Uma condenação racional do aborto até 24 semanas Uma condenação racional do aborto até 24 semanas
O Antagonista

Uma condenação racional do aborto até 24 semanas

avatar
Mario Sabino
5 minutos de leitura 23.02.2022 16:46 comentários
Opinião

Uma condenação racional do aborto até 24 semanas

A descriminalização do aborto é tema delicado mesmo nas latitudes em que a interrupção voluntária da gravidez é direito da mulher já faz tempo. No Brasil, a maioria dos cidadãos é contra, de acordo com boa parte das pesquisas divulgadas sobre o tema. Aqui, a lei permite o aborto apenas no caso de a gestação representar risco para a mulher, se a gravidez for resultado de estupro ou quando o feto for anencéfalo -- a última possibilidade foi objeto de julgamento no STF, em 2012, que concluiu que, como a falta de cérebro não permite a vida fora do útero, não há cometimento de crime se a mulher optar pelo aborto...

avatar
Mario Sabino
5 minutos de leitura 23.02.2022 16:46 comentários 0
Uma condenação racional do aborto até 24 semanas
Reprodução/Canal 1

A descriminalização do aborto é tema delicado mesmo nas latitudes em que a interrupção voluntária da gravidez é direito da mulher já faz tempo. No Brasil, a maioria dos cidadãos é contra, de acordo com boa das pesquisas divulgadas sobre o tema. Aqui, a lei permite o aborto apenas no caso de a gestação representar risco para a mulher, se a gravidez for resultado de estupro ou quando o feto for anencéfalo — a última possibilidade foi objeto de julgamento no STF, em 2012, que concluiu que, como a falta de cérebro não permite a vida fora do útero, não há cometimento de crime se a mulher optar pelo aborto. Na verdade, o entendimento foi de que nem mesmo seria possível falar em aborto no caso de anencéfalos. No seu voto, o então ministro Ayres Britto afirmou: “O feto anencéfalo é uma crisálida que nunca se transformará em borboleta porque jamais alçará voo (…) Se todo aborto é uma interrupção voluntária de gravidez, nem toda interrupção voluntária de gravidez é aborto”. Ele disse ainda que “sobre o início da vida, a Constituição é de um silêncio de morte”.

Do ponto de vista religioso, a vida existe desde que o óvulo é fecundado. Por isso, a interrupção da gravidez seria pecado capital não importa o momento em que ela se dá. Da perspectiva legal, o momento inicial da vida humana está sujeito a discussões que, a depender do argumento vencedor nos países que descriminalizaram ou legalizaram aborto, resultaram no estabelecimento de limites diferentes para a permissão da interrupção voluntária da gravidez. Em geral, o aborto pode ser realizado até a 12ª ou 14ª semana de gestação. Mas há países nos quais esse prazo foi muito estendido. Na Holanda, por exemplo, ele vai até a 21ª semana; no Reino Unido, até a 24ª semana.

Nesta semana, na Colômbia, o aborto foi descriminalizado até a 24ª semana. É o sexto país da América Latina a permitir a interrupção da gravidez, depois de Argentina, Uruguai, Cuba, Guiana e México, mas é o que conta com o limite de semanas de gestação mais alto. Depois de a Corte Constitucional colombiana anunciar a decisão, feministas comemoraram nas ruas (foto) e, no Brasil, também houve quem festejasse. A ex-deputada Manuela D’Ávila foi ao Twitter, para dizer: “Histórico! O aborto até 24 semanas, um tema de saúde pública, foi aprovado pela Suprema Corte da Colômbia!”. Diante da repercussão negativa, ela apagou a postagem. Jair Bolsonaro também se manifestou na mesma rede social, para criticar a decisão da corte do país vizinho. Ele escreveu que vidas de crianças colombianas serão ceifadas com anuência do estado” e observou: “Quantas mães e pais não lutam com todas as forças para proteger a vida de um filho que nasceu prematuro? Quantos não choram quando perdem essa batalha? Essa luta nunca foi nem nunca será em vão. Ela existe porque existe uma vida humana a ser protegida ali”. Ele é contra a ampliação da legislação brasileira sobre interrupção voluntária de gravidez.

A descriminalização do aborto e a sua legalização são bandeiras da esquerda. Não deixa de ser curioso que aquela parte da humanidade que deseja submeter os cidadãos ao estado, em caráter irremediável, seja a que defenda uma decisão absolutamente pessoal. Mas não vou entrar nessa questão. Ela, neste artigo, é outra. Acho perfeitamente possível ser a favor da descriminalização e legalização do aborto, mas não aprová-lo no âmbito individual ou das próprias crenças religiosas. A ética pessoal e valores pessoais não podem ser impingidos, em casos como esse, a uma sociedade inteira. Na minha opinião, contudo, o limite para a interrupção voluntária da gravidez, salvo pelas causas já previstas na nossa legislação, não pode ultrapassar os três meses de gestação. Sei que muitos dirão que se trata de um tempo arbitrário para determinar o começo da vida, mas é até 90 dias de gravidez, ou por volta disso, que uma mulher pode sofrer aborto espontâneo, sem que isso implique, necessariamente, maiores traumas físicos e psicológicos. Acredito que se trata de critério bastante razoável para se estabelecer um limite legal para a interrupção voluntária da gravidez.

