A transparência do poder público brasileiro costuma ser alvo de críticas. Pedidos de acesso à informação são negados sem justificativas convincentes e mesmo as agendas de autoridades não são devidamente divulgadas. Mas, entre os três Poderes, o menos transparente é o Judiciário.
A opinião é de Fabro Steibel, especialista em “governo aberto” e diretor-executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS Rio).
“O portal de transparência do Ministério Público é capenga e os do Judiciário são inconstantes nas atualizações. Quando olhamos o Executivo, em regra, temos o suprassumo do portal de transparência dos países.”
Isso acontece, segundo Steibel, porque, quando se começou a pensar em transparência do poder público, o foco estava voltado quase que exclusivamente ao Executivo.
Leia os principais trechos da entrevista e assista à íntegra no fim do texto:
Como podemos definir a transparência no poder público?
Transparência é uma cultura que entende que o governo deve ser sempre aberto, mas nem tudo ficará aberto o tempo todo para todo mundo.
Essa transparência serve para nós controlarmos o governo, pois mostra os podres que existem. Em geral, há muita coisa errada no governo. E faz parte, pois os governos são construções coletivas.
Dos três Poderes, o mais transparente é o Executivo. Em seguida, vem o Legislativo. Já o menos transparente é o Judiciário, incluindo o Ministério Público.
Por que essa falta de transparência no Judiciário e no Ministério Público?
Desenvolvemos muito conhecimento sobre transparência no Executivo. Mas entendemos, depois, que não se trata de um Poder, mas de um governo. E aí foi se expandindo para os outros poderes. Mas isso leva tempo.
O portal da transparência do governo federal, criado em 2004, é um dos mais antigos do mundo. Já o portal da transparência do Ministério Público é capenga e os do Judiciário são inconstantes nas atualizações. Quando olhamos o Executivo federal, em regra, temos o suprassumo do portal da transparência dos países.
Punições por falta de transparência podem ajudar a melhorar os sistemas?
Tem que ser a punição e a bonificação. Uma Lei de Acesso à Informação (LAI) sem punições é um erro. Porque isso cria uma situação em que a autoridade não quer divulgar o dado e fica por isso mesmo. Temos muitos casos que chegam à última instância da LAI e a informação não é liberada.
Qual o nível de transparência do governo brasileiro?
A LAI é um marco de transparência, mas ela veio tarde. Fomos um dos últimos países da América Latina a ter uma lei nesse sentido. E a implementação dela teve prazo de seis meses, o que é muito complicado.
Nós melhoramos muito, mas a gestão de Jair Bolsonaro marca o retrocesso no entendimento da transparência, porque há sempre uma condicionante. Na LAI, por exemplo, tem se usado com maior frequência as exceções de sigilo.
No caso do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, colocou-se o sigilo máximo de 100 anos. Isso é muito raro. Há situações em que uma medida assim é necessária, mas ela deve ser usada para coisas que exigem esse tipo de limitação.
É uma hipocrisia deixar a cargo do Judiciário o julgamento sobre transparência, sendo que esse poder não cumpre o nível de transparência exigido?
A democracia tem hipocrisias. E é o melhor que podemos fazer. Os partidos definem as próprias regras e aumentam o fundão, por exemplo. E o Judiciário vai julgar casos sobre ele mesmo, por exemplo, pagamento de auxílio-moradia.
O ideal é que os outros Poderes tenham alguma maneira de controlar. No caso do Judiciário, é a lei. Se a norma diz ‘mostre’, o Judiciário tem que mostrar. O Legislativo controla o Judiciário nesse momento. Daí a importância da sociedade civil, de não deixarmos o governo sozinho e da agenda de governo aberto. É preciso ter a imprensa pressionando e trazendo ao público temas relevantes para serem discutidos.
Assista: