Direita e esquerda usam cloroquina (e tubaína)
Ontem, em entrevista à GloboNews, Nelson Teich deixou mais ou menos claro (a fala dele não é exatamente linear) que a cloroquina foi a causa da saída dele do Ministério da Saúde. Não achava razoável gastar o já escasso dinheiro da pasta com a compra de um remédio que não se mostrou cientificamente eficaz contra a Covid-19...
Ontem, em entrevista à GloboNews, Nelson Teich deixou mais ou menos claro (a fala dele não é exatamente linear) que a cloroquina foi a causa da saída dele do Ministério da Saúde. Não achava razoável gastar o já escasso dinheiro da pasta com a compra de um remédio que não se mostrou cientificamente eficaz contra a Covid-19.
Como a ciência não importa, Jair Bolsonaro soltou aquela máxima histórica:
“Quem é de direita usa cloroquina. Quem é de esquerda, tubaína.”
O presidente brasileiro diz que não tem informação suficiente dos órgãos de inteligência. Talvez o chanceler Ernesto Araújo, entre uma caça ao comunista e outra, pudesse informar ao presidente que não é bem assim na América Latina e até onde a Terra continua a ser redonda — onde todos os estudos sérios feitos até agora mostraram que, além de não curar pacientes com Covid-19, a substância está ligada a um aumento de mortalidade entre os doentes, por causar arritmias graves. O último deles, feito com 96 mil pacientes. foi divulgado na semana passada, na revista britânica The Lancet, uma das mais prestigiadas publicações científicas do mundo ainda regido pelas leis da física clássica.
A verdade ignorada por Bolsonaro é que a cloroquina é poção mágica também para a esquerda. Na Venezuela, o ditador Nicolás Maduro é um entusiasta. Tanto que anunciou no Twitter que iria distribuí-la entre a população que ele está matando de fome. Na França, o maior divulgador da cloroquina no Ocidente, o médico Didier Raoult, de Marselha, é visto tanto pelo ultraesquerdista Jean-Luc Mélenchon, outro amigão de Lula, como por Marine Le Pen, de extrema direita, como um representante do antissistema — lá, o sistema atende pelo nome de Emmanuel Macron.
Le Pen, mais reservada, disse que, se fosse presidente, liberaria a cloroquina para o tratamento de Covid-19; Mélenchon, por sua vez, chegou a identificar-se com Raoult, como se ambos fossem vítimas do sistema.
Escreveu o ultraesquerdista Mélenchon: “Posso dizer que o retrato feito desse professor Didier Raoult, apresentado como um selvagem mal-educado e provocador, foi sentido evidentemente pelo meu nariz. De fato, conheço muito bem o cheiro da pintura da qual dispõe a alta sociedade, suas mídias e penas de aluguel. Eu mesmo não sou um animal agressivo, semi-demente que se crê “sagrado”e se põe como se fosse a República?’
Para tentar anular essa manipulação ideológica da figura Raoult e a sua cloroquina é que Macron foi visitar o médico em Marselha, no mês passado. Na cidade, aliás, Raoult tem o apoio entusiasmado de integrantes do partido de Nicolas Sarkozy, de centro-direita, e do partido do próprio Macron — a personificação do sistema para Mélenchon e para Le Pen.
Como se vê, direita e esquerda podem tomar cloroquina e tubaína, ao contrário do que disse Bolsonaro.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (0)