Por aprovar racionalmente esse limite de 3 meses, o que não significa chancelar o aborto como a esquerda o faz, é que posso afirmar o quão abominável é permitir que uma mulher possa interromper voluntariamente a gravidez até a 24ª semana, sem sofrer sanções penais. Com seis meses de gestação, já se tem uma criança praticamente formada, com funções vitais capazes de garantir a sua existência fora do corpo materno  — e tanto é assim que os prematuros nascidos entre 22 e 25 semanas têm chance de sobreviver. Não há como negar do ponto de vista racional que, se uma mulher decidir abortar com seis meses de gestação, ela está praticando um infanticídio, assim como quem a ajuda a dar um fim à gravidez. Sou contra.

  • Mais lidas
  • Mais comentadas
  • Últimas notícias
1

PF indicia Bolsonaro e mais 36 por tentativa de golpe de Estado

Visualizar notícia
2

Jaguar se rende à cultura woke e é alvo de críticas

Visualizar notícia
3

Cid implica Braga Netto para salvar delação premiada

Visualizar notícia
4

Kassab projeta Tarcísio presidente até 2030

Visualizar notícia
5

Moraes mantém delação premiada de Mauro Cid

Visualizar notícia
6

Putin comenta lançamento de míssil e ameaça o Ocidente

Visualizar notícia
7

O papel dos indiciados em suposta tentativa de golpe de Estado

Visualizar notícia
8

Gonet foi contra prisão de Cid após depoimento a Moraes; militar foi liberado

Visualizar notícia
9

Agora vai, Haddad?

Visualizar notícia
10

Crusoé: Pablo Marçal governador de São Paulo?

Visualizar notícia
1

‘Queimadas do amor’: Toffoli é internado com inflamação no pulmão

Visualizar notícia
2

Sim, Dino assumiu a presidência

Visualizar notícia
3

O pedido de desculpas de Pablo Marçal a Tabata Amaral

Visualizar notícia
4

"Só falta ocuparem nossos gabinetes", diz senador sobre ministros do Supremo

Visualizar notícia
5

Explosões em dispositivos eletrônicos ferem mais de 2.500 no Líbano

Visualizar notícia
6

Datena a Marçal: “Eu não bato em covarde duas vezes”; haja testosterona

Visualizar notícia
7

Governo prepara anúncio de medidas para conter queimadas

Visualizar notícia
8

Crusoé: Missão da ONU conclui que Maduro adotou repressão "sem precedentes"

Visualizar notícia
9

Cadeirada de Datena representa ápice da baixaria nos debates em São Paulo

Visualizar notícia
10

Deputado apresenta PL Pablo Marçal, para conter agressões em debates

Visualizar notícia
1

Mandado contra Netanyahu não tem base, diz André Lajst

Visualizar notícia
2

Bolsonaro deixou aloprados aloprarem?

Visualizar notícia
3

Trump nomeia ex-procuradora da Flórida após desistência de Gaetz

Visualizar notícia
4

PGR vai denunciar Jair Bolsonaro?

Visualizar notícia
5

Tarcísio defende Bolsonaro contra “narrativa disseminada”

Visualizar notícia
6

Agora vai, Haddad?

Visualizar notícia
7

"Não faz sentido falar em anistia", diz Gilmar

Visualizar notícia
8

A novela do corte de gastos do governo Lula: afinal, sai ou não sai?

Visualizar notícia
9

Líder da Minoria sobre indiciamentos: "Narrativa fantasiosa de golpe"

Visualizar notícia
10

Fernández vai depor na Argentina sobre suposto episódio de violência doméstica

Visualizar notícia

Assine nossa newsletter

Inscreva-se e receba o conteúdo do O Antagonista em primeira mão!

Tags relacionadas

aborto até 24 semanas aborto no Brasil artigo casos em que o aborto é permitido Colômbia crianças anencéfalas descriminalização do aborto Jair Bolsonaro legalização do aborto Manuela D'Ávila Mario Sabino O Antagonista STF
< Notícia Anterior

Renan afirma que Aras “enrola” a CPI: “Heresia jurídica”

23.02.2022 00:00 4 minutos de leitura
Próxima notícia >

Bolsonaro liga para deputados "ideológicos" e pede que votem contra jogos

23.02.2022 00:00 4 minutos de leitura
avatar

Mario Sabino

Mario Sabino é jornalista, escritor e sócio-fundador de O Antagonista. Escreve sobre política e cultura. Foi redator-chefe da revista Veja.

Suas redes

Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.

Comentários (0)

Torne-se um assinante para comentar

Notícias relacionadas

A novela do corte de gastos do governo Lula: afinal, sai ou não sai?

A novela do corte de gastos do governo Lula: afinal, sai ou não sai?

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Relação do Brasil com a China de Xi Jinping alcança um novo patamar

Relação do Brasil com a China de Xi Jinping alcança um novo patamar

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Janja se junta a Felipe Neto para xingar Elon Musk: passou dos limites?

Janja se junta a Felipe Neto para xingar Elon Musk: passou dos limites?

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Janjapalooza: um escárnio que revela a desconexão da esquerda com as mulheres

Janjapalooza: um escárnio que revela a desconexão da esquerda com as mulheres

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Icone casa

Seja nosso assinante

E tenha acesso exclusivo aos nossos conteúdos

Apoie o jornalismo independente. Assine O Antagonista e a Revista Crusoé.