Entrevista: “Quanto mais foco, maior a chance de sucesso”, diz procurador sobre CPI da Covid
Experiente investigador, o procurador Helio Telho diz, em entrevista a O Antagonista, que a CPI da Covid pode dar resultados se não ampliar demais o leque de apurações e se não houver um acordão político para proteger políticos de campos rivais...
Experiente investigador, o procurador Helio Telho diz, em entrevista a O Antagonista, que a CPI da Covid pode dar resultados se não ampliar demais o leque de apurações e se não houver um acordão político para proteger políticos de campos rivais.
“Quanto mais se abre o leque de fatos a serem investigados, maior o risco de se perder e não se apurar nada. De qualquer modo, o Senado não tem estrutura para investigar todos os gastos feitos com os bilhões de reais que a União repassou para todos os estados e municípios. E por isso vai usar critério político para selecionar as prioridades”, diz Telho.
Para ele, é baixa a probabilidade de depoimentos bombásticos, uma vez que há tempos o Supremo garante a investigados o direito ao silêncio ou até mesmo o não comparecimento.
“Mas a CPI pode ter bons resultados. Ela tem poderes de juiz e pode recrutar técnicos e investigadores de outros órgão públicos para assessorar os senadores. Tudo dependerá da atenção que receber da mídia e das redes sociais”, afirma.
Abaixo, a entrevista completa:
O Antagonista – Uma CPI no Senado poderá investigar governadores e prefeitos?
Helio Telho – “Não, se o objeto forem as políticas públicas que adotaram no combate à pandemia. Sim, se o objetivo for investigar o que essas autoridades fizeram com os recursos federais.
A CPI não poderia investigar, por exemplo, se um prefeito agiu certo ou errado na decretação de lockdown, ou se um governador agiu de forma irregular ao mudar a ordem de vacinação estabelecida no Plano Nacional de Imunização.
Mas poderá investigar se receberam do governo federal testes de Covid que não foram usados e sua validade expirou, ou respiradores que foram desviados para hospitais privados, por exemplo; ou se dinheiro transferido para a compra de máscaras foi desviado de finalidade.
Superfaturamentos, corrupção e até lavagem de dinheiro relacionados com os repasses federais poderão também ser sim investigados.
Agora, a responsabilidade pela política adotada pelo prefeito ou governador deve ser objeto de escrutínio pelos legislativos locais.”
E quanto ao presidente?
“Aí sim. O Senado poderá investigar se o presidente da República foi omisso na condução do combate à pandemia ou se adotou política de enfrentamento inadequada ou indevida.
O Senado tem a prerrogativa de investigar, porém, essa é uma investigação por natureza política e não técnica.
Por exemplo: a oposição propõe convocar alguém para esclarecer situação que possa potencialmente implicar o presidente. Aí, a base do governo pressiona para convocar alguém que deponha implicando um governador de oposição. Nessas circunstâncias, abre-se a possibilidade de haver um acordão pelo qual ambos os lados desistem de chamar essas testemunhas e tudo acabe em pizza.”
Não é melhor então focar a investigação no governo federal?
“Quanto mais a investigação foca em um determinado fato, maiores são as chances de sucesso. Quanto mais se abre o leque de fatos a serem investigados, maior o risco de se perder e não se apurar nada. De qualquer modo, o Senado não tem estrutura para investigar todos os gastos feitos com os bilhões de reais que a União repassou para todos os estados e municípios. E por isso vai usar critério político para selecionar as prioridades.
No início, a CPI definirá as linhas de investigação e os principais fatos a serem investigados. Porém, à medida em que os escândalos aparecerem, a CPI perderá o controle de sua agenda, que passará a ser guiada pela opinião pública. É por isso que dizem que CPI sabe-se como começa, mas não como termina.”
Dá para esperar a descoberta de grandes escândalos?
“Aquela ideia que se tem de CPI convocar pessoa suspeita e pressionar, criar ambiente de constrangimento para confessar ou se contradizer, isso o Supremo já não admite mais. Há precedentes assegurando não só o direito de silêncio, mas até mesmo o de o investigado nem comparecer a uma convocação para depor como suspeito.
Lembro que o Supremo já até proibiu condução coercitiva e o próprio Congresso aprovou lei definindo-a como abuso de autoridade.
Portanto, é equivocado acreditar que a CPI vá colocar o ex-ministro Eduardo Pazuello num paredão de fuzilamento. Não vai.
Mas a CPI pode ter bons resultados. Ela tem poderes de juiz e pode recrutar técnicos e investigadores de outros órgão públicos para assessorar os senadores. Tudo dependerá da atenção que receber da mídia e das redes sociais. Parlamentares, por dependerem do voto, são muito sensíveis à opinião pública. Tivemos CPIs que não tiveram cobertura da imprensa, porque não despertavam o interesse do público. Por isso, quase ninguém ficou sabendo se deram ou não resultados, como foi o caso das CPIs do Trabalho Escravo e a CPI do Tráfico de Pessoas. Aliás, muita gente sequer ficou sabendo da existência delas.”
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