Nise Yamaguchi: entre o vírus e o protozoário
Desde que foi cotada por Jair Bolsonaro para assumir o Ministério da Saúde, em 2020, Nise Yamaguchi estava desaparecida no noticiário. Na ocasião, ela chegou a almoçar com o presidente, mas Bolsonaro acabou optando por Nelson Teich para substituir Luiz Henrique Mandetta. No entanto, mesmo fora do governo, a médica não deixou de aconselhar o presidente em seu negacionismo. Nise passou a integrar o que ficaria conhecido como "Ministério da Saúde paralelo". O nome da médica voltou ao centro das atenções durante o primeiro depoimento da CPI da Covid, em maio...
Desde que foi cotada por Jair Bolsonaro para assumir o Ministério da Saúde, em 2020, Nise Yamaguchi estava desaparecida no noticiário. Na ocasião, ela chegou a almoçar com o presidente, mas Bolsonaro acabou optando por Nelson Teich para substituir Luiz Henrique Mandetta.
No entanto, mesmo fora do governo, a médica não deixou de aconselhar o presidente em seu negacionismo. Nise passou a integrar o que ficaria conhecido como “Ministério da Saúde paralelo”.
O nome da médica voltou ao centro das atenções durante o primeiro depoimento da CPI da Covid, em maio. Mandetta disse aos senadores que o Palácio do Planalto queria mudar a bula da cloroquina para a incluir a prescrição do medicamento em casos de Covid.
Segundo o ex-ministro da Saúde, durante uma reunião em 6 de abril de 2020, quando ele estava prestes a ser demitido, Nise sugeriu a alteração. Participaram do encontro o então ministro da Casa Civil, Walter Braga Netto, o então secretário-geral da Presidência, Jorge Oliveira, e o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, que descartou a possibilidade de imediato.
Na semana seguinte, Barra Torres prestou depoimento e confirmou as declarações de Mandetta. O diretor da Anvisa disse até que teve uma reação “deseducada” à proposta de Nise, porque ela “não tinha cabimento”.
Em nota, Nise negou as acusações e disse que o decreto foi uma sugestão do médico anestesista Luciano Dias.
Os senadores da CPI da Covid descobriram, então, a existência do “Ministério da Saúde paralelo”, composto por médicos e empresários negacionistas.
O colegiado passou a apurar como o grupo influenciou nas decisões do governo sobre medicamentos sem eficácia comprovada, vacinas e uso de máscaras de proteção.
Em junho, Nise foi convocada a depor. Aos senadores, ela negou a existência do gabinete paralelo, mas confirmou que participava de um “comitê de crise institucional”. A médica disse que teve encontros com Jair Bolsonaro e que foi a Brasília com passagens pagas pela pasta.
Nise admitiu que o ex-assessor da Presidência Arthur Weintraub influenciava o governo em decisões sobre o tratamento precoce e que o empresário Carlos Wizard participava do grupo.
A médica negou que tivesse proposto a mudança na bula da cloroquina. Ela disse que participou da reunião mencionada, mas afirmou que não era esse seu propósito. A minuta, segundo Nise, falava apenas sobre “a possibilidade de haver uma disponibilização da cloroquina”.
O depoimento foi humilhante. A oncologista não soube responder a questionamentos básicos feitos pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), que também é médico, como, por exemplo, a diferença entre um vírus e um protozoário.
Otto chegou a afirmar: “A senhora não sabe nada de infectologia”.
Diante da performance constrangedora de Nise, os bolsonaristas passaram a afirmar que ela havia sido desrespeitada na comissão. Bolsonaro classificou o episódio como uma “covardia”. Nise entrou com uma ação contra o presidente da CPI, Omar Aziz, e Otto Alencar, por danos morais.
Dias depois do depoimento, o Metrópoles divulgou um vídeo que escancarou o funcionamento do Ministério da Saúde paralelo. Na gravação, Bolsonaro participa de uma reunião, coordenada por Osmar Terra, em que médicos aconselham o presidente a defender o uso da cloroquina e levantam suspeitas sobre vacinas.
Nise Yamaguchi aparece no vídeo. Ela diz que é “uma honra” trabalhar ao lado de Terra. Depois da divulgação do vídeo, o parlamentar ficou conhecido como o “ministro da Saúde paralelo”.
Quando a CPI se encaminhava para a sua conclusão, surgiram denúncias de que a Prevent Senior teria promovido experimentos com medicamentos ineficazes contra a Covid, sem o consentimento de pacientes. Além disso, a operadora de planos de saúde teria pressionado médicos a receitarem as substâncias.
Em depoimento à comissão, o diretor da Prevent Pedro Batista Júnior disse que Nise foi uma das responsáveis por elaborar o protocolo da empresa para o combate à Covid.
O executivo também confirmou a suspeita de que a médica teria comandado a realização de experimentos com medicamentos do “kit Covid” no médico negacionista Anthony Wong, que morreu em decorrência da doença.
No relatório final da CPI, o relator, Renan Calheiros, pediu o indiciamento de Nise por epidemia culposa com resultado morte. O senador citou o seu envolvimento com o “gabinete paralelo”.
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