Moraes errou ao mandar bloquear o Telegram
Já escrevi em diversos artigos que entendo que o judiciário pode e deve punir o Telegram, inclusive com suspensão ou banimento, caso não se adapte à nossa legislação. Cheguei até a escrever que seria, na verdade, um autobanimento, se voluntariamente o aplicativo optasse por operar de forma marginal. Continuo achando a mesma coisa. Mas a decisão do ministro...
Já escrevi em diversos artigos que entendo que o judiciário pode e deve punir o Telegram, inclusive com suspensão ou banimento, caso não se adapte à nossa legislação.
Cheguei até a escrever que seria, na verdade, um autobanimento, se voluntariamente o aplicativo optasse por operar de forma marginal.
Continuo achando a mesma coisa. Mas a decisão do ministro Alexandre de Moraes, desta última sexta-feira, bloqueando o aplicativo em todo o Brasil, foi em outra direção e não andou bem.
O ministro não bloqueou o Telegram por não se adaptar à nossa legislação, mas por ter se negado a cumprir ordens judiciais que determinavam o bloqueio de perfis, dentre os quais alguns vinculados ao bolsonarista Allan dos Santos, a suspensão de todo e qualquer repasse de seus recursos de monetização e o envio de dados cadastrais de usuários à Justiça.
O aplicativo descumpriu as ordens e Moraes entendeu que a falta de colaboração merecia a medida de força empregada, pois demonstrava desprezo à Justiça brasileira.
Não vejo dessa forma. Não mesmo. Quantas ordens judiciais são descumpridas por acreditar a pessoa ou empresa que, por meio de recursos jurídicos, obterá a revogação da ordem por outro julgador? Isso é corriqueiro e faz parte do jogo democrático no qual o judiciário está também inserido.
Eu mesmo, tendo por ofício advogar para jornalistas e formadores de opinião, muitas vezes enfrento ordens de cunho censório, impondo que determinada matéria seja retirada do ar, e o descumprimento, até que todos os recursos jurídicos estejam esgotados, é uma forma importante de resistência. Não há nenhum desprezo à Justiça nisso, ao contrário, há uma demonstração do quanto a busca até a última gota de suor pela decisão justa é importante.
O bloqueio do Telegram é uma medida possível, mas como punição ao aplicativo por não se adaptar às nossas leis, e não por descumprir ordem judicial. E seja como for, essencial que uma medida de tamanho impacto como essa não seja nunca monocrática, nem feita sem debate com os pares do ministro Moraes, e destes com a sociedade. Uma medida de atropelo pode trazer como consequência a formação de uma jurisprudência perigosa.
Se amanhã, uma empresa qualquer de telefonia decidir descumprir uma ordem judicial, teremos um precedente desastrado permitindo que um juiz nos deixe a todos sem telefone e sem internet no país.
André Marsiglia é advogado especialista em Mídias e Liberdade de expressão. Escreve semanalmente n’ O Antagonista.
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