Agamenon: “A Cópula do Clima”
Ah, que saudades que eu tenho do tempo em que vivia no miserê... Bons tempos aqueles quando eu chamava urubu de meu louro e roía aba de penico! Pelo menos tinha um prato de sopa e uma côdea de pão velho para roer. Bons tempos aqueles que ainda saía água da bica e os ratos infestavam a nossa casa. Era tanto rato que sempre sobrava um para fazer assado no ajantarado de domingo...
Ah, que saudades que eu tenho do tempo em que vivia no miserê… Bons tempos aqueles quando eu chamava urubu de meu louro e roía aba de penico! Pelo menos tinha um prato de sopa e uma côdea de pão velho para roer. Bons tempos aqueles que ainda saía água da bica e os ratos infestavam a nossa casa. Era tanto rato que sempre sobrava um para fazer assado no ajantarado de domingo. Tudo isso não passa de lembranças de um passado que não volta mais, mesmo porque não tem dinheiro pra pagar a passagem.
Minha penúria é tão grande que os ratos desistiram de procurar comida na geladeira lá de casa. Até o fotógrafo de fama internacional, o Sebastião Salgado, se recusou a tirar um retrato da minha esquálida figura porque a minha miséria é tanta que não atinge o mínimo de indigência necessária aos personagens de suas fotografias de pobre. Felizmente, uma mão amiga se estendeu para mim. Sim, ainda existem seres humanos que se importam com o sofrimento alheio e não acham que minha inanição é só “uma fomezinha”. Ao completar 80 anos, Roberto Carlos fez questão de sair da quarentena no seu apê na Urca e trazer para mim um pedaço do seu bolo de aniversário. Desesperado, engoli a guloseima, mas em seguida, por educação, fiz questão de perguntar ao Rei: “Não tem outro pedaço?”.
Assim que o açúcar penetrou em meu ralo sangue, pude observar com mais nitidez a figura do Rei, que, apesar da idade provecta, está bem. Bem velho e bem acabado. O que prova que, graças aos avanços da cirurgia plástica, os 80 são os novos 90. Com um sorriso forçado nos lábios botocados, Roberto Carlos, o oitentão, cantou para mim uma pérola do seu cancioneiro, a antológica Ereções (que eu não ouço nem vejo há muito tempo). Mesmo assim, minha moral não levantou de jeito nenhum e o Rei da (antiga) Jovem Guarda se trancou no meu Dodge Dart 73, enferrujado, com a Isaura, a minha patroa, para quem compôs A Namoradinha de um Amigo Meu. A coisa estava ficando animada dentro do meu automóvel-residência quando, subitamente, aparece a apresentadora Ana Maria Brega acompanhada de seus irmãos mais novos: os faraós Tutancâmon e Ramsés II. Ana Maria aprontou o maior barraco na porta da minha residência ao saber que o Roberto Carlos estava no vuco-vuco com minha patroa, a Isaura. Ciumenta, a patroa do louro José, gritava que ela era a única comida que a dentadura do Rei podia mastigar. Roberto inclusive compôs em sua homenagem a canção romântica Mulher de Noventa.
Amigo das plantas e dos animais (inclusive eu), Roberto Carlos sempre defendeu a ecologia e o meio ambiente e, portanto, deveria ser o representante brasileiro na Cúpola do Clima. Mas quem acabou indo para criar o maior “climão” entre os líderes mundiais foi o crisedente É Bom Jair Desmatando Bolsonaro e o seu ministro Ricardo Malles. Esses dois só pensam numa coisa: tacar fogo na Amazônia. Só não completaram o serviço ainda porque o preço da gasolina aumentou muito. Jair Bolsonabo vai fazer um discurso ecológico pedindo mais dólares (que são verdes) aos países ricos para caiar de branco as árvores da região, como se faz nos quartéis. Isso tudo, é claro, é conversa pra boiada dormir. Enquanto o desmatamento come solto, o pobre seringueiro, que vive enfurnado na mata, não pode viver em paz e assim não consegue mais tirar leite do pau…
Agamenon Mendes Pedreira é jornalista cara de pau, mas a madeira é certificada.
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