“Eduardo embaixador é inevitável”: uma análise técnica
Se houver qualificação técnica, idoneidade moral e ausência de favorecimento pessoal, é inevitável a posse do deputado.
Por Jaques F. Reolon
Poucas vezes a indicação de um embaixador provocou tanta discussão nos meios jurídicos como a do deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, para assumir o cargo em Washington, nos Estados Unidos.
As análises destacam um possível nepotismo e a natureza jurídica do cargo de embaixador.
Algumas hipóteses de nepotismo estão previstas no texto da Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal – STF. Nem todas, pois a caracterização desse tipo de irregularidade decorre de interpretação do art. 37 da Constituição.
Por Jaques F. Reolon
Poucas vezes a indicação de um embaixador provocou tanta discussão nos meios jurídicos como a do deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, para assumir o cargo em Washington, nos Estados Unidos.
As análises destacam um possível nepotismo e a natureza jurídica do cargo de embaixador.
Algumas hipóteses de nepotismo estão previstas no texto da Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal – STF. Nem todas, pois a caracterização desse tipo de irregularidade decorre de interpretação do art. 37 da Constituição.
Em rápida leitura, a nomeação do filho do presidente poderia ser considerada nepotismo e, portanto, violaria a Constituição Federal.
A jurisprudência do STF, contudo, já afastou, por diversas vezes, a incidência da referida súmula para casos em que a nomeação de parentes ocorreu para cargos públicos de natureza política, a exemplo de cargos de Secretário de Estado.
Em maio de 2018, devido ao comprometimento das agendas políticas e do funcionamento eficiente da Administração, causado pela ausência de um entendimento invariável da questão, o tema foi submetido à repercussão geral e aguarda um julgamento definitivo, sob a relatoria do ministro Luiz Fux.
Da leitura de vários julgamentos já realizados pelo STF, é possível inferir que a existência de nepotismo depende da análise do caso concreto para verificar se há favorecimento pessoal.
Esse entendimento, que já é possível arriscar sua extração dos julgados do Supremo, é aderente ao moderno discurso jurídico e assentado na essência do republicanismo, porque é arbitrário alegar mera – ou supor – infringência aos princípios da impessoalidade ou da moralidade, sem demonstrar os fatos que permitam essa conclusão.
Por isso, irretocáveis as decisões que entendem configurado o nepotismo somente se as nomeações favoreçam pessoas sem qualificação técnica, sem idoneidade moral ou sejam motivadas apenas por razões privadas.
Os princípios precisam ser densificados. É impróprio usar palavras valorativas, insuscetíveis a uma crítica racional.
A qualificação de conceitos, por meio da correlação entre seu conteúdo diretivo e os respectivos eventos da vida real, sobre os quais incide, é que permite à sociedade – e os demais operadores do Direito, analisar a legitimidade e a correção das decisões.
A segunda pergunta que se faz, então, é: o cargo de embaixador possui natureza política?
A doutrina administrativista diverge na conceituação. Há quem considera o cargo de embaixador como sendo de natureza política; outros entendem de forma mais restritiva, com doutrina de viés conservador.
Entendo que a resposta é afirmativa, se considerados alguns pontos fundamentais que o distingue dos cargos meramente administrativos, inseridos na súmula vinculante do STF.
O embaixador representa a principal autoridade do Brasil no país onde reside, faz as vezes do próprio Presidente da República, quando mantém relações com Estados estrangeiros, conforme a previsão contida no art. 84, inc. VII, da Constituição Federal.
A nomeação de um embaixador pressupõe aprovação pelo Senado Federal, rito próprio de cargos políticos, o que também lhe difere substancialmente dos cargos administrativos.
Sobre essa questão, o extinto Departamento Administrativo do Serviço Público- DASP, ao analisar a aplicação de decreto-lei, relativo ao pessoal do Ministério das Relações Exteriores, já assentou que a função de embaixador não constitui cargo público no sentido estatutário. Evidente, visto que não desempenha funções executivas ou operacionais, típicas da rotina administrativa, mas de gestão e de representação política da nação.
Por fim, a qualificação técnica para o cargo não é somente aquela oriunda da educação formal, mas também do desempenho anterior, dos estudos, das experiências pessoais e profissionais —e, mais importante, o staff técnico que assessora os embaixadores é de singular competência dos quadros do Itamaraty.
Por isso, em apertadíssima síntese, se houver qualificação técnica, idoneidade moral e ausência de favorecimento pessoal – e parece que os requisitos foram supridos, inevitável a posse do referido deputado.
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Jaques F. Reolon é advogado, economista, professor e palestrante. É também mestre em Direito e doutorando em Direito Constitucional.
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