigo ficar em pé. Além do mais, segundo o Censo, 1/3 da população brasileira é composta de stand ups, 1/3 de influenciadores digitais e 1/3 de ex-BBBs.
Só me resta a nostalgia…Lembrar do passado, mesmo que não tenha acontecido, é a única atividade que me traz algum alento. Bons tempos aqueles de Epitácio Pessoa, Prudente de Moraes, Rui Barbosa (o Cabeção), Nilo Peçanha, Graça Aranha, Senador Dantas e o meu melhore amigo, o Avenida Rio Branco.
O Rio de Janeiro era uma cidade maravilhosa, sem esses traficantes que destroem a nossa mocidade com o flagelo dos “tóchicos”. Podia-se compra morfina tranquilamente sentado na Galeria Cruzeiro, entre uma média com pão canoa e um Odalisca sem filtro ao lado de Bororó, Jota Carlos, Calixto e o Ziraldo, que naquela época ainda não tinha brochado. O pervitin, o pantrophon, a cocaína e o Mandrix corriam soltos. Era só mandar o garoto dos recados comprar na pharmácia. Até mesmo as doenças venéreas não eram sexualmente transmissíveis como hoje em dia. Ah, que saudade que eu tenho da blenorragia, do condiloma, da tísica e do escorbuto! Nada que uma injeção King e um supositório de óleo de rícino não pudessem resolver.
Agamenon Mendes Pedreira é o jornalista idoso mais vivo do Brasil.
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